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OBITUÁRIO: John Updike (1932 – 2009) – 76 anos

A Semana

Desde há muito que o seu nome era mencionado para um possível prémio Nobel. No entanto, John Updike já não contava com ele. “Quando se cita um autor durante tantos anos o seu nome já só gera bocejos”, afirmou há algum tempo. O famoso crítico literário alemão, Marcel Reich-Ranicki, assinalou, ironicamente, em 1992 que antes de premiar Updike a Academia Real Sueca certamente que ia “escolher alguém no Sudão.” Morreu na terça-feira, dia 27 de Janeiro, aos 76 anos vítima de um cancro no pulmão.

Updike, nas suas mais de 20 novelas, criou um retrato magistral da classe média dos Estados Unidos. Satírico, sem ser malicioso, descobriu as suas pequenas e grandes mentiras vitais e fez grande vista por trás da fachada. Amor e paixão, infidelidade e traição, sexo e adultério, eram os temas que mais interessavam ao escritor, conhecido nos meio literário americano como o “cronista do adultério urbano”, relatando-o com uma capacidade de observação única, sobretudo o personagem de Harry Angstrom da tetralogia sobre o “Coelho”, que se converteu na chave. Desde a primeira novela, ‘Corre Coelho’ (1960), até ao quarto tomo ‘Coelho em paz’ (1991), e o livro adicional ‘Coelho e a recordação de outras histórias’ (2000), criou um amplo retrato dos costumes dos Estados Unidos.

Apreciador do detalhe, também em assuntos do sexo, Updike retratou neles o desenvolvimento da sociedade desde o final dos anos ´50 até quase ao dobrar do século. O herói, uma ex-estrela de basquetebol, que pela sua torpeza semelhante à dos coelhos é apelidado de ‘Rabbit’ (coelho), tenta constantemente fugir da sua pequena existência pequeno-burguesa familiar e profissional mas fracassa em todas as ocasiões. Duas das novelas da série foram distinguidas com o prémio Pulitzer.

Na obra de Updike é difícil distingui-lo das personagens. As histórias contadas nos livros fazem parte da sua própria vida. Nas suas memórias, ‘Self-Consciousness’ (1989), fica-se a saber muito sobre a sua infância pobre na Pensilvânia, a sua relação com os pais e com as doenças que o apoquentavam. Depois de terminar os estudos em Oxford Updike pensou em ser caricaturista, mas o trabalho encontrado na prestigiada revista ‘The New Yorker’ falou mais alto. Aos 25 anos já vivia da escrita. O seu primeiro grande êxito foi atingido com o livro ‘Parelhas’ que, em 1968, criou um escândalo no país puritano – na sátira quase todos os personagens têm relações amorosas uns com os outros. Porém, os críticos e os leitores ficaram entusiasmadíssimos. Daí em diante, Updike presenteava o público anualmente com uma nova novela. Em 2004, ‘Villlages’ oferece uma espécie de retrospectiva da sua vida, sendo quase um legado. O protagonista, Owen Mackenzie, de 70 anos e casado em segundas núpcias, repassa a sua vida e relata sem piedade os medos da velhice. “Todos os dias percebes com maior peso o antinatural, o que é abandonar a cama para tomar o mesmo e aborrecido pequeno-almoço.”

Até ao fim nunca deixou de escrever: “Na minha idade praticamente estão todos reformados. Mas, como escritor, és patrão de ti próprio. Ninguém disse para recolheres as tuas coisas.”

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