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“Não se pode fechar os olhos ao crescente aumento da criminalidade”, José Mandra, reitor da ACIPOL

“Não se pode fechar os olhos ao crescente aumento da criminalidade”

A criminalidade está a cada dia mais insustentável em Moçambique. Os amigos do alheio, alguns em grupos numerosos, invadem residências ao seu bel-prazer, torturam física e psicologicamente as suas vítimas, violam sexualmente mulheres e crianças na presença dos restantes membros da família e, na pior das hipóteses, matam a sangue frio. Face a este desespero da população, que se queixa também da ausência de acções robustas por parte das autoridades para estancar o problema, a Academia de Ciências Policiais (ACIPOL) diz que não se pode ignorar o recrudescimento deste mal e ninguém devia se escudar na falta de meios como tem sido recorrente, até porque o chefe de um certo sector policial, num determinado bairro, pouco dialoga com os moradores.

Na passada sexta-feira (02), a ACIPOL e a Procuradoria-Geral da República (PGR) juntaram-se, em Maputo, num seminário sobre “Dinâmicas Actuais da Criminalidade em Moçambique: Desafios para Prevenção e Combate”. Todavia, quem foi ao encontro na expectativa de sair com soluções reais e consistentes para estancar a insegurança de que os residentes de diferentes bairros se queixam, certamente que ficou frustrado. Falou-se da criminalidade na sua variada tipologia, mas, mais do que elencar problemas e causas, ninguém apontou como devolver o sossego ao povo.

José Mandra, reitor da ACIPOL, disse ser impossível “fechar os olhos” diante do que para o Ministério do Interior (MINT) está supostamente controlado, o “crescente aumento da criminalidade, sobretudo o crime organizado”. E não se pode ainda “ficar inerte perante esta realidade”, que exige a adopção de medidas enérgicas para evitar a sua progressiva multiplicação.

Segundo ele, é descabida a desculpa de algumas pessoas, segundo a qual a falta de recursos é que dita o aumento a criminalidade. Para a sua instituição, vocacionada para formação de oficiais da Polícia, é preciso também combinar o conhecimento e a inteligência para estancar o crime.

Para cidadão interessa saber que os servidores do Estado estão ao seu serviço

Foto de Emildo SamboFilipe Nyusi, Presidente da República, que também esteve no evento, afirmou que, de há tempos a esta parte, Moçambique tem sido “assolado por uma onda de criminalidade violenta caracterizada por assassinato de cidadãos, em particular os albinos, raptos e sequestros, linchamentos, assaltos à mão armada, roubo de viaturas, entre outros crimes”.

Na óptica do Chefe do Estado, estes actos desassossegam a população, pelo que se exigem esforços conjuntos de prevenção e combate, uma vez que “minam a segurança e o bem-estar social dos moçambicanos”.

De acordo com Filipe Nyusi, o sector de administração da justiça envolve vários actores cujas tarefas e missões são também diversas, mas complementares. “Porém, para o cidadão comum, as diferenças são mínimas ou inexistentes”.

“Quando acontece um crime, tudo o que o cidadão quer é que o mesmo seja esclarecido com a maior brevidade, que o seu património seja recuperado, que o infractor responda em tribunal e seja responsabilizado correctamente caso se prove” o seu envolvimento. “Para o cidadão, o que importa é saber que os servidores do seu Estado estão também ao seu serviço”, disse o Alto Magistrado da Nação, dirigindo-se especificamente à PGR.

À ACIPOL, Nyusi lembrou que não basta apenas “conferir graus académicos”, aos oficias da Lei e Ordem, é necessário “preparar quadros capazes de prever”, antecipadamente, crimes antes de acontecerem e preparem-se para “enfrentá-los com sucesso”.

Envolver as comunidades e pensar numa política arrojada de combater o crime

Foto de Emildo SamboA guardiã da legalidade, Beatriz Buchili, que há poucos meses admitiu que o crime em Moçambique atingiu índices preocupantes, não teve papas na língua para dizer que o seminário acontecia num momento em que o crime organizado, particularmente transnacional, alastra os seus tentáculos.

De acordo com ela, há necessidade de melhorar o envolvimento das comunidades na prevenção deste mal e pensar numa proposta de criação de uma política arrojada de prevenção e de combate.

Refira-se que Beatriz Buchili disse ao Parlamento, aquando da apresentação do informe anual sobre a justiça no país, que os crimes no país tendem a ser cometidos por jovens com idades que variam de 22 a 35 anos.

É imperioso profissionalizar a Polícia

Por sua vez, Fernando Tsucana, adjunto do comissário da Polícia e vice-reitor da ACIPOL, falou dos “Desafios de Prevenção da Criminalidade Organizada em Moçambique”. Sugeriu que é necessário consolidar o sistema de segurança pública e assegurar a formação adequada dos seus profissionais.

Aliás, Rodrigues Nhiuane, inspector da Polícia e chefe do Departamento de Ensino e Aprendizagem na ACIPOL, acrscentou que “para o esclarecimento dos crimes de rapto”, por exemplo “é necessário que a Polícia tenha formação específica para este tipo de crime”.

Há fragilidades na Polícia de Investigação Criminal

Ainda segundo Rodrigues Nhiuane, as reformas ocorridas no Departamento de Informação Operativa da corporação não devem consistir apenas na transferência dos agentes, de Maputo para as outras regiões do país.

“O uso de métodos ineficazes na investigação, associado à falta de colaboração entre a polícia e as vítimas, os familiares e as testemunhas são factores da fraca resposta da Polícia de Investigação Criminal aos crimes de rapto na cidade de Maputo”, o académico, que dissertava sobre “Contribuição da Investigação Científica na Prevenção e Combate à Criminalidade”.

Num outro desenvolvimento, Nhiuane disse que o laboratório e o Piquete Operativo da Polícia têm fraca participação na investigação dos crimes de rapto, o que impede que ajudem a justiça a produzir provas que confirmem a culpabilidade ou inocência dos indiciados.

Há fragilidades na produção de provas contra supostos criminosos

Para o quadro da ACIPOL, no princípio os sequestros resultavam do ajuste de contas, mas, actualmente, “o móbil é sobretudo económico”. Para controlar a situação, “sugere-se a criação de uma unidade/brigada policial especializada que se responsabilize pela prevenção e combate a este tipo de crime organizado”.

Verifica-se a insuficiência das informações colhidas pelos depoimentos das testemunhas por não trazerem factos que conectam os infractores ao crime por eles cometidos. E não só, “o processo de comunicação estabelecido pela polícia de protecção relega ao segundo plano o Ministério Público, enquanto entidade que dirige a acção penal”.

Para além disso, Nhiuane disse ser notório o desconhecimento do agente instrutor da importância de anexação nos processos dos telefones celulares dos suspeitos ou arguidos, mesmo sabendo que as comunicações entre os autores do crime eram permanentemente feitas através dos seus telemóveis.

No bairro de Magoanine “C”, exemplificou o orador, há uma relação entre a malha urbana e criminalidade. “As acções policiais de prevenção da criminalidade” resumem-se “na perspectiva do trabalho policial comunitário, materializado pelo chefe de sector, que pouco dialoga com os residentes do bairro”. Assim pode-se “aferir que as acções de prevenção, tanto policial, como comunitárias, ainda não são efectivas”;

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