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Coração está agastado com a indiferença do patrocinador!

Coração está agastado com a indiferença do patrocinador!

Os membros do Grupo Teatral Coração, que desenvolvem o seu trabalho no bairro de Laulane, algures em Maputo, estão agastados com a indiferença dos agentes que financiam a produção artística no país. Sem espaço para exporem as suas obras, os actores sentem-se excluídos do cenário das artes urbanas. Conheça, a seguir, a sua história.

Na cidade de Maputo, concretamente no bairro de Laulane, encontrámos o Grupo Teatral Coração, cujos membros, além de estarem a enfrentar barreiras relacionadas com a falta de patrocínio e espaço para a exibição do seu trabalho, lutam contra a exclusão social de que se sentem vítimas. “Abandonados” pela mesma sociedade que os criou, estes artistas imploram por mais atenção.

O abandono por parte de quem mais se precisa, nos dias actuais, é uma prática comum na nossa sociedade. Há, por exemplo, casos – diga-se, penosos – em que muitos anciãos são desamparados pelos seus filhos e expulsos das suas próprias casas, alegadamente por serem feiticeiros. Outros, com enfoque para as vítimas da orfandade, são maltratados pelos seus próximos, pura e simplesmente, para se apoderarem dos bens dos falecidos.

Estes assuntos são uma parte dos vários discutidos nas obras do Grupo Teatral Coração, no curso da sua história. Este grupo de jovens quer – através das artes cénicas – resgatar os jovens perdidos, contribuindo para a sua socialização. Com mais de uma década de existência, o Coração é mais do que um agrupamento de teatro cómico.

Fundado em 1998, por Pedro Dique, com o propósito de ocupar e cultivar a arte nos jovens do seu bairro, muitos dos quais começavam a consumir vários tipos de droga, enveredando pelos ínvios caminhos da prostituição, este grupo constitui, agora, a materialização do sonho do seu fundador. Um sonho, aliás, à beira de ser combatido pela falta de apoio dos mecenas.

Presentemente, a colectividade é constituída por nove jovens, com os quais Pedro rema contra a maré para imortalizar o desiderato de ver a sociedade livre dos problemas relacionados com a violência doméstica, o consumo de estupefacientes por parte de adolescentes e jovens, a discriminação das etnias e muitos outros problemas que prevalecem. Localizados e actuando num bairro onde a dança é a forma de arte mais popularizada, há menos espaços para expor arte, o Coração procura adaptar-se mantendo os seus ideais firmes, apesar das dificuldades que enfrenta, incluindo os infligidos pela indiferença de quem devia fazer algo pelo artista.

Nos seus temas, o Grupo Teatral Coração incentiva os jovens a batalhar para alcançar os seus objectivos, desaconselhando o namoro entre pessoas de gerações diferentes quando movido, sobretudo, pelo materialismo financeiro. A colectividade em referência faz uma crítica desfavorável ao consumo excessivo dos produtos da Internet muito em particular as redes sociais, na medida em que facilitam práticas como o tráfico humano.

O grupo também narra as peripécias experimentadas pelos enteados, com enfoque para os maus-tratos, porque, infelizmente, apesar de serem desaconselhados pela Lei da Violência Doméstica Contra a Mulher e a Criança, ainda prevalecem. “Levamos ao palco histórias sobre as famílias moçambicanas. Há crianças, por exemplo, que continuam a ser desgraçadas pelas madrastas, alegando infracções corriqueiras por elas cometidas”.

Espaços alternativos

Diante das adversidades que enfrentam, estes artistas agem exactamente como se estivessem a colocar em prática as palavras do refrão de uma música angolana: “O sofrimento na cidade aumentou a criatividade”. Sem espaço adequado, os actores ensaiam na sala de estar da residência de um dos membros. E não lhes faltam argumentos: “Quando a arte te consome não há como abandoná-la”. Por essa razão, o Coração, um grupo teatral que, desde a sua criação em 1998, luta sem êxito, desenvolveu capacidades para trabalhar e exibir a sua obra no local onde é gerado – a casa: “Afinal, se não há espaços dignos, usam-se os alternativos”.

Sempre que for necessário realizar ensaios, os membros do Grupo Teatral Coração encontram-se na casa de um dos membros. A condição básica, para o bom curso da actividade, é remover os móveis do interior da casa. De seguida, depois do trabalho, volta-se a organizá-la a fim de deixá-la como se encontrava. “Por falta de espaços próprios para podermos trabalhar, todos os dias fazemos a mesma coisa: falamos com os encarregados de educação dos membros para nos concederem a sua casa para o efeito”.

“O processo é muito longo e complicado porque, muitas das vezes, há encarregados incompreensíveis e, consequentemente, não apoiam os seus filhos a fim de que se dediquem ao teatro ‘neste país em que é difícil viver de actividades artísticas’”, afirma Pedro, acrescentando que nenhum pai quer que o seu filho seja pobre. Na verdade, essa realidade não é só vivida pelos membros do Coração. Sérgio Mabombo e Dias Santana, os fundadores da Lareira Companhia de Artes, são os actores mais representativos – e únicos – que, trabalhando num contexto similar narrado, conseguiram impor-se no mercado e expor as suas obras além-fronteiras. Eles ensaiavam na rua.

As incompreensões sociais

Uma perseguição constante é o que caracteriza o clima entre os artistas e a sociedade moçambicana. Essa situação, que gera incompreensão, é originada pela crença – sobretudo nas zonas suburbanas e rurais – de que o artista é detentor de dinheiro.

“A sociedade não acredita que somos muito dependentes da boa vontade do patrocinador que, por sinal, sempre estando a falhar, ainda não aceita que os artistas também sofrem como todas as pessoas”, disse Pedro acrescentando que a comunidade só participa na vitória do artista e nunca no seu crescimento, que inclui batalhas.

 

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