Ainda que elevada à categoria de cidade a 12 de Agosto de 1956, não existe um município Inhambane, existem vários. O dos bairros periféricos é o de grandes tensões sociais, onde os papéis que cada residente desempenha, ao contrário do silêncio e da tranquilidade do centro da urbe, acabam sempre por ser subvertidos. São essas assimetrias que põem a descoberto a cidade que ninguém quer ver quando compra uma passagem de avião numa agência turística. Não são só os bairros miseráveis. São também as relações de força entre patrões e criados, entre ricos e pobres, entre velho e novo, também entre o urbano e o suburbano.
Já escrevi uma vez, no jornal, meio a brincar, meio a sério, que Inhambane será a cidade mais sossegada do mundo. Até hoje ninguém veio a terreiro para desmentir isso. Afirmei igualmente que esta vai ser a capital provincial mais bela de Moçambique. Também ainda não fui contrariado. Hoje, se eu repetir que a “Terra da Boa Gente” continua a ser a mais limpa do nosso país, posso ser questionado. Na semana passada a Reportagem do @Verdade foi ao gabinete de trabalho do presidente do município, Benedito Guimino, para lhe ouvir, na primeira pessoa, falar sobre o estágio actual do território que dirige, uma vez que caminha para o fim do mandato. “Realizámos 97 porcento daquilo que nos propusemos fazer, e sentimo-nos confortados”.
Um dos cantos mais arrebatadores que Inhambane tem, será a sua marginal, um lugar inigualável, único e que, por isso mesmo, se torna necessária uma luta de todos aqueles que valorizam o ambiente e o belo, para a sua preservação. Entre a ponte-cais e a Escola Secundária Emília Daússe, ainda na orla marítima, aquele espaço tornou- se um depósito de lixo, vindo de onde não sabemos. Alertámos sobre este aspecto negativo – que vai doer a qualquer cidadão civilizado – ao ilustre edil, que se manifestou nos seguintes termos: “Muito obrigado por nos dar essa informação, na verdade, eu, pessoalmente, não tinha conhecimento deste procedimento; é um assunto muito importante que levanta e nós queremos manter o estandarte de cidade mais limpa de Moçambique”.
A cidade de Inhambane será permanentemente julgada pelo seu sossego, pela sua beleza e, por estarmos ainda na marginal, registámos, ao lado de onde se estabelecem as instalações do Grupo Desportivo local, que uma vasta área paisagística foi privatizada. Segundo informações obtidas no próprio município, um empresário cujo nome não nos foi possível apurar, tinha a intenção de erguer ali um estabelecimento hoteleiro, e por aquilo que sabemos aquela é uma área de conservação.
O sítio está cercado com chapas de zinco, indicando que ali vai nascer um empreendimento, o que, a acontecer, na verdade, será um golpe profundo sobre a natureza, um desprezo total pelos munícipes e pelos seus hóspedes que nunca mais terão o privilégio de contemplar, a partir dali, o encantamento da baía e deliciar-se com o imenso palmeiral que se levanta do lado da Maxixe. Mas o presidente do município descansou-nos: “já não se vai construir nada naquele espaço, estamos numa área de conservação e é necessário que se respeite aquilo que são as orientações ambientais e geográficas do nosso município”.
As palavras de Guimino, todavia, não nos vão descansar na plenitude enquanto não forem retiradas as chapas de zinco que magoam a alma dos munícipes. “Já estamos a trabalhar nesse sentido, para além de que o prazo que foi estabelecido ao requerente da obra já expirou. Vai notar que, mesmo ali ao lado, alguém pretendia construir contra as normas impostas pela postura da cidade, e nós embargamos”.
É que a marginal é um tesouro inalienável. Dói também passar em frente às Telecomunicações de Moçambique e depararmos com uma barraca de venda de peças de automóveis e botijas de gás. Dissemos a Benedito Guimino que o município, ao permitir que aquele privado construisse naquele espaço – impedindo-nos de apreciar livremente a baía, era uma agressão violenta, uma grande desconsideração pela alma dos munícipes e pela história da cidade, e o edil concordou connosco e provavelmente terá ficado limitado em avançar com qualquer outro comentário por a autorização não ter sido concedida durante o seu mandato. Seja como for, é necessário que algo se faça para que aquele edifício, tornado despropositado e inestético, seja retirado dali.
