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Em Maputo os “shows” não agradam…

Em Maputo os “shows” não agradam...

Incrivelmente, há quem, por diversos motivos, diga: “se ainda tivéssemos os ‘campos de reeducação’, ou simplesmente os ‘laboratórios de criação do homem novo’, muitos dos nossos filhos estariam na linha”. As meninas não andariam seminuas pelas ruas e os rapazes não nos mostrariam as suas cuecas. Pós é. De qualquer modo, é lamentável que, mesmo conscientes da irresponsabilidade, os produtores de espetáculos em Maputo e não só, continuem ignorantes em relação à boa qualidade de “shows”. No último fim-de-semana vivenciou-se o mesmo drama de sempre: a má qualidade do som marcou o espectáculo de Cremildo de Caifaz.

Na verdade, nos dias que correm, parece-me comum que a equipa de produção se preocupe com os (pen)últimos detalhes no dia dos espectáculos. O tempo que separa o anterior concerto musical (isto na cidade de Maputo, do nosso conhecimento e de grande calibre), 21 de Novembro, com o realizado na sexta-feira, 05 de Dezembro, é longo e, sobretudo, suficiente para escolher um palco sofisticado, e, sem sobressaltos, montar e testar a aparelhagem de som.

Se não tivéssemos um pouco de consciência de que íamos ver um dos, poucos, ícones da música ligeira moçambicana, que deixou o país há sensivelmente 15 anos, talvez, ficaríamos no desespero, ou atordoados com os efeitos das luzes que iluminavam a urbe e, consequentemente, não saberíamos o que mereceria ser reportado. Não seria necessariamente um acto de exclusão, mas devido à escassez de repórteres, principalmente os que se dedicam a área cultural, tínhamos, de facto, que escolher o melhor.

O problema é que no mesmo dia, na mesma circunscrição – zona baixa da cidade das acácias – e na mesma hora haviam agendado cerca de quatro espectáculos – isso sem contar com que os que aconteceram nas “casas de pasto”, como Mafalala Libre, Gil Vicente Café Bar, entre outros. Mas, ao que tudo indica – porque não seria o contrário do sucedido no último fim-de-semana e nas várias outras ocasiões passadas –, programar eventos similares no mesmo período e, quase, no mesmo local é uma doutrina, um costume, neste país. Por isso, mas acima de tudo pela maior afluência do público nos eventos, diga-se, mais badalados e/ou de artistas famosos (aqui usamos a fama como vulgaridade) – não obstante, a preferência de outros músicos – o auditório ficou às moscas.

Embora seja o inverso, os eventos artístico-culturais não podem ser confundidos com negócios, com momentos isolados…, que se bastem em sim mesmos, em jeito de competitividade. Muito menos podem ser reduzidos a mero entretenimento restrito a pessoas eruditas, que, de qualquer forma, apreciam todos os estilos. Evidentemente, o evento artístico, como concretização de um processo que visa garantir a aculturação, os momentos de lazer e os intercâmbios artistas-público tem um papel importante. Por essa razão há que se gerir, no sentido de se organizar em períodos diferentes para que os admiradores possam ter a oportunidade de fazer parte de, quase, todos os momentos.

… e o público é o mesmo

Diferentemente do que tem acontecido na cidade de Maputo, no que concerne a atrasos no início dos eventos culturais, o “show” de Caifaz foi um sucesso. Marcado para iniciar às 21 horas, o que estranhamente aconteceu, o que mais nos marcou no espectáculo foi a ausência de público.

Para quem, eventualmente, tenha participado numa cerimónia restrita já deve estar a imaginar do que estamos a falar. O ambiente amplo de Gil Vicente parecia, sim, um daqueles momentos de “xiquites” familiares, em que todos os presentes se conhecem, ou senão, tem-se a certeza de que todos fazem parte da parentela. No caso concreto, a sala já velha do Gil estava repleta de pessoas ligadas, de forma directa, às artes e cultura no país.

Diga-se, em abono a verdade, que cada evento cultural tem o seu público alvo. Portanto, o que se pôde perceber no evento de Cremildo de Caifaz é que as pessoas que para lá se dirigiram conhecem o seu percurso como músico e não só, a sua temática, os seus gostos, as suas exigências e, se calhar, as suas limitações. Por isso, para quem esteve no lugar do “show”, ou acompanha a sua carreira muito em particular, tê-lo de volta aos palcos foi uma experiência marcante.

As actuações

O concerto teve como convidado o músico Miguel Xabindza, que fez a abertura com alguns dos seus temas que versam sobre a quotidianidade dos moçambicanos. Realmente, Xambidza é um músico que merece a nossa estima. A sua criatividade, a presença no palco e a simplicidade com a qual encara o público espanta, de tal forma que alegra a plateia.

Embora a sua actuação não se resuma somente neste período, o momento mais excitante do espectáculo foi marcado pela divulgação de uma recriação da música de José Barata, intitulado “Xisiwana”, ou simplesmente “Pobre”. Cantando ou tocando, ao lado de Zito (bateria), Nicolau (teclado) e Nené (viola), numa das suas composições, Miguel fala das nossas irmãs, filhas, mães, esposas, …. que se prostituem por causa de bens materiais.

No entanto, volvidos alguns instantes na companhia deste jovem músico e depois de um longo e desesperador intervalo, finalmente, entrou a figura do cartaz que brindou os presentes com uma excelente actuação, interpretando temas inspirados na Marrabenta, mas enriquecidos com sons populares de diversas partes do mundo, tais como o Pop, o Afro e o Jazz.

O mote do concerto era a apresentação do “Ciconia Ciconia” (cegonha em latim), um álbum que conta com a participação de músicos de renome, entre moçambicanos, africanos e europeus e que tem cativado uma apreciação positiva, não só da parte do público moçambicano, mas também além-fronteiras.

Infelizmente, após a segunda apresentação do músico, já por volta das 22:30 minutos, por causa das nossas dificuldades no que se concerne ao transporte da nossa equipa, tivemos de abandonar o espaço, antes mesmo de analisarmos algumas músicas do artista.

Mas o importante fica: falar de Cremildo de Caifaz é o mesmo que narrar a história de um jovem nascido em Inhambane, apaixonado pela música e que, aos 18 anos de idade, rumou para a Alemanha a fim de concretizar os seus sonhos estudando a música.

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