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Autárquicas 2012: Mueda, a mentalidade ainda colonizada

Abastecimento de água exclui o saneamento em Moçambique

Os residentes da vila municipal de Mueda aceitam as realizações da edilidade sem, no entanto, exigir a melhoria das condições das suas vidas. Dentre vários problemas relacionados com os serviços básicos, os munícipes enfrentam inúmeros constrangimentos, sobretudo o abastecimento de água potável. Quando as pessoas manifestam estas preocupações em comícios populares, são conotadas com a oposição e, em consequência, são ameaçadas de serem excluídas da lista dos beneficiários do fundo de apoio social, sobretudo, os antigos combatentes. Em linhas gerais, o Conselho Municipal da Vila de Mueda ainda não implementou actividades cujos resultados se tenham reflectido na melhoria das condições dos moradores.

Na Vila Municipal de Mueda, província de Cabo Delgado, existem dois sistemas de abastecimento de água, nomeadamente um construído no período colonial e o outro no período pós-independência nacional, mas as suas capacidades não satisfazem o nível de procura daquele precioso líquido naquele ponto do país. As torneiras públicas que são abastecidas pelos dois referidos sistemas apenas jorram água durante sete horas que só volta a pingar três a quatro dias depois.

Algumas pessoas chegam a pernoitar nos fontenários para serem as primeiras nas filas. As bicicletas já não servem somente como meio de transporte de pessoas, mas também para carregar recipientes de água. Logo pela manhã é notória a movimentação de crianças e mulheres à procura do precioso líquido para consumo. Para satisfazer as suas necessidades diárias, os munícipes percorrem pelo menos cinco quilómetros para chegar até à represa construída nas imediações do rio Medi. A distância torna-se mais cansativa porque a própria via de acesso utilizada para o efeito apresenta subidas que tornam desgastante o percurso, principalmente, quando se transporta carga.

Localmente, não existem bombas manuais porque o solo do distrito de Mueda é caracterizado por planaltos e quando chove a água fica em profundidades que não permitem escavações para se encontrar o lençol freático. As autoridades municipais mostram-se incapazes de minimizar o sofrimento das comunidades.

Por iniciativa própria, a população daquela autarquia luta para se livrar do problema. A maior parte das famílias constrói caleiras nas suas casas e os tanques tradicionais cuja capacidade é de aproximadamente mil litros ajudam a minimizar o problema do abastecimento de água. Nos tempos de crise, algumas pessoas têm sido oportunistas, uma vez que vendem a água ao preço de 10 meticais por cada bidão de 20 litros. “A falta de água é o nosso maior problema e não podemos exigir os nossos direitos, pois podemos ser vítimas de represálias”, disse um munícipe que reside em Mueda há mais de 15 anos.

Mueda é autarquia desde 2008 e aquela região ascendeu à categoria de vila a 2 de Setembro de 1967. A solução do problema de água constituía uma das prioridades da edilidade e do presidente do Conselho Municipal de Mueda, Mobiro Namiva, que disse que esperava melhorias no abastecimento de água com a chegada da corrente eléctrica da rede nacional, pois os sistemas de fornecimento existentes funcionavam com recurso a geradores. Mas desde 2011, período em que a energia chegou ao distrito de Mueda, o acesso à água tende a agravar- -se cada vez mais.

Vias de acesso

A nível da Vila Municipal de Mueda existe apenas uma estrada asfaltada, a mesma que dá acesso àquela autarquia partindo do cruzamento da localidade de Auazi. Todas as vias públicas dos bairros não têm asfalto ou pavimento, o que faz com que as condições de transitabilidade não sejam das melhores para os munícipes.

A questão da erosão provocada pelos percursos de água das chuvas agrava a situação. Quem circula pela vila depara com um cenário em que as autoridades municipais trabalham afincadamente para melhorar a imagem da autarquia. Mas quando se percorre os bairros periféricos o que se nota é bem diferente, pois as ruas são de terra batida.

A poeira produzida pelo vento que se faz sentir modifica a cor das paredes e tectos das residências nos bairros. Não obstante, existe um aspecto digno de menção: quase 99 porcento das casas construídas em todas as zonas residenciais da Vila Municipal de Mueda estão cobertas de chapas de zinco. Além disso, as próprias construções são feitas obedecendo às regras de ordenamento territorial formando, desta forma, estradas largas que permitem a livre circulação de automobilistas e peões.

Há quem diga que isso devia impulsionar o desenvolvimento das zonas residenciais através da disponibilização dos serviços básicos à população por parte das autoridades municipais. Mas o lixo é abandonado na via pública, além de não se registar a construção de fontenários para o abastecimento de água potável. Importa referir que a construção ordenada de habitações não é fruto do trabalho da edilidade de Mueda. Na verdade trata-se de obras herdadas dos portugueses.

O Conselho Municipal da Vila de Mueda não concebeu um plano com vista a melhorar as vias de acesso nos bairros já existentes e a questão que se coloca é: o que será da zona em processo de expansão? Os munícipes acreditam que primeiro serão melhoradas as condições das estradas nos bairros antigos e depois as ruas das zonas residenciais em expansão.

No âmbito da requalificação dos bairros, a edilidade criou uma zona de expansão onde foram já demarcados 850 talhões divididos em áreas específicas para a construção de infra-estruturas para habitação e outras de natureza comercial. Mueda está impedida de crescer a norte devido à erosão que não permite tal facto, podendo apenas expandir- se a sul.

