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Morreu um dos últimos rostos humanos da política russa

Morreu um dos últimos rostos humanos da política russa

Víctor Chernomyrdine, primeiro-ministro da Rússia durante os conturbados anos 90, quando o país abandonava o comunismo e desenvolvia uma economia de mercado, morreu esta quarta-feira, aos 72 anos. Com a morte de Chernomyrdine desaparece também um significativo representante de uma certa cultura política de rosto humano, um estilo que caiu em desuso na Rússia de hoje.

Víctor Chernomyrdine, que faleceu aos 73 anos depois de uma doença prolongada, foi chefe do Governo da Rússia de 1992 a Março de 1998, tendo acompanhado o presidente Boris Yeltsin durante todos esses anos. Também foi fundador do consórcio Gazprom, o maior consórcio de gás do mundo.

Os russos recordam-no sobretudo pelos seus comentários e aforismos que acabaram por se enraizar no léxico popular. Uma das suas frases preferidas foi: “Queríamos fazer melhor, mas resultou como sempre.” Esta frase é considerada a mais expressiva da constatação do carácter cíclico e das dificuldades de sucessivas tentativas de introduzir reformas na Rússia.

Chernomyrdine nasceu em Orenburg, no sul dos Urais, e formou-se indústrias energéticas – petróleo e gás –, tendo dirigido o Ministério da Indústria de Gás da União Soviética, instituição que em 1989 daria origem à Gazprom.

O projecto de comercialização de um ministério foi autorizado pelo então chefe do Governo soviético, Nikolai Rizhkov, e quando Chernomyrdine se ofereceu para passar de ministro a ‘comerciante’, Rizhkov exclamou: “Está louco!”

Para além de ter transformado a Gazprom numa empresa, processo que demorou vários anos, Chernomyrdine dirigiu também o primeiro projecto pós-comunista de formação de um partido forte na arena política russa.

Assim surgiu, em 1995, o partido Nossa Casa é a Rússia (NCR), para onde convergiu uma grande parte da elite política que, tal como hoje, se orienta pelas indicações do Kremlin.

No entanto, nos anos 90’, aqueles órfãos políticos do Partido Comunista não haviam ainda adquirido a prepotência e o cinismo que demonstrariam depois na Rússia Unida, o partido de Vladimir Putin, que hoje possui a maioria no parlamento.

A NCR ficou em terceiro lugar nas eleições de 1995, atrás dos comunistas e do partido do populista Vladimir Jirinovski. Vladimir Rizhkov, que foi vice-líder da Duma (Câmara baixa do parlamento) e que colaborou na fundação do NCR, recorda que Chernomyrdine negociava compromissos com os seus opositores.

Foi no seu consulado que se aprovou a lei que permitiu eleger os governadores. Posteriormente, já na presidência de Putin, os governadores transformaram-se em figuras nomeadas, dependentes da confiança do Kremlin e não do voto popular.

O seu elevado sentido de responsabilidade levou-o a negociar com o guerrilheiro tchetcheno Shamil Basaiev, quando este tomou de assalto um hospital no norte do Cáucaso, ameaçando matar centenas de reféns.

Diante das câmaras de televisão, Chernomyrdine falou ao telefone com Basaiev e a maioria dos reféns foi libertada. Posteriormente, os guerrilheiros tchetchenos seriam considerados pelo Kremlin exclusivamente como terroristas, com os quais não podia existir qualquer diálogo ou negociação.

Em 1996, quando Yeltsin foi operado ao coração, Chernomyrdine assumiu temporariamente a chefia do Estado, porém a sua imagem deteriorou-se nos últimos tempos do seu mandato.

Os ecologistas acusaram-no de ter morto a frio dois ursos numa caçada e a comunicação social de ter feito uma fortuna graças ao seu vínculo com o sector dos hidrocarbonetos.

Em Março de 1998, Yeltsin demitiu- o, mas em Agosto daquele ano, depois da crise económica que afundou o rublo, regressou à chefia do Governo, embora o parlamento não o tenha ratificado no cargo.

Em Maio de 2001, foi nomeado embaixador na Ucrânia, cargo em que permaneceu até Junho de 2009, tendo estado no centro da ‘guerra do gás’ que opôs a Gazprom aos dirigentes ucranianos.

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