Os Verdadeiros Heróis
Há pequenas coincidências que dão muito jeito. Ia o cronista contar-vos que se lembrou de Rosa Parks enquanto ouvia o primeiro discurso de Barack Obama, enquanto Presidente dos Estados Unidos, quando descobre que o dia do nascimento desta senhora é o dos Heróis em Moçambique.
A Rosa Parks foi aquela senhora que, em 1955, na cidade de Montgomery, no estado do Alabama, se recusou a cumprir a lei que determinava que um negro teria que dar o seu lugar sentado num autocarro a um branco. Um pequeno salto de um pardal separa, historicamente, esse dia do da eleição de Obama.
Não vou cansar o leitor sobre o que acho ou deixo de achar, sobre o que se espera deste homem, o fardo que ele carrega, as, provavelmente, demasiadas esperanças nas suas capacidades ou a capacidade que um só homem – mesmo sendo Presidente da maior potência mundial – tem de mudar o mundo. Apenas lhe digo que no dia em que Obama foi eleito me lembrei, também, da sentença de James Joyce acerca dos piers (línguas de areia) nova-iorquinos. Dizia o escritor irlandês que estes piers eram como pontes arrependidas de continuar a avançar pelo rio adentro. Eu senti as pontes a avançar.
Avançaram, também, naquele dia em que Rosa Parks não se levantou do seu lugar ou quando o Comandante “Scully” conseguiu amarar o avião que pilotava, só o abandonando quando o último passageiro saiu. São estes os meus heróis. Não aqueles grandes líderes, políticos, escritores, futebolistas, pintores, militares, filósofos. Nada disso. Aquele que trabalha de sol a sol por pouco dinheiro e ao fim da noite ajuda a construir a casa do seu vizinho. O homem sem instrução que sente a injustiça e arriscando o seu próprio conforto revolta-se. A mulher que partilha a pouca comida da sua mesa com os filhos com fome da sua irmã.
Podem não ser estes que têm direito a nome de praça ou de fotografia nas escolas mas são estes que fazem as pontes avançar no rio da indiferença e da intolerância.