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Um casal seropositivo que luta para vencer a discriminação

Alberto Joaquim e Maria Samuli, ambos de 40 anos de idade, vivem maritalmente há 18 anos, no bairro de Natire, no Posto Administrativo de Namitória, distrito de Angoche, na província de Nampula. Este casal diz que está feliz, mas tem uma história de amor marcada por episódios tristes que vale a pena acompanhar porque servem de lição para os que, apesar de estarem contaminados, têm levado uma vida desregrada e, também, para aqueles que discriminam os doentes.

Alberto e Maria descobriram que são seropositivos há sete anos e desde essa altura as suas vidas mudaram de rumo drasticamente. A falta de informação sobre a doença levou o marido a pensar no suicídio, uma vez que para ele estar infectado pelo vírus de VIH/SIDA era uma sentença de morte.

“Pensava que já tinha chegado o fim do mundo para mim e para a minha família, por isso consumia bebidas alcoólicas de forma desregrada e fazia tudo tendo em conta os escassos dias de vida que eu pensava que tinha”, contou a fonte.

A dado momento, algumas pessoas de má-fé ameaçaram-no de morte alegadamente porque ele iria disseminar o vírus pelo bairro onde mora. Porém, para sua alegria, continua vivo graças ao apoio dos secretários da zona que sempre estiveram ao seu lado contra os malfeitores que acham que ser seropositivo é sinónimo de morte.

Doente e violentada pelo marido

Maria Samuli narrou que foi quem mais sofreu os efeitos perniciosos da degradação da relação conjugal porque, para além viver infectada por uma doença que não sabe como contraiu e cujos efeitos desconhecia, teve de enfrentar a discriminação, um problema que até hoje prevalece. Enquanto isso, o esposo violentava-a diariamente, uma vez que vivia frustrado por ser seropositivo.

A nossa interlocutora, de rosto enrugado de tristeza, contou-nos ainda que o cônjuge era agressivo de tal sorte que ela era obrigada a fugir de casa com as crianças para escaparem das acções violentas do marido bêbedo.

“Um dia, por exemplo, a minha filha quase dava parto na rua porque o pai não queria saber dela e nem dos seus irmãos. Ele não aceitava também que eu trabalhasse e nem que as crianças fossem à escola”, desabafou Maria, cujo marido já foi detido por causa das suas atitudes negativas “porque chegou uma altura em que me cansei de o denunciava à Polícia”.

O casal disse que a instabilidade que ameaçava desfazer o seu lar deveu-se à falta de conhecimentos e explicação sobre como encarar a seropositividade. “No princípio não nos foi fácil ter acesso a qualquer informação sobre a doença e isso fez com que passássemos todo o tempo a brigar”, recordaram.

A senhora disse também que Alberto, um homem que no passado era viciado em álcool, já foi uma pessoa que constituía preocupação para as lideranças do bairro devido ao seu comportamento repreensível. Contudo, depois de passar por vários aconselhamentos até perceber que o vírus do VIH não era sinónimo de morte, mudou de vida. “Foram necessárias várias exortações por parte das autoridades de saúde e activistas de diversas organizações da sociedade civil para ele perceber que não estava condenado à morte”.

Hoje, Maria sente que algo se alterou no relacionamento com o seu marido. Este está a mudar, encara a doença e a vida de uma outra forma. Entretanto, neste momento, a maior preocupação do casal é a discriminação na sua comunidade. A senhora queixa-se de estar a ser mal vista pelas outras mulheres, sobretudo as jovens, por causa da doença que a apoquenta. Mas, felizmente, disse a fonte suspirando, os filhos não passam pelo mesmo problema nem no estabelecimento de ensino que frequentam. “Os meus filhos nunca se queixaram desses problemas de discriminação, nem de desprezo de outras pessoas na comunidade ou mesmo na escola onde eles estudam”.

A fonte assegura que é discriminada quando se dirige a vários lugares para fazer diferentes trabalhos e sente que algumas pessoas têm vontade de a ver escondida por causa da doença. “Por vezes, as pessoas querem ser as primeiras a tirar água na fontanária, ou moerem em primeiro em lugar os seus cereais na fábrica porque têm medo de serem contaminadas pela minha pessoa. Esta situação acontece quase em todos em os cantos por onde passo”, desabafou a nossa entrevistada.

Por seu turno, Alberto reconheceu que foi difícil saber lidar com a doença, uma vez que não tinha informações sobre como viver positivamente. Aliás, segundo ele, no Posto Administrativo de Namitória falava-se muito pouco sobre o VIH/SIDA. Na altura em que foi infectado, não havia activistas a trabalhar com as comunidades nem a sensibilizá-las. Isto, fez com que, em parte, pensasse no suicídio quando o diagnóstico do VIH registou um resultado positivo.

Actualmente, o casal começou a participar em encontros levados a cabo pelos facilitadores do projecto de comunicação da N’weti, o que o tem ajudado a levar uma vida d alguma esperança.

Não sabem como contraíram a doença

Maria e Alberto não sabem como contraíram o vírus do VIH/Sida, facto que fez com que procurassem entre eles o culpado pela contaminação. Aventaram várias possibilidades que podem ter concorrido para o efeito, mas a dada altura acreditaram que esta doença não é diferente de tantas outras que têm infectado e afectado muitos humanos, desde que se saiba viver positivamente.

Os sonhos

Maria Samuli disse-nos que sonha ver os seus filhos singrarem na vida académica, o que lhes poderá garantir um futuro melhor. “Nada é melhor na vida do que ser uma pessoa útil na sociedade e ser visto como honesto e íntegro. Gostaria que as pessoas reflectissem e entendessem que do mesmo modo que a minha família foi infectada, outras podem também passar pela mesma situação.”

A nossa interlocutora disse que, apesar da segregação de que tem sido vítima, ela é uma pessoa cheia de energia. Aceitou falar ao @Verdade porque sente que este não é tempo de manter segredos relativamente a uma doença como a que apoquenta o casal.

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