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Eles descobriram a cor das sinfonias…

Eles descobriram a cor das sinfonias...

Na mostra de artes visuais Sinfonia de Cores, além de glorificarem as cores e as sonoridades, exaltando os valores da liberdade, fraternidade e solidariedade, os conceituados artistas plásticos europeus, Sérgio Luzzi e Branislava Stojanovic, rechaçam as crises políticas e sócio-económicas que, presentemente, se abatem sobre o mundo. Contemplar as obras pode ser um autêntico exercício de cidadania…

Dois artistas plásticos de origem europeia, um italiano, Sérgio Luzzi e uma sérvia, Branislava Stojanovic, com experiências artísticas comuns encontram-se em Maputo. Se em relação à artista plástica Brana sabe-se que vive no país há cerca de quatro anos, o mesmo já não se pode a firmar acerca de Sérgio Luzzi.

O que é facto é que as ocorrências sociais e políticas que, estando em Maputo, captam sobre a cidade, o país, o continente africano e o mundo, inspiraram-nos a criar arte. Senão como é que se explicaria a mostra Sinfonias de Cores, patente no Centro Cultural Franco-Moçambicano?

Em certo sentido, em relação à pintora Brana, pode-se a firmar que a mostra Sinfonias de Cores é o prolongamento (ou continuidade) da exposição colectiva Pontos de Vista que realizou, no ano passado, na companhia de artistas moçambicanos como, por exemplo, Mauro Pinto e Gonçalo Mabunda em que, através de diferentes expressões de artes visuais entre as quais a cerâmica, a pintura, a fotogra a e a escultura procuraram projectar o seu ponto de vista em relação ao tema da paz em relação à guerra.

Amante da liberdade

Para o autor destas linhas, a afirmação segundo a qual os criadores da mostra Sinfonias de Cores exaltam os valores da cultura e da tradição africana pode ser verdade, mas também parece ser verdadeiro o debate que os mesmos artistas desencadeiam em relação às discussões políticas e democráticas que animam a opinião pública na Europa, sobretudo em países como França em que, há uma semana, o ex-Presidente Nicolas Sarkozy e o seu rival François Hollande disputavam a presidência do país.

O mesmo debate político acontece em relação à Espanha e Grécia. Foi, inclusive, no mesmo contexto sociopolítico que Sérgio Luzzi criou as obras Controverso, Discussão, Falsa Democracia e Revolução Francesa. Cada uma com uma história peculiar que vale a pena interpretar.

Relativamente à obra Controverso desenvolve-se uma acérrima discussão, porém improdutiva ou pouco produtiva pelo facto de as partes – entendidas como os cidadãos, a sociedade em geral – não se confrontarem. É a isso que o pintor chama Falsa Democracia.

Em tal debate, cujo objecto pode ser político ou social, quando se projectam os temas para o espaço social – onde atingem a massa, as multidões e por fim os públicos – originam uma falsa democracia, como o artista sugere, pelo facto de todos os cidadãos participantes no processo terem a possibilidade de se expressar, no entanto, muitas vezes não fazem.

Comentando sobre as três obras, Discussão, Controverso e Falsa Democracia, Sérgio Luzzi considera que “nós, os italianos já estamos na fase de Discussão, mas vivemos uma Falsa Democracia”.

De qualquer modo, é preciso perceber que “sou um amante assumido da liberdade e defensor dos ideais da liberdade de expressão de ideias e do pensamento, de tal sorte que não me sinto bem sempre que eles são colocados em causa. Penso que devemos lutar continuamente pela defesa destes direitos sob pena de perdê-los”, comenta Sérgio Luzzi.

Diante dos quadros da sua colega Brana, as obras deste autor são facilmente identi ficáveis devido à forma e ao tipo de cores (extremamente) vivas e puras – como o amarelo e o vermelho – picantes que resultam da aplicação de outra coloração apagada.

Em Sinfonia de Cores os motivos de musicalidade universal que o artista aborda permitem que os apreciadores da sua arte possam identifi car-se com a mesma com alguma facilidade, uma vez que as máscaras faciais dos seres humanos por si criadas não têm uma identidade nacional e/ou racial claramente de finidos.

