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Muembe: população consome água imprópria

Muembe: população consome água imprópria

A população do povoado de Muempe, localidade de Metocheria, no posto administrativo de Carapira, na província de Nampula, está literalmente entregue à sua sorte. Desamparadas e votadas ao eterno sofrimento, pouco mais de cinco mil pessoas vivem em situações humanamente inaceitáveis, com um saneamento de meio deveras precário.

O mais agravante é que o líquido, que de precioso não tem nada, apresenta uma coloração fora do comum: castanha e vermelha. É esta água que a população sedenta consome, sem a mínima consciência das implicações que isso pode ter na sua saúde, na lógica segundo a qual “na falta do melhor, o pior serve”.

A localidade de Metocheria dista 135 quilómetros da cidade de Nampula. Trata-se de uma zona residencial em que presença colonial portuguesa se fez sentir com maior intensidade. Não escapa à memória o facto de ter sido, em tempos remotos, um local onde se registava uma avalanche de pessoas ávidas de comprar produtos da primeira necessidade.

Ela era uma potência no cultivo de milho, amendoim, mechoeira e mapira. Entretanto, ninguém imaginaria que os moradores aquela pacata localidade viveriam em condições desumanas.

Era uma vez…

O povoado de Muempe é uma zona esquecida no tempo. Foi para lá onde a nossa reportagem se deslocou com o fito único de ver in loco o sofrimento e a miséria a que a população se viu sujeita.

Quando se proferem discursos oficiais pelos governantes deste país, esquece-se completamente desta triste realidade com réplicas noutras zonas recônditas deste vasto Moçambique. “Porque não temos quem nos ajude, optamos por abrir poços, embora tal água seja suja. Até os nossos antepassados consumiam este tipo de água”, comenta a moradora Anita Belta.

Chegados ao povoado de Muempe, a cinco quilómetros da estrada nacional número 8, encontrámos Francisco Caetano, de 43 anos de idade e natural do distrito de Moma. É pai de sete filhos, os quais nasceram e cresceram a beber água turva.

Diz que vive naquele pedaço do país, desde o ano de 1987 e, quando ali chegou, a cor castanha da água foi o que mais lhe despertou a atenção, porém, diga-se em abono da verdade, é típica da zona e a população já se habituou a consumi-la.

Não se pode falar de doença

Arlindo Mussa conta 68 anos de idade, metade dos quais vividos em Muempe. Ele afirma que, mesmo sabendo que a água que consomem é imprópria para o ser humano, isso não o preocupa. “Esta água sempre foi e continua a ser assim, e nunca nos provocou problemas de saúde. Nunca tivemos na nossa comunidade doenças resultantes da mesma”, comenta.

Num outro desenvolvimento, o nosso interlocutor apontou que a poluição das águas dos rios também é um dos factores que torna salobre as águas dos rios.

“Desde que começou a operar na zona uma empresa denominada Matanusca, todos os rios, principalmente os que são usados pela população para obter água, estão poluídos”, conta para depois acrescentar que camiões daquela empresa têm deitado restos de bananas e plásticos nos pequenos riachos.

“É preciso coragem para viver em Muempe”

Amina Carlos, de 52 anos de idade, professora reformada, diz que para se viver na zona do Muempe é necessário coragem. Quando se instalou naquela localidade, ficou espantada com o tipo de água que se consumia. “Infelizmente, de há um tempo a esta parte, não recebo água vinda da capital provincial e, para não morrer a sede, acabo por optar por este líquido que o conceito precioso não lhe cabe”, afirma.

“As autoridades governamentais nunca constroem furos de água potável. O único furo existente está instalado na casa do régulo e não são todos que têm acesso a ele. Mesmo assim, raramente a água do tal furo é limpa”, conta.

Crianças na iminência de murchar

A nossa reportagem soube de um dos líderes comunitários daquela zona, que não se quis identificar, que, em resultado do consumo da água turva, muitas crianças sofrem de várias doenças e suspeita-se que uma das causas seja a má qualidade da água consumida pela população.

“Sou líder comunitário do terceiro escalão e vivo aqui há bastante tempo. A Matanuska é uma empresa que está a causar problemas ambientais neste povoado, deitando uma série de resíduos sólidos e líquidos nos rios e riachos, aos quais as pessoas acorrem à procura de água para beber”, comenta.

A nossa equipa de reportagem, que visitou o povoado de Muempe esta semana, teve a “sorte” de lhe ser servido um copo de água, tendo testemunhado quão turva e nojenta é a água, porém, é a que milhares de moçambicanos são obrigados a consumir. As consequências não se fizeram tardar, designadamente diarreias e dores de cabeça fortes.

Entretanto, encetámos esforços no sentido de ouvir a empresa acusada de poluir as águas de Muempe, mas debalde. Uma funcionária da direcção executiva da Matanusca na cidade de Nampula disse que a pessoa que podia prestar informações em nome da instituição tinha viajado e não sabia quando voltava.

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