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XÏÏKWEEMBO: Da posse

As coisas não são nossas, são-nos apenas emprestadas por um período limitado de tempo. Todos o sabemos, não existe pertença, nem de pessoas, objectos, animais ou sentimentos. Nada é meu, é quando muito nosso, de todos. Eu sei disto, tudo pode partir. Daqui a um minuto. Quando comprei o meu carro brincava, estacionava-o e quando voltava dizia sempre: “o carro ainda está ali, o que é bom sinal.” Mas a brincadeira, como acontece sempre, tem um fundo de verdade, é como se ainda não acreditasse que o carro é meu. Sei que basta um gesto, um desequilíbrio milimétrico nas chuvas, nos ventos, no interior da terra, para tudo mudar. Mas hoje, por um momento, tive medo!

E as filosofias ficaram de parte. Ainda é muito cedo e eu estou em casa, é coisa rara, mas hoje decidi trabalhar em casa, e aqui está a prova de que o trabalho não compensa e o crime… Alguém bate à porta, não é muito comum e por isso eu não abro. Pergunto, como me ensinou a fazer a minha mãe: – Quem é? – ninguém responde. Pelo vidro martelado consigo ver que é um homem alto, de blusão de pele. – Quem é? – depois de mais um tempo responde: – É o guarda. – o guarda do prédio é baixo e já com uma certa idade, este rapaz é alto e jovem, entreabro a porta.

– Senhora vem lá ver que alguém entrou no teu carro! – o meu coração bate mais forte, o meu carro!! Mas depois desconfio – como a minha mãe me ensinou a fazer, – Mas tu não és meu guarda! O meu guarda não está lá? – Sim, mas eu que vi: dois moços, um claro e outro muito escuro estacionaram assim, colados teu carro e entraram, eu que salvei, iam roubar teu carro senhora, agora mesmo iam! – esta parte incomoda naquele lugar onde a filosofia da partilha não chega, levar meu carro?? A mim apetece-me sair a correr e ir ver se ainda está lá – mas assim para além da filosofia também se vão os conselhos da mãe, e ainda o carro, é muita coisa para perder numa noite mesmo para quem questiona isto da posse…

– Mas, lá em baixo tem muitos carros, qual é que é meu? – preciso de falar mais com o tipo para estudar se é mesmo verdade… tenho vontade de sair mas as escadas são escuras e já me imagino a ser apanhada numa ratoeira, e oiço mesmo as palavras da minha mãe: “eu não dizia?”; e as minhas amigas: “nem eu que sou moçambicana não faço isso!”; e os meus amigos: “tens de ter um homem contigo, sozinha vês o que acontece?”; e todos lá na tuga: “pois, África é muito perigoso” – ele não sabe ao certo mas responde: – Eu que confirmei com esse moço Giro, “esse carro não é daquela branco daqui?

” É teu carro! Um… cinzento. – Chama lá meu guarda – ele sai, chateado. Eu estou certa de que é mentira e penso que ainda bem que não segui o primeiro impulso, as coisas que podiam acontecer! Mas o rapaz volta, com o meu guarda, – Senhor guarda, com meu carro está tudo bem? – Sim senhora, tudo bem. – o rapaz não cabe em si. – Mas, se tem as portas abertas?! Dois moços estavam lá dentro! Eu é que vi. – Senhor guarda peço ir ver. – Ok, você que sabes! – e, na verdade ainda duvidando, lanço um vago: – Obrigada moço! – ele já se afasta num: – Aaaaaaaaaaaaaahhhhhh senhora! – eu fecho a porta. Meu coração continua de batida agitada e não estou satisfeita com a solução… (continua)

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