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Uma mulher apaixonada pela música

Uma mulher apaixonada pela música

O facto de ser filha do arquitecto da unidade nacional, Eduardo Mondlane, não a envaidece, pelo contrário, desperta nela o interesse pelo país que viu nascer o seu progenitor, sobretudo no que respeita às artes. A paixão pela música sempre acompanhou a infância de Chude Mondlane, até porque, diz, nasceu numa família de artistas.

@Verdade – Quem é Chude Mondlane? Chude Mondlane (CM) – É muito difícil dizer porque cresci em várias partes do mundo. Nasci em Nova Iorque e fiquei lá até aos 6 anos de idade. Viemos para Moçambique, e não ficámos muito tempo. Fomos para a Tanzânia e cresci nesse país até à morte do meu pai.

Quando entrei na escola em Dar es Salaam, ainda tinha professores do tempo colonial, era uma experiência muito interessante ser filha de duas pessoas engajadas na luta contra a ocupação colonial e ainda havia vestígios do colonialismo, racismo e tantas outras coisas que não se podem imaginar. E tinha os pais que tinha, e perante qualquer tentativa de discriminação os meus pais defendiam-me.

Depois da morte do meu pai, fui à Filadélfia estudar dança moderna e música, e dos 11 aos 13 anos de idade mudei para Moscovo, tendo frequentado a escola de ballet clássica. Fiquei lá durante dois anos e depois foi para uma cidade perto da China, onde mais uma vez tive o problema de racismo.

Quando Moçambique ficou independente, eu voltei sem ter terminado os meus estudos e comecei a frequentar a Escola Josina Machel, infelizmente naquela altura não tínhamos professores. Fiquei muito aborrecida com a mudança sobretudo das línguas, de inglês para o russo, e depois para o português. Era uma fase muito difícil depois da independência. Foi algo difícil para mim.

@V – A sua infância foi difícil tomando em consideração a situação dos seus progenitores? CM – Não. Não foi difícil, pelo contrário, foi extraordinária. Os meus pais eram pessoas incríveis, com uma visão do mundo que poucas pessoas tinham. Eu, por exemplo, tinha um problema na escola por ser mestiça, as crianças da minha idade não entendiam isso, ou seja, não estavam habituadas a ver alguém com o cabelo que eu tinha.

Elas diziam que era peruca. Os professores excluíam-me por eu não ser branca. Os meus pais sempre tiveram a capacidade de explicar que aquilo não era um problema meu, mas de uma atitude negativa dos outros. Fizeram-me entender que aqueles eram comportamentos arcaicos.

@V – Qual é a sua opinião em relação à política em Moçambique? CM – Acho que já temos uma longa caminhada. Os 50 anos da Frelimo são um exemplo de um longo caminho que já percorremos. Para mim, olho à minha volta e vejo muitas coisas que estão a ir para frente.

Na nova geração, por exemplo, há pessoas que durante a luta de libertação nacional nem sequer eram sonhos dos seus pais, são indivíduos que cresceram numa realidade diferente da que eu cresci. E estão a ter uma outra oportunidade.

A participação da juventude é extremamente importante, não é para ficar simplesmente sentado na bancada a criticar, isso também é bom, eu pessoalmente gosto de fazer isso, ou seja, criticar a nossa situação política económica e social, mas é preciso sermos pró-activos, ter ideias e engajarmo-nos; é preciso participarmos no desenvolvimento e isso está a começar a acontecer.

@V – Como olha para a participação feminina na esfera política nacional? CM – Eu por acaso venho cá por muito pouco tempo e venho para trabalhar com os músicos e regresso aos EUA. Não tenho uma posição, ou seja, não estou inteirada sobre o assunto. Não estou bem informada para dizer “sim ou não”.

