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Idosa perde cinco filhos e é abandonada pela família por alegada feitiçaria

Francisca Khantheliua, natural do Posto Administrativo de Alua, no distrito de Eráti, província de Nampula, Norte de Moçambique, é uma idosa que há mais de 40 anos vive angustiada alegadamente porque na família é acusada de prática de feitiçaria e é considerada a responsável por certas mortes, algumas das quais ceifaram cincos filhos de uma só vez.

Ela diz que não se lembra da sua idade. Hoje vive na miséria mas conta – com tamanha melancolia – que por muito tempo experimentou uma vida opulenta quando o marido e os descendentes ainda estavam entre nós.

Segundo Khantheliua, o marido morreu assassinado durante a guerra civil que decorreu entre 1976 e 1992 e que opôs o Movimento de Resistência Nacional (RENAMO) ao Governo de Moçambique. Ele era considerado um homem rico uma vez que tinha um estabelecimento comercial que abastecia quase todos os mercados do distrito de Namapa-Eráti. “Mataram-no porque pretendiam roubar os seus bens”, afirmou a idosa.

Juntos tiveram seis filhos que depois da morte do pai conseguiram manter os negócios e a riqueza da família por muito tempo. Eles não eram afectados pelas bolsas de fome que assolavam a zona onde viviam.

Mas isso incomodava certas pessoas da comunidade. Por via disso, eram constantemente perseguidos por alguns residentes do Posto Administrativo de Alua, alegadamente por causa da sua riqueza. Numa dessas noites, o azar bateu à porta de Khantheliua quando foi acolhida, de surpresa, por uma notícia triste que dava conta de que cinco dos seus seis filhos haviam sido carbonizados numa residência na qual se encontravam a dormir.

“Para mim foi muito triste e até hoje guardo essa dor. Mataram os meus filhos, os únicos que conseguiam sustentar a nossa família. Daí que comecei a viver sozinha e desamparada. Passei necessidades porque não tinha ninguém para me ajudar. Nessa altura, o único filho que me restava estava na tropa a cumprir o Serviço Militar Obrigatório”, lembrou a velha Khantheliua.

Os seus parentes acusaram-na de ter recorrido à magia negra para matar os seus próprios filhos. “Apontaram-me como a culpada pela desgraça quando qualquer membro da família adoecesse ou perdesse a vida. A minha relação com as pessoas não era saudável”. Segundo ela, alguns procuravam emprego, depois de concluir os estudos, e, em caso de insucesso, responsabilizavam-na pelo facto.

Forçada a mudar para a cidade de Nampula

Khantheliua afirmou que depois de muito tempo a viver num clima de desentendimento e frequentes acusações, optou por se mudar para a cidade de Nampula, onde neste momento reside no bairro de Namicopo, na Unidade Comunal de Namiepe. Há relatos que dão que indicam que a sua mudança foi forçada pelo desamparo a que estava votada, humilhações e, sobretudo, por alguém ter ateado fogo na casa onde morava sozinha.

A sua neta, filha da única irmã materna, comprou um pedaço de terra e construiu uma casa de um quarto e sala, na qual vive com uma adolescente de 13 anos de idade, também natural do Posto Administrativo de Alua.

A rapariga chama-se Jacinta Afonso. É familiar e é órfã de pais. Abandonou a escola, onde frequentava a 5ª classe, para cuidar da sua avó que já está com a saúde debilitada.

A idosa queixa-se de dores nas pernas, facto que dificulta a sua locomoção. Para ir a casa de banho, por exemplo, apoia-se nas estacas que sustentam a sua casa e, às vezes, gatinha. Apesar dos cuidados da sua neta mais velha, ela continua a passar fome.

O acto de se alimentar não tem sido fácil. Entretanto, disse que não se pode queixar em demasia porque as pessoas vizinhas e as que frequentam uma mesquita nas proximidades da sua residência ajudam com alguma coisa sempre que podem.

“Não posso reclamar da minha neta porque sei que está casada e quem compra comida é o seu marido. O custo de vida também está a agravar-se”, referiu a nossa entrevistada. O seu filho, Samuel Muitha, mora no Posto Administrativo de Alua, onde construiu a sua residência quando regressou da tropa.

Não visita a mãe, nem quer saber dela. Abandonada, Khantheliua refere que se os outros cincos filhos que morreram carbonizados estivessem vivos, hoje teria um destino diferente.

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