As areias movediças da geopolítica -marcadas pelo rápido crescimento das grandes economias emergentes, como Brasil e China, enquanto os países tradicionalmente ricos ficam para trás- poderão minar o avanço para definir metas de desenvolvimento sustentável da conferência da ONU no Rio, no mês que vem.
Novas divisões entre velhos aliados estão a somar-se às disputas antigas sobre finança e responsabilidade, enquanto as conversações preparatórias em Nova York na semana passada não conseguiram chegar a um consenso, levando a ONU a acrescentar uma rodada adicional de negociações ainda este mês.
A cúpula Rio+20 no Brasil, de 20 a 22 de junho, deve atrair mais de 50 mil participantes de governos, empresas e grupos ambientalistas e de lobistas.
O evento tentará produzir metas de desenvolvimento sustentável na esfera das aspirações (e não mandatórias) para sete temas básicos -incluindo segurança alimentar, água e energia-, mas não buscará repetir o resultado da Cúpula da Terra no Rio, há 20 anos, que produziu o Protocolo de Kyoto para a limitação das emissões de gás-estufa e um tratado sobre biodiversidade.
Uma razão para a mudança de objetivos é a guinada na geopolítica global ocorrida na esteira da força crescente de países como Brasil, África do Sul, Índia e China – classificados como países em “desenvolvimento”, apesar do rápido crescimento, enquanto nações “desenvolvidas” como as da Europa, os EUA e o Japão enfrentam dificuldades com um crescimento mais lento.
“O mundo de 1992 não é o mesmo de 2012. Cada país agora terá de assumir a responsabilidade por garantir a sustentabilidade”, disse à Reuters o comissário europeu para o Ambiente, Janez Potocnik. “As negociações…estão preocupantes no atual estágio. O ritmo é relativamente lento e há uma certa falta de foco.”
A guinada na geopolítica fortaleceu alguns países em desenvolvimento e mudou a forma como os países abordam determinadas questões, disse Samantha Smith, líder de iniciativas sobre o clima global e energia para o grupo ambiental WWF. Criaram-se novas alianças entre os países e divisões recentes foram abertas, prejudicando o avanço em várias questões, especialmente no financiamento das metas de desenvolvimento.
“O que está a acontecer nas negociações reflete o que ocorre na geopolítica em geral”, afirmou Smith. Num sinal do desafio enfrentado pelas autoridades governamentais, a ONU acrescentou cinco dias a mais de negociações em Nova York, entre 29 de maio a 2 de junho, a fim de salvar um texto em negociação que teve o tamanho multiplicado, mas foi diluído, depois do fracasso da rodada de negociações da semana passada.
NOVA FORÇA
Embora as rixas tradicionais entre os países ricos e pobres persistam em questões como finanças, grupos estabelecidos de aliados estão a ramificar-se ou a separar-se como um reflexo de seu status de economia emergente.
O chamado G77 +China de países em desenvolvimento começou a se dividir em grupos ou em países individuais. O grupo que inclui Brasil, África do Sul, Índia e China (Basic) tem ganhado força e preparou um texto paralelo de negociação para ser circulado no mês que vem, afirmaram fontes
. A questão da arrecadação de fundos é um obstáculo importante, ecoando desacordos antigos em diferentes negociações da ONU para um pacto para a redução das emissões globais. Nessa arena, os países industrializados são acusados há muito tempo de não arrecadar dinheiro rápido o bastante para ajudar os países mais vulneráveis a se adaptar à mudança climática, e um fundo destinado a ajudar a captar 100 bilhões de dólares por ano para assistência ainda está sem nada.
Países tradicionalmente mais ricos, como os da União Europeia, os EUA e o Japão, têm enfrentado tempos económicos mais duros. Muitos países têm imposto medidas de austeridade aos seus cidadãos e cortado os gastos de forma drástica. Alguns países em desenvolvimento estão preocupados de que a crise económica forneça uma desculpa para as nações mais ricas se desvencilharem de antigos compromissos financeiros e evitem novos.
“Esperamos que a crise financeira, que atingiu tanto o mundo desenvolvido como o em desenvolvimento, não nos leve a termos uma visão estreita com relação ao resultado do Rio”, disse Marlene Moses, presidente do bloco de negociação da Aliança dos Pequenos Estados Insulares.