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Maguanza: onde a vida está estagnada

Maguanza: onde a vida está estagnada

A localidade de Maguanza, no posto administrativo de Moamba-sede, na província de Maputo, é um dos testemunhos de que o fosso entre os ricos e os pobres prevalece no país, mormente nas zonas onde até a buzina de uma motorizada ainda é um luxo. A penúria dos habitantes daquela parcela de Moçambique consiste na falta de um pouco de tudo, desde água e luz, passando pelos estabelecimentos de ensino e das unidades sanitárias, até desembocar na falta de meios de transporte. Aquela é uma circunscrição geográfica como outras várias esquecidas pelas autoridades no que diz respeito à construção de infra-estruturas e provimento de meios básicos para a sobrevivência de um ser humano.

À medida que se caminha mais para o interior do povoado, a miséria e o sofrimento atiçam as emoções devido à situação a que estão sujeitas as famílias. A tónica dominante das reclamações tem a ver com facto de que, em caso de doença, não se pode ir ao hospital porque não existem unidades sanitárias.

Bebe-se da mesma lagoa com o gado porque faltam fontanários, cisternas e poços artesanais. Em relação a escolas, estas situam-se em locais muito distantes das comunidades e pouca gente ousa percorrer quilómetros, já que não há transporte semicolectivo. Maguanza dista 47 quilómetros da capital moçambicana. O meio de transporte mais utilizado para se chegar àquele ponto do país é comummente o comboio.

As queixas dos habitantes são várias, mas as mais sonantes estão relacionadas com a falta de emergia eléctrica, água potável e as longas distâncias para se encontrar uma escola. Sobre este último aspecto, apurámos que os pais e encarregados de educação estimulam os filhos a dedicarem-se à pastorícia em detrimento da instrução, supostamente porque nas proximidades não existe um estabelecimento de ensino. Há, também, gente que não manda os seus dependentes para a escola por falta de recursos.

Fernando Chongo, o director da Escola Primária do 1o Grau de Maguanza há 10 anos, relatou ao @Verdade que apenas 82 alunos são instruídos naquela instituição do Estado, dos quais 50 porcento não têm fardamento e o grosso não dispõe de material didáctico. A falta de um centro de saúde e o crónico problema para se ter acesso ao precioso líquido interferem negativamente no aproveitamento pedagógico dos instruendos ali matriculados. É que, por um lado, os alunos sofrem bastante de malária porque não usam redes mosquiteiras. Por outro, registam atrasos frequentes às aulas devido à procura de água.

“Temos uma gritante falta de água; para minimizarmos o problema, pedimos a cada aluno para trazer de casa cinco litros do precioso líquido”, disse o director. “Devido à falta de docentes e espaço ministramos as aulas em salas mistas, ou seja, juntamos os alunos da 2a classe com os da 4a classe. Os estudantes da 3a classe estudam na mesma sala com os da 5a classe. Só os alunos da 1a classe estudam numa sala em separado. Assim é difícil acompanhar o desempenho pedagógico de cada aluno e as suas dificuldades de aprender aumentam”, explicou-nos Fernando Chongo.

O dirigente da escola, que faz parte dos quatro professores que dão aulas naquela escola, lamenta o facto de ter alunos na 5a classe que lêem com bastantes dificuldades e não sabem escrever os seus nomes. Certos estudantes desistem devido à fome. Contudo, para incentivar os petizes a não faltarem à escola, sobretudo os mais necessitados, a instituição, composta apenas por quatro salas de aula, estabeleceu uma parceria com a Associação do Desenvolvimento do Povo para o Povo (ADPP) que consiste em garantir refeições diárias.

Mas há problemas em arranjar água para confeccionar os alimentos. Segundo Fernando Chongo, que gere a única escola existente em Maguanza há 10 anos, é urgente que se construa um centro de saúde naquela localidade porque são frequentes os partos domiciliários por causa da distância que separa a circunscrição da sede de Moamba.

“Temos, também, crianças que perdem as aulas devido à malária. Para mim, a corrente eléctrica constitui uma prioridade tal como o é a instalação de fontes de água e um hospital”. O nosso entrevistado queixou-se ainda do facto de o jovens preterirem a escola num cenário em que os idosos com idade acima dos 65 anos estão, cada vez, mais empenhados na alfabetização.

“Muitos jovens daqui não sabem escrever por desleixo”. A partir da estação central dos Caminhos-de-Ferro de Moçambique (CFM), na baixa da cidade de Maputo, embarcamos para Maguanza. À chegada, a primeira impressão que se tem é a de que as estatísticas sobre o desenvolvimento do país que têm sido propaladas pelo Executivo podem ser enganadoras ou simplesmente espelham a realidade dos centros urbanos e vilas. Em Maguanza não há um centro de saúde sequer.

Aliás, a viagem para aquela parcela da província de Maputo é feita de comboio que obedece a um itinerário horário que significa sofrimento para os moradores. Segundo Francisco de Almeida, morador de Maguanza, o tipo de vida que se leva naquele ponto é um dos indícios de que as autoridades não olham de igual modo para os moçambicanos.

“Não se justifica estarmos a beber a mesma água que os animais numa lagoa quando estamos a menos de 60 quilómetros da Presidência da República”. Este cidadão acusou o Executivo de estar a ignorar os reais problemas do povo e questiona, por exemplo, como é que uma localidade que está a apenas 47 quilómetros do coração da capital do país não possui nenhum outro meio de transporte rodoviário.

O chefe do quarteirão 4 em Maguanza, João Mangala, disse que a falta de água é um verdadeiro drama para os residentes. A localidade inteira depende de um único fontanário que funciona há dois anos e quando avaria recorre-se à água da lagoa, na qual o gado bebe. Quando a escassez é deveras crítica os moradores acarretam água em Moamba e usam o comboio como meio de transporte.

“Tenho quatro filhos, dois nasceram de partos domiciliários e quase que perdia os outros; a mãe quase que dava à luz no comboio”, recordou-se João, que também manifestou a sua indignação em relação à falta de energia eléctrica, o que, na sua opinião, o impede de ser empreendedor no ramo de serralharia. Domingo Lápis, outro residente de Maguanza, é pastor de gado e tem a seu cargo 56 bovinos e 68 cabritos.

Ele abandonou a cidade de Tete, sua terra natal, com destino a Maputo porque achava que esta parcela do país é um eldorado. Contudo, a sua vida resume-se em cuidar da manada do seu tio num vasto quintal no interior de Maguanza. Ele disse-nos que, mensalmente, aufere 1.500 meticais, valor que considera bastante abaixo das suas necessidades. “Gostaria de ter outro emprego e abandonar este povoado sem água, luz e hospital”.

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