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ASSCODECHA defende desenvolvimento inclusivo no Chamanculo

ASSCODECHA defende desenvolvimento inclusivo no Chamanculo

Quem percorre o histórico bairro de Chamanculo, na periferia da cidade de Maputo, em nenhum momento pode ficar alheio aos problemas que afectam a zona. O deficiente saneamento do meio ambiente é o que mais salta à vista. No entanto, na tentativa de minimizar este e outros problemas, em 2001, foi criada a Associação Comunitária para o Desenvolvimento de Chamanculo (ASSCODECHA). A agremiação desenvolve actividades em diferentes áreas, desde questões de promoção de higiene, passando pelo combate à droga, até à educação profissional dos jovens residentes naquele ponto do país. Em relação a esta última acção, por ano são formados 75 jovens em diferentes áreas, para além de se prestar apoio a cerca de 200 crianças com material escolar. O @Verdade conversou com o gestor de projectos da agremiação, Zeca Chioco, e ficou a saber, dentre vários assuntos, que no universo de pessoas de pouca idade instruídas, anualmente, cerca de 25 porcento conseguem empregar-se.

@Verdade (@V): Olhando para o percurso da Associação desde a sua fundação, qual tem sido o impacto das vossas actividades na comunidade onde actuam?

Zeca Chioco (CR): Antes de falar do impacto na comunidade devo esclarecer que nós, no início, em 2001, por uma questão de estratégia que adoptámos para medirmos as nossas capacidades actuávamos apenas no Chamanculo “C”, e só em 2012 incluímos as restantes subdivisões do bairro, nomeadamente Chamanculo “A”, “B” e “D”. E os primeiros sectores em que trabalhámos foram o de saneamento e o de formação profissional.

Ora, o impacto das nossas actividades verifica-se principalmente na camada jovem que é também nosso grupo- -alvo. Para uma melhor compreensão disso basta recordar que, quando iniciámos este trabalho, Chamanculo era um bairro onde muitos jovens tinham um nível de escolaridade baixo e o grosso deles se encontrava sem ocupação. Os que não estavam nessa situação não tinham formação profissional. Quando introduzimos esta área foi possível dar ocupação e rumo a alguns jovens.

Pelos menos aprende(ra)m a fazer alguma coisa. E nesse âmbito hoje temos jovens que passaram por aqui e tiveram uma formação profissional que inclui estágios durante três meses e alguns já estão a trabalhar. Recentemente, tivemos o caso de dois jovens que realizaram estágios em Portugal e já estão a trabalhar num dos hotéis daqui da praça.

@V: Quantas pessoas já beneficiaram do vosso apoio na área da formação?

ZC: Neste momento, é-me difícil indicar o número global, mas posso falar dos beneficiários a partir de 2012, dum projecto relativamente recente. Nós, agora, estamos a desenvolver um programa que envolverá um total de 200 jovens beneficiários até o fim deste ano. Até este momento já beneficiámos 150 jovens em termos de formação profissional. Devo apontar que, em média, anualmente formamos cerca de 75 jovens, dos quais cerca de 25 porcento conseguem arranjar emprego.

@V: Daquele grupo de 200 existem pessoas afectas ao mercado de emprego?

ZC: Bom, temos um grupo que está em formação. Temos os já formados e outros ainda que estão já a trabalhar.

@V: Quais têm sido os grandes constrangimentos dos jovens formados no acesso ao mercado de trabalho?

ZC: A verdade é que ingressar no mercado de emprego constitui um grande desafio. Não está fácil, mesmo com a formação e estágio as dificuldades mantêm-se. É verdade que o estágio ajuda de forma significativa porque em alguns casos o patronato acaba por gostar dos serviços prestados pelos estagiários e contrata-os.

Mas, também, temos que reconhecer que a nossa área de formação, designadamente hotelaria, restaurante e bar, não oferece muitas opções aos jovens. Destes, muitos deles não conseguem empregos fixos, mas periodicamente são chamados a executar trabalhos em ocasiões específicas.

