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Queimadas: Prática Milenar ou Bomba Relógio?

Descolando de Nampula em direcção a Lichinga pode-se observar o magnífico planalto sobre o qual se cruzam as províncias de Nampula e Niassa, pontuadas por montanhas que rasgam o horizonte. Com a subida do avião, entre as nuvens, vai-se perdendo a definição do que se passa no solo, mas saltam no entanto à vista nuvens de fumo, abundantes em diversos pontos.

São as chamadas queimadas, um mau hábito que, lentamente, vai esgotando os solos e destruindo o ecossistema. É da tradição popular e cultural a utilização das queimadas como forma de expandir as machambas, quando estas parcelas de terra se vão esgotando e as produções agrícolas minguando. Além da expansão agrícola, existem outras motivações para as queimadas, nomeadamente retirar o esconderijo a animais selvagens como leões e cobras, ou ajudar na caça a ratos e pequenos herbívoros.

A produção de carvão vegetal desempenha também um papel nada desprezível nesta proliferação dos fogos. O aumento das populações humanas tem levado esta prática milenar a níveis acima do aceitável, trazendo graves consequências para a fauna selvagem, para os solos e para as próprias populações.

A Fauna Selvagem

Os animais selvagens, uma das grandes riquezas de Moçambique, vêem-se frequentemente encurralados pelos fogos florestais. Os locais em que habitam são destruídos, perdem-se muitos juvenis e há fortes aumentos de mortandade, pois os animais habitam áreas cada vez menores, o que dificulta a fuga aos predadores. A expulsão dos terrenos em que sempre habitaram leva ao choque com as populações rurais, pois na procura de novos habitats os animais sentem-se frequentemente encurralados, muitas vezes reagindo agressivamente à presença humana. Consequências para os solos a transformação indiscriminada de zonas de arbustos e árvores em zonas agrícolas e o posterior abandono destas aumenta a tendência dos solos para a desertificação, pois estes são privados da protecção providenciada pelas plantas, em particular na época das chuvas, quando as águas arrastam os solos mais fragilizados.

A ausência destas árvores e arbustos no solo aumenta seriamente a probabilidade de ocorrência de cheias, deslizamentos de terras e tempestades de areia. A região na qual se insere a cidade de Lichinga, caracterizada por chuva abundante e de elevada intensidade acompanhada por fortes ventos, é particularmente atreita aos problemas referidos.

Plantas exóticas são cada vez mais uma realidade

A tendência para o aumento das queimadas deve despertar sentimentos de apreensão nos principais interessados, em particular as populações rurais, nas quais os efeitos das previsíveis calamidades mais se sentirão. A plantação de plantas exóticas como eucaliptos e pinheiros, que cada vez mais se observa por toda a Província do Niassa, deve ser feita com bastantes precauções, pois a facilidade com que se incendeiam (a resina do eucalipto e a casca do eucalipto são extremamente combustíveis) associada à proliferação de fogos florestais pode potenciar grandes incêndios, de dimensões contra as quais os parcos corpos de bombeiros da província pouco podem.

A plantação de espécies nativas de maior valor deve ser considerada, pois mesmo que estas demorem mais tempo a crescer, a sua adaptação aos terrenos é perfeita, fornecendo ainda às populações bens de valor inestimável como alimentos ou medicamentos naturais. O lucro rápido não pode sobrepor-se aos interesses básicos de uma população já fragilizada.

É assim do interesse geral a implementação de uma estratégia coordenada de organização das machambas a nível da província do Niassa, apoiada pelas instâncias do poder, procurando conter a invasão contínua de áreas florestais selvagens, retomando práticas como o pousio e retornando às antigas machambas que, poucos anos após o seu abandono, com um pequeno esforço de melhoramento, recuperarão a sua vitalidade e produtividade inicial.

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