Porém, sei que a mulher está numa posição de desvantagem e é uma realidade nossa e ainda não chegamos ao ponto de sermos tomadas a sério fora das nossas casas. Dentro do nosso lar, dentro da nossa família, ainda continuamos a lutar para termos a nossa voz e assegurarmos os nossos direitos que precisamos de ter. O aborto deve ser legalizado. Há várias outras questões que ainda não estão completamente resolvidas e temos que nos engajar e apoiarmo-nos uns aos outros.

Nós, as mulheres, temos que olhar para as outras e considerarmo-nos compatriotas engajadas nos mesmos objectivos. Temos que nos apoiar em qualquer coisa que a gente faça. Temos também de estar conscientes da nossa própria contribuição para melhorar o papel da mulher.

@V – Como começa a sua carreira musical? CM – Eu viajei muito pelo mundo e comecei a cantar nos países que visitei. E aí começou a minha carreira quando eu tinha 17 anos de idade. Passei a trabalhar na Suíça, depois Japão, e Estados Unidos com alguns músicos de renome no panorama musical. Como surge a paixão pela música? Eu venho de uma família de artistas.

Do lado do meu pai, a minha avó era dançarina e cantora muito conhecida na sua localidade e o meu pai gostava de música e tocava um instrumento musical tradicional. A minha mãe também vem de uma linha musical muito forte, a minha avó era pianista, a minha tia também. Além disso, a minha mãe tocava guitarra, piano, violino, flauta e era uma grande artista.

A música está no meu sangue e foi impulsionada pelos meus pais. Eles estavam orgulhosos do que eu fazia e diziam que um dia eu seria uma estrela. Particularmente, o meu pai tinha uma grande apreciação pelas artes.

@V – O que faz nos tempos livres? CM – Eu gosto de conviver com os amigos, ouvir música, ver filmes e estar com a minha filha. Sou uma pessoa curiosa no que respeita às artes, procuro sempre saber o que significa cultura e arte na vida das pessoas.

Fico muito preocupada com o facto de os artistas não merecerem o devido apoio. Isso não acontece só em Moçambique. Nos Estados Unidos retiraram a música do currículo das escolas públicas. Isso é preocupante.

É difícil e não sei como se pode remediar isso, mas acredito que é necessário muito esforço. Por exemplo, nós os artistas temos de nos engajar como activistas para mudarmos essa situação.

@V – Como foi a sua experiência na distribuição do Jornal @ Verdade? CM – Foi extraordinária. Estava à espera de ter uma experiência que nunca tinha tido antes. Estar ali naquele momento e ver as pessoas a pedir um exemplar e ter a oportunidade de conversar com elas foi algo indescritível.

Eu estava aqui em 2009 com um grupo de crianças de uma escola secundária dos EUA e estávamos a fazer um intercâmbio com os alunos da Escola Internacional de Moçambique e com o Núcleo de Arte e alguns artistas.

Os miúdos, acompanhados por uma cineasta, foram fazer a distribuição, ela contou-me e fiquei louca com aquela experiência. Decidi fazer uma coisa igual, uma vez que, como todos sabemos, o Jornal @Verdade é uma coisa única, não existe um jornal igual.

@V – O que mais marcou o seu dia de distribuição? CM – Eu acho que foi a vontade das pessoas de terem o jornal nas mãos para partilhar as informações com os amigos e familiares. É uma oportunidade, uma janela que outros jornais não dão à população, não só sobre os assuntos correntes de desporto, cultura e política, mas também o Mural do Povo que dá a oportunidade de eles expressarem os seus pensamentos e como enfrentam diariamente os acontecimentos.

@V – Cozinha? CM – Adoro cozinhar, e comer também. Gosto de pratos de toda a parte do mundo. Agora estou a tentar a levar uma vida saudável, não comendo alimentos processados. Gosto de legumes e vegetais, mas a minha paixão é a galinha à zambeziana, a comida italiana e a japonesa, a xiguinha e o hamburguer.

BI

Nome: Chude Mondlane

Data de Nascimento: 1958

Local de Nascimento: Nova Iorque

Música favorita: Afro-jazz.

Não tenho paixão pela música clássica.

Livro: “Eco da tua voz”

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