Uma afro-centrista

Em relação à artista plástica Branislava Stojanovic nada mais nos resta além de assumir que, de finitivamente, além das demais qualidades pictóricas, a sua arte tem o mérito de evitar o esteticídeo – ou seja, matar outras estéticas.

É que os suportes sobre os quais ela trabalha – em nome da valorização da cultura e da tradição africana, com base em signos como a capulana – também possuem uma arte que, muitas vezes, é ampliada pela sua acção artística consciente.

Convenhamos, há tecidos cujo valor de aquisição não somente varia em função da qualidade material, como também devido ao trabalho iconográ fico dos produtores. Aliás, na hora da escolha, as mensagens que o produtor crava no tecido in fluenciam em certo grau as opções do comprador. Isso pode ser um factor psicológico, mas é factual.

De uma ou de outra maneira, a inspiração de Brana (também) encontra-se nesse campo. A capacidade que a artista possui para captar do/no espaço social situações como o elevado custo de vida, o desenvolvimento desequilibrado, por exemplo, existente entre o local da origem da matéria-prima, dos bens, dos recursos e seus factores de produção com o local do consumo final, como acontece em Moçambique, é um valor acrescido na sua pintura.

Talvez seja a isso que se refere quando afi rma que fala sobre o País da Marrabenta. Essa realidade faz como que, a dado momento, os cidadãos tenha que reconhecer que Perdi a Cabeça, como a artista sugere na obra com o mesmo título.

Em Tempos Livres, a outra obra de Brana, duas mulheres de raça negra e branca possuem cabeças ocas e trabalham com um amontoado de linhas – com formato de cérebro humano – para produzir crochés.

Para o autor deste artigo, a obra é uma metáfora que pode signicar que os instrumentos que o Homem constrói e/ou que utiliza para construir ou realizar qualquer actividade são uma extensão da sua capacidade mental. Para ser preciso, do seu cérebro.

Trata-se, inclusive, de uma interpretação corroborada pela autora da obra, ao mesmo tempo que acrescenta que o quadro demonstra, igualmente, a forma como utilizamos a referida capacidade criativa. “Infelizmente algumas pessoas preguiçosas exploram-na mal e muito pouco”, considera.

Mais adiante, a artista “desvendou” um outro “mistério” em relação a uma filoso fia determinista, racista e eurocentrista segundo a qual as pessoas de raça branca são mais criativas e inventivas. Para o efeito colocou o ser humano, de ambas as raças, negra e branca, a desenvolver a mesma actividade e, levou assim a sua posição ao extremo:

“Está-se diante de uma acusação infundada que deriva de uma construção social europeia. O que sucede é que os povos têm culturas e mentalidades diferentes que devem ser entendidas, respeitadas para que se possa viver em harmonia”, diz.

Temores do artista

Sérgio Luzzi defende que se sente desconfortado – sempre que cria uma obra e ela não é percebida de acordo com a sua visão.

Trata-se de uma sensação transitória. Afi nal, ainda que as pessoas tenham a liberdade de não partilharem da sua visão, compreendem-no sempre que lhes explica a intenção com que criou a obra, assim como a mensagem que transmite ou que pretende transmitir.

Por sua vez, Brana considera que teme que o seu grau de subjectividade artística lhe instigue a fazer obras que inf uenciem de forma negativa a sociedade. Ou seja, “não gostaria que as minhas frustrações me induzissem a ser egocêntrica”.

En fim, apesar de tanta beleza contemplada na tela, é preciso convir que a arte não somente representa a estética e o encantamento, mas (também) é uma forma de expressar e reivindicar os valores universais da liberdade, fraternidade, solidariedade, justiça social e igualdade. Ou seja, “uma representação social que retrata os problemas profundos da existência humana”.

En fim, nas mais de 40 obras expostas em Sinfonia de Cores empregam- se duas técnicas essenciais: as mistas sobre capulana e acrílico sobre tela. Elas podem ser contempladas até amanhã, 12 de Maio, no Centro Cultural Franco-Moçambicano e contam com o apoio da Embaixada Italiana em Maputo.

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