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Jessemusse Cacinda: Um artista multifacetado

Jessemusse Cacinda é a prova viva de que a socialização começa na família. Nasceu num lar cujos membros são cultores de manifestações artístico-culturais. Actualmente, trabalha na Rádio Moçambique e é finalista do curso de Filosofia, na Universidade Pedagógica. Na imensidão das artes, a sua paixão é pela literatura.

Nos últimos tempos, em Nampula, a vida associativa – sobretudo no campo artístico-cultural – está a tornar-se uma tradição para a juventude. Em parte, a relação Jessemusse Cacinda com a literatura pode ser explicada, não obstante o facto de a sua família ter sido o contexto em que se criaram os alicerces para o amor às actividades culturais.

Começou por actuar na banda da sua família, dirigida pelos seus tios, como baterista e percussionista. Isso ainda na infância. “A partir desta banda passei a gostar da música e mais tarde compus os meus temas. Com a ajuda da minha mãe aprendi a escrever poesia e a ganhar um interesse maior pela literatura”, começa por dizer. Para Jessemusse Cacinda a literatura é uma nova paixão.

Por isso, ele não abdica do seu trabalho no teatro e na música – sector em que assiste alguns cantores em matérias de composição. Ao mesmo tempo o artista preside a Associação Anamupuela (Os Pensadores) que é uma agremiação cultural que engloba actores nas disciplinas da literatura, do teatro, da fotografia, da pintura e da música.Na verdade, o amor de Jessemusse pela literatura destaca-se em 2008, altura em que frequentava a oitava classe.

Foi nessa época que escreveu o seu primeiro poema em que dizia que “Sou apenas uma criança”. O mesmo foi declamado no Dia Internacional da Criança. A sua performance na escola, ao declamar o texto, foi alvo de uma crítica favorável – o que o moveu a escrever continuamente.

“Gosto muito de praticar a literatura porque ela é a porta de entrada e saída para outras artes. Se uma pessoa tem a capacidade de escrever sobre uma determinada realidade, significa que pode ter a habilidade de fazer uma fotografia. Ou seja, a escolha de imagens depende da competência que a pessoa tem de narrar uma determinada realidade. Então a escrita cria pontes entre várias disciplinas artísticas”.

Comentando sobre a sobrevalorização que dá à literatura em detrimento da música, do teatro e da dança, Jessemusse pensa que “fazer a literatura é um privilégio na medida em que quando preciso de apresentar uma determinada peça teatral, tenho de, antes de mais, escrever para, mais adiante, fazer a encenação.

A preferência pela literatura não significa, necessariamente, a exclusão das outras artes. Trata-se de um trabalho de inclusão e envolvimento, porque ela abre este espaço para outros intervenientes”. Jessemusse lidera a Associação Anamupuela que neste ano, pela primeira vez, irá publicar uma antologia de poesia com a participação dos seus membros.

Refira-se que, a par da publicação da antologia, é aposta de Jessemusse – para ainda neste 2013 – publicar o seu primeiro livro. A obra está a ser editada na cidade de Maputo. “Palavras Musicalizadas” – como se intitula a colectânea – é um livro de poesia de temática aberta. “Tentamos trazer ritmos de palavras como uma forma de não limitar a abordagem a um tema específico”, explica.

Não há incentivo à literatura

De acordo com Jessemusse, não há incentivo à literatura no país. Ou seja, as possibilidades de um escritor novo publicar uma obra literária são muito reduzidas. O que acontece em Moçambique – no campo da literatura – é que existe uma geração que é muito privilegiada e outra ignorada. Muitas vezes, os escritores que não são considerados são os emergentes. Por isso, na interpretação do radialista, a área da literatura requer muita agressividade por parte dos novos actores. É que “há muitas barreiras”.

“O acesso ao apoio não tem sido fácil, por mais que o artista trabalhe de forma árdua. Os financiamentos são destinados às pessoas que já têm nome na área cultural. Ninguém se arisca a apoiar um novo talento – ainda que o reconheça. Isso é um problema contra o desenvolvimento do sector artístico nacional”, afirma.

Os livros de Jessemusse

Neste momento, Jessemusse possui dois livros que estão num processo de correcção. O primeiro é intitulado “O silêncio dos versos a uma poesia”. Na obra, o autor discute vários temas, focalizando-se na crítica social. O autor configura-se como uma voz da sociedade a fim de revelar o que (por iniciativa própria) pessoas singulares, dificilmente, o fariam. Por isso, “gosto muito de olhar para a sociedade numa dimensão mais crítica. Há muitas peripécias que nos acontecem, mas as pessoas interiorizam-nas e vivem num silêncio absoluto”.

O segundo livro é intitulado “Uma viagem ao fim do mundo”. Na explicação do autor, está- -se diante de um retorno aos nossos valores culturais. É que, com a globalização, a sociedade está num processo de negação dos seus valores culturais, adoptando outros considerados modernos. Para o escritor, “isso não é necessariamente negativo, o que está errado é a renúncia total dos valores cultural da terra de origem”.

Anamupuela

A Associação Anamupuela foi criada em 2008, quando um grupo de jovens organizou uma simulação de um concurso de literatura. O certame era de recital de poesia e leitura de contos e crónicas, e teve lugar no Museu Nacional de Etnologia, na cidade de Nampula. O encontro teve uma grande participação de jovens locais.

No final das apresentações, Clésio Fael, o organizador do evento, no lugar de premiar os participantes, apenas disse que não se tratava de um concurso, mas sim de uma iniciativa que tinha por objectivo associar os escritores da cidade de Nampula. Foi assim que os participantes, mormente os jovens, além de continuarem com a actividade, decidiram institucionalizá-la fundando a Associação Anamupuela, com estatutos próprios.

Desafios

Recorde-se de que a Anamupuela é uma agremiação que engloba jovens escritores da província de Nampula. Ela tem por objectivo fazer, promover e divulgar a literatura. No futuro, os agremiados querem transformar a instituição num centro artístico-cultural e científico de renome no país e no mundo. A publicação de obras literárias é a sua aposta actual.

De uma ou de outra forma, neste momento, “a grande luta é adquirir um espaço para a construção da sede da associação, incluindo o edifício onde funcionará um centro cultural que vai acolher eventos nacionais e internacionais”, explica Jessemusse. Cacinda lamenta o facto de a acção dos dirigentes culturais da província de Nampula, denotar um fraco domínio sobre a importância da gestão e preservação do património cultural.

“Eles estão sempre distantes dos artistas e não contribuem em nada para o desenvolvimento do sector artístico”. Aliás vezes há em que “os dirigentes são convidados a participar nos encontros com os fazedores da cultura e eles, simplesmente, ignoram o convite”.

Para o artista são atitudes destas que – quando manifestas por um dirigente do sector da cultura – não concorrem para o desenvolvimento do sector. “Se alguém está em Nampula a trabalhar nas instituições culturais só o faz porque tem um contrato nesse sentido. Muitos não sentem o pulsar do ramo”, critica o radialista.

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