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Mahengane quer enganar a pobreza rural!

Mahengane quer enganar a pobreza rural!

Muito recentemente, o conceituado músico moçambicano, António Marcos, concluiu a sua formação na área de Técnicas de Tecelagem. Em resultado disso, o artista quer acelerar o processo de combate à pobreza no seu país. Mas antes, inventou um tempo para nos falar das impressões que a sua estada na Etiópia, país onde realizou o curso, lhe causou.

No ano 2010, por ocasião da celebração de mais uma data festiva da independência nacional, o músico moçambicano António Marcos partiu com destino à República Federal da Etiópia. Entre outros, o autor de Mahengane tinha como objectivo celebrar a efeméride com a comunidade moçambicana residente naquele país a convite da Embaixada de Moçambique no referido Estado.

Sucede, porém, que durante o intercâmbio, o compositor e intérprete moçambicano teve a oportunidade de acompanhar algumas criações de obras de artesanato realizadas por alguns cidadãos etíopes. António Marcos ganhou interesse particular pelas técnicas de tecelagem.

“Eles produzem tecido de forma artesanal um processo simplesmente económico, com base em material local. O procedimento consiste na transformação do algodão em linha e desta em tecido de que derivam as vestimentas. Isso mostrou-se uma iniciativa boa”, começa por dizer o artista.

Visivelmente impressionado com a referida arte, António Marcos afirma que “me foi questionado se eu tinha algum interesse em aprender os processos do referido ofício. Respondi favoravelmente, afinal era proveitoso. Daí que se criaram condições para que eu frequentasse aulas numa escola de especialidade durante um período de 45 dias com a equivalência de três meses. Ou seja, estudava em dois turnos como forma de duplicar o tempo”, reitera.

Terminado o curso, ainda no ano de 2010, convencido de que já era técnico da área de tecelagem, o artista regressou a Moçambique, onde aguardava que se lhe enviassem o seu certificado de frequência ao curso, o que não aconteceu.

Afinal, “a instituição escolar estava a criar condições para a criação de bolsas de estudo de modo que este ano, 2012, regressei novamente para a Etiópia onde permaneci um período de cinco meses na companhia de dois cidadãos moçambicanos, nomeadamente Fernando Ruben Tcheco e Ofélia Sithoe, para terminar o curso”.

Merece respeito

De acordo com o nosso interlocutor, a técnica de tecelagem é uma prática que merece o respeito de qualquer pessoa. Com base nela pode-se transformar a linha para a produção de qualquer tipo de tecido.

O entrave, para António Marcos, é que a aquisição da máquina para o efeito tem um custo oneroso daí a necessidade de um bom investimento financeiro. A par disso, os etíopes inventaram uma forma de criar uma estrutura artesanal, de um custo muito reduzido, para realizar a tarefa aludida.

Em tal processo, segundo a fonte que estamos a citar, o único material metálico que se emprega são pregos. É por essa razão que o cantor acredita que, uma vez implementada em Moçambique, a iniciativa poderá constituir uma mais-valia para as populações em larga medida.

“Será de grande impacto social não somente para mim, como também para o povo moçambicano, sobretudo porque fui instruído para formar técnicos de tecelagem. Ou seja, estou equipado e preparado para trabalhar nessa área de tal sorte que espero que isso aconteça rapidamente”, considera acrescentando que “como sou carpinteiro, serei o primeiro a montar a estrutura do trabalho não para realizar uma exposição, mas para me actualizar enquanto se espera pelo arranque do projecto para a efectivação da iniciativa em Moçambique”, comenta de modo confiante.

Combater a pobreza

Sem precisar as datas, António Marcos referiu que ainda ao longo do ano em curso será realizado um projecto no país que visa não somente capitalizar os conhecimentos dos três cidadãos moçambicanos formados na Etiópia em matérias de tecelagem, da mesma forma que irá agir no sentido de capacitar quaisquer pessoas que se interessarem pelo mesmo trabalho.

O impacto imediato da iniciativa, já que preferencialmente será instalada nalguns espaços rurais do país, será o combate à pobreza que se faz sentir.

Para o artista que fala ao abrigo do projecto em alusão, as possibilidades de a pobreza rural resistir aos golpes que (com base na mesma iniciativa) será infligida são diminutas.

Basta ter-se em conta que “tudo o que aprendi na Etiópia será ministrado às populações que se encontram em zonas rurais e que se julgam esquecidas pelo Governo como, por exemplo, devido à falta de energia eléctrica”. Para a materialização da referida actividade, a máquina não precisa de electricidade. Trata-se de um trabalho manual.

Mais importante ainda é que, depois de implantado no país, o projecto irá criar uma dinâmica que alimentará “o surgimento de uma indústria artesanal no campo porque se montarmos um sistema que produz tecidos, a baixo custo, mais adiante, o mesmo pode ser transformado em vestuário pelos alfaiates com a finalidade de alimentar o mercado. Isso será uma grande vantagem, muito em particular porque a acção não precisa, necessariamente, de pessoas com altos estudos. O importante é que haja pessoal com vontade e vigor físico para operar no ramo”, refere.

