Cerca de um ano depois de pouco mais de 20 organizações da sociedade civil, incluindo movimentos sociais, terem dirigido a Carta Aberta para Deter e Reflectir de Forma Urgente o Programa ProSavana aos presidentes de Moçambique, Brasil e ao Primeiro Ministro do Japão, continuamos à espera de resposta. No entanto, decorreu em Nampula nos dias 22 e 23 de Abril, o Seminário sobre Divulgação dos Resultados de Investigação Agrária no Corredor de Nacala no âmbito do programa triangular entre Moçambique, Japão e Brasil apelidado de ProSavana.
No encontro, estiveram presentes a equipa de coordenação do ProSavana, o Director Geral do Instituto de Investigação Agronómica de Moçambique(IIAM,) o Director Provincial da Agricultura, parceiros, representantes e investigadores dos centros zonais do IIAM, Organizações da Sociedade Civil, académicos e representantes do sector privado.
Segundo os organizadores (IIAM e parceiros), o seminário visava essencialmente partilhar os resultados até então obtidos nas pesquisas que estão a ser levadas a cabo naquela região conhecida como Corredor de Desenvolvimento Norte? facto que evidencia que já estamos diante de uma das fases programa (ProSavana – PI) que segundo os documentos disponíveis, tem como finalidade maximizar os actuais conhecimentos dos recursos naturais e socioeconómicos do Corredor de Nacala e identificar as tecnologias agrícolas mais adequadas ao desenvolvimento sustentável da agricultura regional.
Posto isto, somos levados a concluir que a Carta Aberta das Organizações da Sociedade Civil foi taxativamente ignorada e que o projecto prossegue, como se tudo estivesse perfeito, indiferente às preocupações das muitas famílias que temem perder as suas terras para dar lugar ao agronegócio e outras actividades, como aliás se vê um pouco por todo país. Na verdade, este seminário não passou de mais uma acção para legitimar o avanço do programa.
Camuflado por outros temas, notou-se que cerca de 60% das apresentações estavam focalizadas em exemplos relacionados com o incremento do rendimento da cultura de soja, desde a consociação com outras culturas, efeitos da adubação, tipo de solo, data de sementeira, entre outros. O que vem, sem dúvida, demonstrar o quão perigoso este programa pode ser, sobretudo quando não prioriza a investigação das principais culturas alimentares, que constituem o garante da sobrevivência da maioria da população moçambicana, os camponeses que vivem nas zonas rurais.
Mais uma vez, chamamos a atenção aos programas que estão a ser implementados em Moçambique e suas semelhanças com tantos outros que falharam no passado. As Organizações da Sociedade Civil já alertaram sobre os perigos do ProSavana, e, o ritmo com que o processo está a seguir tendo em conta a contestação e preocupações já apresentadas pelos camponeses, denota uma tentativa clara de enganar os Moçambicanos ganhando tempo, enquanto nos bastidores se implementa efectivamente o programa como se este fosse consensual.
O ProSavana não reúne consenso nacional. Nem a nível das comunidades locais, nem entre académicos e Organizações da Sociedade civil. Sabemos que em alguns casos, para criar essa ideia de aparente consenso, têm sido levadas a cabo acções de manipulação e intimidação visando líderes comunitários e organizações que lutam na defesa do direito à terra e à soberania alimentar.
É importante que se repense no programa e que se criem acções que vão de acordo com o cenário actual da agricultura moçambicana, onde o acesso a terra fértil e a erradicação da fome e da má nutrição deveriam constituir prioridade para o governo? por mais que isso implique a paralisação ou reformulação do programa até que se garanta que estejam criadas todas as condições para a materialização do mesmo sem por em causa o bem estar socioeconómico e cultural das comunidades locais, bem como a não marginalização e subsistência do mesmo grupo.