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SELO: No meu país – escrito por Mahadulane

No meu país, factos curiosos e inéditos acontecem à velocidade da luz e nem o magistrado número um escapa. É uma infindável gama de acontecimentos peculiares que conferem a Moçambique um lugar de destaque e estatuto digno no livro de recordes; senão vejamos:

1. No meu país, o magistrado número um e filho mais querido do maravilhoso Povo Moçambicano, viola a Constituição que jurou publicamente cumprir e fazer cumprir, ao se auto-atribuir o direito de apresentar o seu sucessor, antes mesmo de haver eleições ou candidatos formais. Dos negócios do Estado açambarcados para si e sua família nem adianta aquecer a cachimónia;

2. No meu país, o titular do órgão que deve(ria) fiscalizar as contas públicas, com vista a promover a eficiência na sua utilização, evitando gastos exorbitantes e arbitrários, possui mais de uma dezena de viaturas no seu parque domiciliário; ou seja, tem mais viaturas do que a totalidade dos meios circulantes das instituições públicas no distrito onde me encontro a labutar;

3. No meu país, o mesmo juiz e os seus correligionários gastam em combustível mensal e comunicações muito mais do que o orçamento anual alocado ao hospital onde presto serviço, no supracitado distrito de uma das províncias do sul do país;

4. Neste meu país, que não escolhi para nele nascer, aquele que dorme e só trabalha 90 dias por ano, através de duas sessões ordinárias de 45 dias cada (com direito a fins-de-semana e feriados), vê o seu sono profundo premiado com salários galácticos e subsídios de rendas de casa que excedem em dobro o salário mensal de um enfermeiro em serviço num hospital público, sem contar com senhas de representação, subsídios de combustíveis, carro topo de gama zerinho, assistência médica e medicamentosa, tratamento protocolar e isenções aduaneiras, benesses essas que, a partir duma lei fantoche, vão acompanhá-lo até que a morte o separe delas;

5. Ainda neste meu país, o mesmo ilustre e “digno representante do Povo Moçambicano” tem uma reforma em tempo recorde para continuar a dormir à vontade, com direito a um subsídio de reintegração correspondente ao tempo em que ficou a dormir e, talvez, a sonhar, embalado pelo ar-condicionado e pelas luzes da ribalta, enquanto eu, fiel e verdadeiro servidor do Povo, ao cabo de 35 anos de labuta em condições desumanas e com descontos intermináveis das quais nunca me beneficiei, já com a coluna a vergar pelo peso da idade, recebo uma pensão de miséria, inferior a três mil meticais;

6. Neste meu país, um juiz de um tribunal judicial é encontrado logo pela manhã com cerca de 70.000 dólares e mais de um milhão de meticais, talvez de gorjeta dos seus comparsas do crime que ele jurou combater, quem sabe para um café e alguns litros de combustível. Os polícias, esses, já há muito que ficou provado que colaboram com os malfeitores nas suas incursões criminosas, razão pela qual os rostos dos crimes hediondos e sequestros que viraram uma pandemia à escala nacional nunca foram identificados e levados à barra da justiça (termo com peso de ouro e raro como a misteriosa – e, talvez, inexistente – buzina de avião nesta sociedade);

7. No meu país, as crianças estudam sentadas no chão, enquanto um dirigente apodera-se indevidamente de dezenas de contentores contendo centenas de metros cúbicos de madeira e exporta-os ilegalmente para fora do país. Não há medicamentos e ninguém assume oficialmente o colapso do sistema público de Saúde; apesar da sangria de médicos e outro pessoal qualificado, em resposta ao “conselho” da ex-porta-línguas de que ninguém fora chamado, apesar do galo apelar ao cumprimento do juramento, sem no entanto ele cumprir o seu;

8. No meu país, altos dirigentes do Estado, com destaque para agentes de investigação criminal e funcionários alfandegários, são baleados mortalmente por comprometerem os interesses das gangs, que colaboram com outros altos dirigentes do mesmo Estado, como é o caso do aludido juiz milionário e defunto, entre muitos outros;

9. No meu país, à massa laboral é lhes concedido um reajustamento salarial percentual, quase sempre inferior a dois dígitos, enquanto para uma minoria privilegiada os ajustes são nominais, com vista a conferir maior dignidade, como se de dignidade os trabalhadores e funcionários não precisassem;

10. No meu país, quando as pessoas exercem o seu direito constitucional de se manifestarem pacificamente são recebidas com balas assassinas e canhões de água de uma polícia violenta e ao serviço do regime;

11. Neste meu belo país, não existe dinheiro para pagar salários condignos aos médicos, professores, enfermeiros e polícias, mas nunca faltou dinheiro para alugar helicópteros, construir escritórios presidenciais de luxo, atribuir benesses astronómicas a quem não faz nada e abastecer frotas automóveis de altos dirigentes da nação que usam e abusam do poder;

12. No meu país, aqueles que andam em todos os órgãos públicos de informação para bajular os chefes recebem chorudas quantias de um saco azul cuja proveniência se desconhece;

13. No meu amado e belo país, as pessoas são transportadas em carrinhas de caixa aberta, como se sacos de carvão se tratassem, enquanto o “servidor público número um” e os seus comparsas gastam rios de dinheiro em jatinhos de luxo e outros brinquedos voadores, que os usam para satisfazer os seus apetites vorazes nas suas incursões pelos lugares paradisíacos do país, da região e do mundo;

14. Finalmente, neste meu país, um dirigente de um partido da oposição desafia o poder do Estado, manda alterar as leis para acomodar os seus interesses e dos seus sequazes, corta a circulação rodoviária, ataca militares e civis, ameaça incendiar o país, exige paridade até no prato da comida e a sociedade o apoia e o incentiva a prosseguir as suas loucuras em transe.

Eu não escolhi nascer neste país, mas tenho a oportunidade de definir o seu rumo através do meu voto, um voto consciente e não manipulado por propagandas políticas. Até depois do dia 15 de Outubro.

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