Os centros de formação não estão devidamente equipados e, como consequência disso, quando os jovens terminam os cursos não conseguem enquadrar-se no mercado, pois o material que é usado nos locais de aprendizagem é diferente do que encontram já no terreno. Quando chegam ao local de estágio são colocados a trabalhar com um equipamento cujo uso não conhecem. Deste modo, a adaptação torna-se complicada.

@V: E como pretendem superar esta situação?

ZC: Neste momento, estamos num processo de discussão sobre o tipo de formação que vamos implementar nos próximos tempos e como isso será feito. Estamos a debater a questão com os parceiros e queremos envolver também as pequenas e médias empresas na discussão para vermos se em conjunto podemos encontrar uma solução que beneficie a todos. Até porque o processo de desenvolvimento deve envolver a todos, pois só assim poderemos ter sucesso. Queremos ajustar, quanto antes, algumas questões que não estão bem nesta área.

@V: Para além de hotelaria, restaurante e bar quais são as outras áreas de formação?

ZC: Temos formação na área automóvel. Formamos mecânicos, profissionais de bate-chapa e pintura de viaturas. Temos cursos de culinária, corte e costura, informática básica e cabeleireiro.

@V: No sector de educação, o que se tem feito?

ZC: Na área da educação apostamos em desenvolver actividades de apoio escolar a crianças que estão nas escolas primárias nos quatros bairros onde actuamos. O nosso foco são as crianças necessitadas residentes no Chamanculo e que estejam a estudar nas escolas que estão dentro do perímetro geográfico em que realizamos as nossas actividades. Prestamos apoio em termos de material escolar, damos reforço escolar que consiste em explicar-lhes as matérias em que estejam a enfrentar algumas dificuldades. Fazemos esse trabalho em coordenação com as escolas e os professores para anos ajudarem a identificar crianças cujas famílias, por causa da pobreza, não têm capacidade de adquirir material escolar.

@V: Essas dificuldades, na assimilação das matérias, resultam de quê?

ZC: Nós entendemos que há um conjunto de problemas que levam a que as crianças tenham um mau desempenho escolar. O ambiente no qual cada criança vive e cresce influi, de forma significativa, na sua instrução. Algumas vivem com os pais, mas num ambiente familiar que não é saudável. Outras vivem apenas com os avós que, por causa da idade, já não conseguem cuidar delas devidamente, havendo casos em que os papéis destes se invertem. A criança passa a cuidar da avó.

A alimentação não é adequada. Todos estes factores mexem com a cabeça de criança e, por isso, há um mau desempenho. Nós oferecemos o nosso apoio e procuramos sempre ver como é que cada criança vive. Nalguns casos apercebemo-nos de que elas não são necessariamente pobres, mas porque vivem num ambiente em que os pais são desleixados, não prestam atenção, por exemplo, ao aspecto de como a criança está trajada quando vai para a escola, se tem ou não roupa limpa, se os cadernos estão em condições, deixando a criança ir suja para as aulas.

@V: Quantas crianças, neste momento, estão a beneficiar de apoio?

ZC: Estamos a falar de 200 crianças. Ainda na educação temos a alfabetização de adultos. É uma das primeiras áreas que abraçámos em 2002. Este ano tivemos a experiência que consistiu na ida aos mercados para trabalharmos com as vendedeiras. Começámos no Mercado 7 de Abril. Elas escolhem um momento do dia em que não há muito movimento de clientes e vão ter aulas. Como essa experiência foi positiva tivemos a ideia de replicar a iniciativa na Direcção Distrital e alargarmos para os mercados do Fajardo e da Malanga. É, na verdade, uma experiência salutar. Quando iniciámos não acreditávamos muito no projecto porque pensávamos que as senhoras estariam mais preocupadas em vender.

@V: Como é que se faz sentir o impacto dessa alfabetização na vida dos beneficiários?

ZC: Bom, o que acontece é que muita gente consegue suprir as dificuldades básicas de leitura e escrita e cada pessoa usa os conhecimentos que adquire no seu dia-a-dia. Temos exemplos concretos de pessoas que passaram da alfabetização e que agora estão no nível secundário e outras na faculdade. O actual director desta associação passou por esse processo de alfabetização de adultos. É que, com a alfabetização, as pessoas, em invés de fazerem a 5a classe em cinco anos fazem em três.