Um povo diferente

Além do facto de os etíopes possuírem um país com um fuso horário diferente de Moçambique, a mesma nação não ter experimentado o processo de colonização europeia, António Marcos ficou impressionado pelo tipo de sociedade que o mesmo povo edificou.

“Eles é que determinam o rumo do seu país. Nas suas comunidades, os outros animais não humanos não são vedados de circular no espaço público. É por essa razão que quando as pessoas, por exemplo, as que conduzem os autocarros têm tido muito cuidado para não atropelar outrem sob pena de serem encarcerados. Ou seja, eles têm um profundo respeito pela vida incluindo a dos animais”, diz.

No entanto, os factores que despertaram a curiosidade do nosso interlocutor em relação aos cidadãos da nação de Haile Selassie não se esgotam:

“Eles constroem condomínios de luxo que são ladeados por currais e ninguém reclama por isso. Há uma concepção segundo a qual os animais (também) são donos da natureza. Ainda que os seus excrementos sejam nauseabundos, os bichos devem ser respeitados pelos homens. Aliás, eles, os referidos seres vivos, são os primeiros habitantes da terra. Por isso, em qualquer lugar naquele país onde o Homem erguer alguma moradia, se deve ter em conta esses habitantes originais”. Nada mais poderia ter encantado o nosso artista.

António Marcos narra-nos a história sem esconder a satisfação que isso lhe causa. Até porque “eu gostei disso! Os animais também têm o direito de viver em qualquer lugar. Isso é muito bonito. Os carros não circulam de qualquer maneira. Se alguém atropela um peão fica 17 anos na cadeia”.

Não vou pedir apoios

Em contacto com o artista, ficámos impressionados com o facto de, contrariamente ao que tem acontecido, o cantor não se ter curvado a ninguém para pedir apoios. António Marcos falou-nos apenas da sua iniciativa. Foi à luz desse comentário que o artista ganhou fôlego para engendrar um desabafo em relação à suposta falta de incentivo às artes e aos artistas, no geral, em Moçambique.

“Eu não vou exigir condições muito menos concorrer a apoios de ninguém para implementar esta iniciativa. Os mecanismos para a sua materialização encontram-se na minha mente, assim como na minha força física. Devo e conseguirei realizar esta iniciativa. Se não for possível na cidade, partirei para o campo para explorar sisal e produzir carpetes, das quais, uma vez comerciadas, obterei lucro por meio do qual farei melhores investimentos na mesma indústria”, diz.

E mais, se for o caso, “onde é que pedirei apoios? Em Moçambique as pessoas não apoiam os artistas. Eu já tenho mais de 40 anos de carreira e, ao longo do mesmo tempo, quase que nunca tive nenhum financiamento para realizar as minhas actividades. Mesmo na minha música. Não cheguei a granjear simpatias de nenhuma instituição com vista a obter auxílios.

Em contra-censo, muitos artistas moçambicanos são apoiados. Por isso não quero envolver-me nesses esquemas”, realça acrescentando que “se as organizações entenderem que podem auxiliar o incremento da iniciativa, conto com elas”.

No entanto, acerca de um facto não se pode recusar: “A inexistência de uma máquina para a produção de malha retardará os processos do meu trabalho. Porque os referidos aparelhos são produzidos na China e são vendidos a um custo muito elevado”.

Ainda este mês, o artista irá viajar para a República da África do Sul, onde fará uma pesquisa sobre a existência do aparelho. Caso exista, “tarde ou cedo eu criarei condições para comprá-lo”, comenta António Marcos. Lamentável condição Dono de uma carreira artística de longos anos, em António Marcos muitas outras virtudes profissionais podem ser citadas: carpinteiro, marceneiro, estofador, talhador, pintor e decorador, cozinheiro, mecânico auto, técnico de tecelagem. É por essa razão que o músico considera:“Sou um artista completo”.

Falou-nos da sua arte musical em que, presentemente, está a criar condições para a publicação do mais um trabalho discográfico, o que acontecerá nos finais do ano corrente. A par disso, António Marcos reiterou que “não posso abandonar a música. Foi graças a ela que ganhei muitas oportunidades na vida”.

Nos dias que correm António Marcos anda desapontado em relação ao comportamento de alguns jovens para com a pessoa idosa.

É que, para si, actualmente “sempre que os jovens vêm um idoso acusam-no de ser feiticeiro. Eu tenho 60 anos e praticamente já sou idoso. Garças aos jovens, serei considerado feiticeiro. Os jovens não cogitam que (também) correm o risco de, em função das suas acções e atitudes, quando envelhecidos serem acusados de práticas de feitiçaria pelos seus netos”.

É por essa razão que o artista se dissocia dos sistemáticos actos bárbaros e desumanos por meio dos quais se trata a pessoa idosa para emitir um conselho:

“Os jovens precisam de se escudarem nas pessoas de idade pronunciada e apoiá-las porque elas necessitam do seu amparo. Em certo sentido, a pessoa idosa retorna à infância e, por isso, precisa do carinho e do apoio dos seus próximos que, muitas vezes, os têm desamparado tornando a sociedade moçambicana um espaço onde é difícil viver”.

O artista fundamenta a sua posição afirmando que, “o que eu sinto é que nas cidades moçambicanas os idosos não têm sido amparados. São agredidos de diversas e inaceitáveis formas”.

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