“Estamos satisfeitos com o nosso trabalho”
Benedito Guimino O município de Inhambane tem 22 bairros. Segundo o censo de 2007 tinha 65 mil habitantes, mas de acordo com Guimino, a actual projecção indica para cerca de 71 mil. Para o edil, “dos 54 pontos que nos havíamos proposto realizar, conseguimo-lo em 97 porcento, e isso significa que estamos muito perto de cumprir com o nosso manifesto em cem porcento até o final do mandato.
“Procedemos à electrificação de quase todos os nossos bairros, faltando apenas três, nomeadamente Guitambatuno, Siquiriva e Ilha de Inhambane (este último estando neste momento num processo de ligação aos painéis solares. Em relação ao abastaecimento de água, o programa está bem encaminhado, com excepção de Inhamua, em Maxavenha (Macajane), Salela (Tekwane e Siquiriva, que estão ligados a um pequeno sistema de painéis solares).
Na área de Educação, segundo Guimino, “todas as escolas construídas com material convencional estão apetrechadas de carteiras, já ninguém se senta no chão. Porém, temos ainda alguns estabelecimentos de ensino construídos com material misto, cujos alunos ainda não têm disponíveis carteiras. Construímos dois centros de saúde nos bairros e reabilitámos o centro de saúde localizado na urbe, pavimentamos três quilómetros na área urbana e fizemos a abertura de outros 10 quilómetros nos bairros e ainda realizámos obras de terraplanagem em sete quilómetros”.
Transporte
A gestão dos transportes públicos urbanos passaram para o município, o qual se debate neste momento com dificuldades financeiras. Em funcionamento está apenas um único autocarro, fazendo a ligação Inhambane-Praia do Tofo. “Temos a plena consciência dos transtornos que a falta de transporte público cria ao público utente; estamos a trabalhar no sentido de que, dentro de algum tempo, possamos colocar em actividade mais três unidades, o que vai aliviar de certa forma o bolso dos cidadãos, uma vez que os nossos preços serão subsidiados, contrariamente à actual tarifa cobrada pelos privados, vulgo “chapa””. Mas o desafio da edilidade não termina por aqui, pois está na sua manga alocarem-se cinco viaturas, duas das quais farão uma ligação interdistrital, entre Inhames e Inharrime.
“É importante referir que na área da Mulher e Acção Social, construímos cinco centros de corte e costura com duas turmas cada uma. Os bairros de Marrambone e Malembuane já graduaram as primeiras cursantes e para ajudar essas mulheres os centros mantêm uma máquina disponível para as que tiverem algum trabalho a fazer, sem qualquer custo. Construímos ainda um parque infantl em Malembuane, que vai ser inaugurado no dia 16 de Junho e outro está em construção em Muelé ‘3’”.
Na área da habitação, o Município construiu 25 casas para jovens no bairro de Chamane. “Atribuímos ainda 291 talhões, neste momento estamos num processo de parcelamento de 251, e a nossa meta é termos mil parcelas até o final do nosso mandanto”. No programa da governação a área desportiva não foi esquecida. “Reabilitámos o campo de futebol de Muelé. Até Fevereiro teremos todas as obras concluídas, incluindo a colocação de relva sintética; temos ainda outro campo – 1º de Maio – em obras, no bairro Josina Machel”.
Uma das grandes bandeiras na área cultural é a restauração da banda municipal. “Realizámos a 4ª edição do Carnaval Municipal, e levámos a cabo o 1º Festival da Mulher Autárquica”. Benedito Guimo sente-se orgulhoso de ser o edil da cidade mais limpa de Moçambique e também “por liderarmos o nível de reembolsos do fundo do PERPU – 75 por cento – e a nível das autarquias nacionais, financiámos 650 projectos”.
Na verdade, as espécies marinhas precisam de mangais para a sua reprodução, mas Inhambane precisa também de preservar a sua beleza. Imagine-se que a zona da praia da Costa do Sol tivesse mangais no lugar reservado aos banhistas! Entre as instalações do Grupo Desportivo da “Terra da boa gente” e a Ponte-Cais, os mangais foram sempre combatidos. É uma zona de banhistas e de recreio, por isso estas plantas marinhas não vão fazer sentido, para além de que, sem elas, a zona fica mais fresca, mais bela.