@V: Na área relativa à cidadania, têm alguma actividade virada para os processos eleitorais?

ZC: Esses assuntos, em algum momento, são-nos difíceis de abordar porque se suspeita que estamos do lado de um ou do outro partido. É difícil a comunidade perceber certos aspectos. Nós até podemos sensibilizar as pessoas a aderirem ao recenseamento e mais tarde ao voto, mas o que acontece é que elas, apesar de estarem nas associações, estão livres de pertencer a partidos políticos. E a comunidade sabe, por exemplo, que o director- geral tem inclinação para o partido “X” ou “Y”, então, no momento em que faz esse trabalho desconfiam que ele esteja ao serviço do seu partido.

@V: Em que consiste a parceira com o Conselho Municipal da Cidade de Maputo?

ZC: Somos parceiros apenas em questões de saneamento do meio. As primeiras formações dos nossos técnicos que trabalham neste sector foram dadas pelo Conselho Municipal de Maputo, na altura do presidente Artur Canana. O projecto de latrinas melhoradas foi financiado pelo município e outros parceiros. Neste momento, estamos num programa de construção de sanitários para algumas famílias. Nesse projecto o Conselho Municipal vai-nos indicar os locais adequados para construirmos os vasos sanitários de modo que não sejam destruídos logo em seguida.

@V: A quem, concretamente, vão beneficiar esses vasos sanitários?

ZC: Hoje, temos famílias que partilham casas de banho e algumas que fazem necessidades em plásticos. O processo de identificação das famílias está a decorrer. Ainda sobre o saneamento do meio temos realizado jornadas de limpeza. Essas jornadas acontecem de forma irregular, mas sempre que identificamos algum sítio crítico que precisa de uma intervenção urgente contactamos as estruturas locais e elas mobilizam a comunidade para a jornada de limpeza.

Na época da chuva, finais de Fevereiro e princípios de Março, tivemos uma concertação com o Conselho Municipal de Maputo, através da Direcção de Água e Saneamento e traçámos um plano de emergência para todo o distrito. Mas a nossa ideia como associação é incutirmos a prática da higiene na comunidade, de modo que ela saiba que pode, por si só, fazer esse trabalho.

@V: Vocês têm participado nos debates sobre o orçamento participativo do Município?

ZC: Participamos através do nosso representante.

@V: Como é que avaliam os debates?

ZC: São debates abertos e a comunidade é que decide o que quer. Para o caso deste ano os munícipes quiseram que se reabilitasse o Mercado 7 de Abril. Inicialmente, tinham escolhido que se abrisse valas para o escoamento da água da chuva, mas depois avaliou-se que o montante não era suficiente e tiveram de fazer outra escolha.

@V: Sobre questões do género, qual tem sido a vossa abordagem?

ZC: Nós levamos mensagens que ajudem a comunidade a valorizar, cada vez, mais a inclusão da mulher nas agendas do país. Começámos com formação profissional e o nosso trabalho é equilibrado. Procuramos incluir homens e mulheres nas nossas acções. E entendemos que as pessoas aos poucos vão acatando as nossas mensagens.

@V: Têm abordado questões do uso e comercialização das drogas? Se sim, de que forma?

ZC: Realizamos actividades culturais e desportivas para tentarmos manter os jovens ocupados e ao mesmo tempo conscientes dos perigos de consumirem drogas. Temos actividades culturais como a dança, a capoeira, o teatro e no desporto temos o futebol.

No ano passado, trabalhámos com a Escola Primária Completa Unidade 11, convidámos pais e encarregados de educação para partilharmos experiências e, num dos eventos, convidámos o Gabinete Central de Combate à Droga e o Ministério da Juventude e Desportos, mas nenhum representante destas instituições nos honrou com a sua presença.

Apesar disso, foi um debate interessante e produtivo. Estamos a pensar em replicar essas actividades nas outras escolas. Ao convidarmos o Gabinete Central de Combate à Droga pretendemos ter alguém que esteja dentro do assunto e que nos pudesse fornecer mais dados, mas não se fizeram presentes. Esperamos que das próximas vezes compareçam.

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