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Corrupção enraíza-se no Governo e estimula a sinistralidade rodoviária

A corrupção nas instituições de formação, regulação e fiscalização concorre, sobremaneira, para os elevados índices de sinistralidade rodoviária em Moçambique. Todavia, o Governo ignora, completamente, este factor, acreditando irreflectidamente que o derramamento de sangue e luto nas estradas deriva do excesso de velocidade, das ultrapassagens irregulares, da condução em estado de embriaguez, da má circulação e travessia de peões, da deficiência mecânica dos veículos, da má sinalização das vias públicas e do transporte de passageiros em automóveis inadequados.

Os tentáculos da corrupção institucionalizada, segundo um estudo do Centro de Integridade Pública (CIP), tornado público esta semana, abrangem todas as entidades responsáveis pela formação, regulação e fiscalização, tais como as escolas de condução, o Instituto Nacional de Transportes Terrestres (INATTER), a Polícia de Trânsito (PT), a Polícia Municipal, o Ministério da Saúde (MISAU) e as instituições vocacionadas para a inspecção de viaturas.

“A corrupção nas escolas de condução permite que determinadas pessoas sejam habilitadas a conduzir sem terem passado pelas escolas de condução e os centros de saúde consentem que pessoas inaptas obtenham certificados de exames médicos que lhes dão como aptas para dirigir veículos quando não o são”. No INATTER, segundo a pesquisa daquela instituição vocacionada para boa governação, transparência e integridade, é onde ocorre a adulteração das cartas de condução e dos exames inspectivos de viaturas e permite que condutores inabilitados conduzam com licenças falsas.

De acordo com o CIP, “os preços para a adulteração do conteúdo das cartas de condução variam entre 1.500 e três mil meticais”. O estudo a que nos referimos indica que, recentemente, uma brigada mista da PT e fiscais do INATTER desencadeou uma operação de fiscalização relâmpago na cidade de Maputo, tendo detectado que, dos 196 automobilistas inspeccionados, apenas 19 se encontravam em situação regular.

Os restantes 177 apresentaram cartas de condução irregulares e mais de metade das viaturas não tinha licença para transportar passageiros. Perante esta situação que na pior das hipóteses culmina com mortes nas estradas, as polícias de Trânsito e Municipal não apreendem nem retêm, muito menos multam os motoristas ilegais porque os agentes camarários, por exemplo, recebem em troca entre 50 e 200 meticais em função da gravidade da irregularidade.

Nas instituições de inspecção de veículos, a depravação permite que viaturas em más condições mecânicas circulem pelas vias públicas sem a responsabilização criminal por parte da Polícia. Averbamento de cartas de condução Os condutores de transporte público subornam os funcionários do INATTER para a mudança de classe do condutor, geralmente de uma categoria inferior para outra superior.

A mais frequente que se verifica é a do averbamento de cartas da categoria de ligeiros e pesados para a de profissional e licença de serviços públicos, o que habilita os automobilistas a exercerem trabalhos remunerados, regra geral, os de transporte público de passageiros.

A impunidade

Os operadores de transporte semicolectivo são os promotores de indisciplina na via pública e esta prática só se perpetua porque existe a certeza, por parte dos motoristas, de que não serão severamente punidos.

Os “chapas” devem ser submetidos à inspecção duas vezes por ano pelo facto de regularmente transportarem vidas humanas. As viaturas particular devem ser inspeccionadas uma vez por ano. Todavia, a corrupção entre os automobilistas e os agentes de fiscalização rodoviária permite que viaturas em estado obsoleto continuem a circular e a transportar passageiros, pondo em causa a sua segurança dos demais utentes da via pública em troca de valores que variam de 50 a 100 meticais.

Ao CIP, Cassamo Lalá, director da Escola de Condução Internacional e membro da Associação das Escolas de Condução, manifestou a sua indignação em relação ao facto de determinados cidadãos com menos de 24 anos de idades sejam habilitados a transportar pessoas. Na sua opinião, esses cidadãos ainda não têm maturidade suficiente para uma responsabilidade tão grande.

“Trata-se de pessoas que, tecnicamente, não estão preparadas para conduzir. Não sabem interpretar os sinais de trânsito e, como consequência, há acidentes de viação que resultam desse desconhecimento”, indicou Lalá. A investigação chegou à conclusão de que a solução para este problema passa pela reforma das actuais condições de condução e pela introdução do sistema de cadastro do automobilista.

“Com o cadastro, sempre que um condutor é multado, ficará lá registado e, igualmente, estará registado o tipo de irregularidade que terá cometido, o que iria determinar a retirada da carta de condução ou a sua reciclagem para voltar a conduzir”.

Obter licença de condução sem passar pela escola

Outra forma de corrupção bastante activa no sector dos transportes tem a ver com a obtenção fraudulenta da carta de condução. Certos indivíduos obtêm as licenças que lhes habilitam dirigir carros sem nunca terem passado por nenhum ensinamento.

“O processo é simples. Uma chamada telefónica para uma escola de condução é suficiente para o efeito”, diz a pesquisa do CIP, acrescentando que o candidato a condutor desembolsa uma quantia superior à estabelecida em todo o processo de instrução até à obtenção da carta.

“Os valores variam de 15 a 22 mil meticais, dependendo das escolas e das figuras envolvidas no esquema. Este processo envolve não só o candidato a condutor e as escolas de condução, como também funcionários do INATTER, afectos à secção de controlo de exames teóricos e práticos”.

Certificado de aptidão física falso

Uma exigência legal imposta a quem se pretende candidatar a condutor ou à renovação da licença de automobilista é a apresentação do comprovativo de “aptidão física e psíquica compatível” com a categoria para a qual se candidata. Entretanto, o Centro de Exames Médicos (CEM) ou as unidades sanitárias equipadas para o efeito emitem um testemunho de aptidão física e psíquica falso, ou seja, sem que o requerente seja submetido a algum exame. Bastando pagar “gorjeta” aos funcionários dos centros de saúde a certidão é emitida com urgência.

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