Temos, até hoje, o testemunho – representado por um hangar – de que na “Terra da Boa Gente” já se praticou desporto marítimo, seria impossível na zona de mangal, e para piorar a situação, alguém entendeu plantar eucaliptos ali perto, tornando o lugar bastante incaracterístico, irreconhecível. A partir da zona do hospital provincial o panorama é frustrante; foram erguidas construções de material precário, que trouxeram com elas o plantio de várias árvores, mangueiras, mafurreiras, coqueiros e uma diversidade de plantas que nos impedem de contemplar a baía.
Somos de opinião de que o município devia fazer algo com vista a retirar aqueles munícipes e colocá-los em lugares adequados, abater aquele arvoredo todo e devolvernos a beleza de uma cidade-museu, invenjável para qualquer ser humano de bom senso. Existe um plano de demarcação de mil talhões até finais deste mandando, e o número de famílias a viver ali em condições pouco dignas, recorrendo ao fecalismo a céu aberto, é muito pequeno. A nossa cidade precisa de manter, “irregateavelmente”, o belo.
Ilha de Inhambane mais próxima do continente
O mito ainda prevalece. Desde os tempos em que a Ilha de Inhambane, a 45 minutos de barco a motor a partir da cidade, é distante e impenetrável, não exactamente no sentido físico-geográfio, mas na vertente espiritual. Alguém dizia que naquele espaço cercado de água em todos os lados, só vivem os que ali nasceram, e os estranhos serão eternamente rejeitados, e isso parece corresponder à verdade.
É um lugar do paraíso. Incomparável. Com peixe em abundância. Hoje, o censo eleitoral indica que vivem ali cerca de mil habitantes, e nunca quiseram sair para encontrar outros lugares onde possam usufruir de condições de vida diferente, com água potável, por exemplo, que é fundamental para a existência saudável do ser humano. Mesmo distante e mitológico, aquele pedaço de terra – sem energia eléctrica de Cabora Bassa e sem água canalizada – não está esquecido por Benedito Guimino.
“Estamos empenhados em melhorar a qualidade de vida dos ilhéus, perto de metade dos 972 habitantes têm painéis solares disponibilizados pelo Conselho Municipal a um preço bonificado e pensamos que até ao final do mandato todos terão energia em casa. O mote para a instalação destes geradores não será propriamente comercial, mas social”.
Sobre a água, o edil disse-nos que o município tem um desafio que está a lutar para concrectizá-lo, caracterizado por puxar a água do continente (a partir do bairro Nhamuwa) para a Ilha. “O líquido que se consome neste momento é salobre e nós queremos mudar essa situação”.
“Até há pouco tempo aquela localidade estava muito distante da cidade, uma vez que as condições de transporte eram muito difíceis; hoje alocámos um barco a motor, que faz duas viagens por semana, e isso ajuda muito, pois aqueles munícipes terão as suas movimentações para aquisição de bens e outros serviços mais facilitadas. É verdade que o preço cobrado a cada passageiro – 20,00MT – não cobre os custos da operação, e uma vez mais o lado social da edilidade é chamado para o efeito”.
Arruamentos em novos bairros
A cidade de Inhambane surpreende pelo nível das construções que se erguem em quase todos os bairros, tornando aquilo que eram bairros com grande tendência rural, em conglomerados urbanizados. Contudo, impera alguma anarquia na forma como as casas são projectadas; há violação, em alguns casos, de espaços públicos, os arruamentos, muitos deles, deixam muito a desejar, na estrada principal o Município teve que intervir para impedir, ainda na semana passada, que um munícipe construísse o muro de vedação da sua casa para além dos seus limites. Mas há muitos casos destes aqui nesta cidade e Guimino reconhece esse problema. “Estamos a agir, já identificámos os locais para os principais arruamentos com vista a corrigir a desordem que se verifica em alguns locais”.
O edil está concsiciente dos enormes problemas que vai encontrar para pôr cobro a esse erro. Por exemplo, os bairros Chalambe 1 e 2, e Liberdade 1, 2, e 3 são os casos mais gritantes. “Para intervirmos naqueles espaços temos que trabalhar duramente, são casos ‘seculares’ que precisam de um estudo muito aprofundado, mas temos, com certeza, essa consciência. É é um grande desafio à nossa frente”. Quantos à questão das praias pertencentes à edilidade, é um assunto para outro artigo. Específico.