 

Saneamento do meio

Quem visita a autarquia de Mueda pela primeira vez pode concluir que se trata de um município onde o lixo não constitui preocupação para os residentes locais. Esta situação acontece porque não se produz resíduos sólidos em quantidades alarmantes à semelhança de outros municípios moçambicanos. Não se pode dizer que é resultado do trabalho da edilidade, pois a equipa de limpeza criada para o efeito limita-se à recolha de folhas secas que caem das acácias espalhadas um pouco por toda a vila.

Nos mercados, o processo de limpeza é deficitário, pois os resíduos sólidos permanecem acumulados na via pública o dia inteiro. O único tractor que foi adquirido para permitir a eficiência na recolha do lixo é usado para o transporte de combustível lenhoso e de pessoas. Os comerciantes mostram- -se preocupados porque, diariamente, é-lhes cobrada a taxa de lixo. As autoridades municipais mostram-se ineficientes na gestão de lixo numa circunscrição onde se produzem detritos em pequenas quantidades.

 

Actividades económicas

Dos 54 mil habitantes existentes na vila municipal de Mueda, 90 porcento dedicam-se à actividade agrícola e pequenos negócios como forma de garantir o sustento das respectivas famílias, sendo que o resto da população trabalha em diversas instituições públicas e privadas.

Um aspecto muito importante é que as pessoas já constroem casas com base em material convencional e compram os próprios meios de transporte, factores que contribuem para a melhoria das suas condições de vida. Os jovens, principalmente, não se limitam a cruzar os braços à espera de emprego. Além disso, há quem dispense o emprego formal nas instituições públicas e ou de Estado para se dedicar ao comércio, tudo porque os rendimentos mensais concorrem com o salário de um cidadão licenciado.

“Tudo que dá dinheiro é trabalho digno”, foi assim que, em palavras sucintas, Adriano Ntimawa definiu o seu negócio de venda de caju seco. É difícil definir a tipologia dos produtos vendidos pelos munícipes de Mueda porque cada um coloca no mercado aquilo que acha que os clientes vão comprar em quantidades suficientes para gerar rendimentos. Talvez seja por isso que Mueda se tornou uma autarquia preferida de pessoas oriundas de vários locais, incluindo cidadãos da vizinha Tanzânia que procuram melhores condições de vida naquele ponto do país.

Os residentes de Mueda desenvolvem actividades comerciais por iniciativa própria sem, no entanto, beneficiar do Fundo de Desenvolvimento Distrital, vulgo “sete milhões”, destinado ao financiamento de projectos de geração de rendimentos no âmbito das acções do Governo para o alívio da pobreza.

 

Energia eléctrica

A população da vila de Mueda começou a utilizar a energia da rede nacional em 2011. Mas até agora, existe um menor número de pessoas que está a beneficiar da corrente eléctrica nas suas casas. Castro Vindoril, residente daquela vila, disse que a edilidade e o governo distrital estão a dificultar o processo de aquisição do contrato de energia. Por exemplo, para a legalização do uso da corrente eléctrica são necessários sete mil meticais, além dos custos adicionais para estender a linha até a sua casa, caso os 30 metros de fio oferecidos pela empresa Electricidade de Moçambique (EDM) não cheguem até à residência do utente.

Este é o facto que faz com que muitos não instalem energia eléctrica nas suas residências. De um universo de 54 mil habitantes, apenas 598 utilizam a corrente eléctrica da rede nacional. Um comerciante identificado pelo nome de Mucuache, residente no bairro Maputo, revelou que para instalar energia na sua casa precisou de corromper os técnicos da EDM, desembolsando 37 mil meticais, além dos sete mil exigidos para se rubricar o contrato.

 

Saúde

Não é somente a falta de água que deixa os munícipes à beira do desespero; o acesso à saúde é outro grande problema que tira o sono aos munícipes da pobre vila de Mueda. A nível do município existe apenas uma unidade sanitária: o Hospital Rural Distrital. Para melhorar o acesso aos cuidados médicos, neste momento encontra-se em construção um centro de saúde. Apesar disso, ainda se assiste a casos de pessoas que têm de percorrer longas distâncias para obter cuidados médicos. As principais causas de internamento na unidade sanitária têm sido a malária e as doenças diarreicas. Os casos mais graves são transferidos para o Hospital Provincial de Pemba.

Além de percorrer longas distâncias – pelo menos quatro quilómetros –, os pacientes são obrigados a aguardar muito tempo nas filas para serem atendidos e receberem cuidados médicos. A nível do sector, neste momento, o desafio continua a ser o melhoramento do atendimento e a disseminação dos serviços de saúde a nível do município.

Contexto histórico

Mueda é uma vila que se situa no planalto do mesmo nome na província de Cabo Delgado. Foi fundada em torno de um quartel do exército colonial português, e possui um clima ameno mas o solo é permeável permitindo que a água se infiltre em profundidade, dificultando o fornecimento de água potável aos residentes. Elevada a vila em 2 de Setembro de 1967, Mueda é o centro da cultura Maconde. Em 16 de Junho de 1960, a vila foi palco de um massacre, quando as tropas portuguesas dispararam contra uma manifestação a favor de independência.

 

Município de Mocímboa da Praia em números

População: 54 mil

Funcionários: 84

Vereações: 4

Unidade sanitária: 1

Unidade sanitária em construção: 1

Consumidores de água: 237

Consumidores de energia: 598

Escolas secundárias: 2

Sistemas de abastecimento de água: 2

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