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As “Memórias” de Chico António

As “Memórias” de Chico António

Embora já se tenha tornado tradição que, após décadas de trabalho árduo, os artistas, ou pessoas singulares, façam uma retrospectiva à volta dos seus trabalhos, as “Memórias” de Chico António chamam a nossa atenção em relação ao historial do criador e do povo moçambicano. As recordações, a serem desvendadas a partir de um disco, foram enraizadas a partir da década de 1984, altura em que o cantor grava a sua primeira música.

Aos laurentinos mais velhos, principalmente os da década de 1984, a figura de Chico António traz-lhes, para além do talento conquistado e aperfeiçoado na então Missão José de Lhanguene, o sofrimento a que foi sujeito, por volta de 1964, quando vivia na rua. Por essa razão, hoje, Chico é visto como exemplo de superação na classe artístico-musical e na sociedade moçambicana.

De certa forma, não é sobre a sua vida privada que queremos aqui explanar mas importa-nos realçar que, de tudo o que existe, memórias – boas ou más – é o que Chico tem demais, de tal sorte que, na música para marcar os momentos, “mesmo face às dificuldades encontradas, tivemos que aprender a trabalhar sem financiamento e sem condições necessárias para produzir”.

A obra composta por 14 faixas de músicas produzidas no intervalo de 1984 e 2014 revela-nos o grau de crescimento e de maturidade que se verificou ao longo dos anos. Aliás, em “Memórias” faz-se o balanço da sua carreira e explora-se o que há de melhor na sua colectânea de ritmos.

De todos os modos, há muitos aspectos marcantes nas “Memórias” do artista, que, de uma ou de outra forma, nos fazem recuar no tempo. Trata-se, na verdade, do período pós-independência em que os moçambicanos procuravam reintegrar-se na sociedade e adoptar novos modelos de vida.

As suas músicas, o seu veículo de comunicação, têm uma grandeza cultural excelente. E em virtude disso, o artista consegue encantar e surpreender o público ao explorar os diversos tipos de instrumentos de som que abarcam o estilo tradicional moçambicano. Por outro lado, os seus ritmos dão, a qualquer ouvinte, uma sensação nostálgica.

Na música “Mercandonga”, por exemplo, Chico fala dos vendedores espalhados pelos (nossos) mercados que de tudo fazem para escoar os seus produtos, mas, muitas das vezes, senão sempre, extorquindo os cidadãos. Nessa melodia, cantada em português e interpretada, algumas vezes, em changana, o artista explora o que há de exótico nas feiras, quando o cidadão pacato procura alimentos.

Tal como sucede nas outras músicas, em que Chico exterioriza as suas emoções, em “Baila Maria”, uma melodia que conta com a participação de Mingas, o artista não só se limita no querer, como também, em changana, diz: “guarde o seu coração e tudo se resolverá”. Tanto que “baila Maria (…) a alegria é a coisa mais linda na vida”.

A conversa mantida com o artista possibilitou-nos afirmar que a sua maior empolgação na arena musical é, além de compor mais de uma dúzia de álbuns em cinco anos, fornecer à sociedade músicas a nível das exigências e com mensagens educativas.

“O trabalho que irei lançar, no dia 24 de Outubro, é uma selecção de músicas que marcaram diversas gerações. São, na verdade, ritmos que quero deixar como herança para a sociedade moçambicana que me acompanhou, durante os 30 anos de carreira. Porém, tal como disse, não há nada de novo no CD, porque “o lançamento desde disco é feito à pedido dos meus admiradores. Sempre me foi exigido um trabalho discográfico, talvez porque sentem a necessidade de coleccionarem a minha obra nas suas discotecas”.

De todos os modos, há gente para quem ouvir falar de Chico António é novidade, da mesma forma que existem alguns que com a publicação de “Memórias”, mais lembranças se rejuvenescerão e mais laços se estreitarão entre o fã e o artista, pois trata-se de uma obra que sai depois de, em 1990, ter lançado “A Moya”, com o grupo RM.

Segundo conta o dono de “Memórias”, o trabalho levou muito tempo na produção devido a diversos problemas que existem no seio artístico. No entanto, “para além da marginalização a que os artistas são sujeitos, a falta de apoios para a produção de discos compactos tem sido um dos embaraços para a afirmação de qualquer músico que dependa da arte”.

Indignado em relação ao estágio actual das artes em Moçambique, que se verifica na venda ilícita de produtos artísticos sem impedimentos, Chico receia que o seu trabalho seja vítima dos “piratas”. “É bastante desmoralizador um músico que investir toda a sua vida num trabalho e no fim ver o seu produto ser vendido na esquina a um preço aquém do justo, sem contar que o valor da venda destas obras é revertida a favor do músico, por isso muitos de nós, músicos, morremos pobres e frustrados”.

Um “show” memorável

Depois de longos anos a trabalhar na composição de vários trabalhos, o músico moçambicano Chico António lança, no próximo da 24 de Outubro corrente, a partir das 20 horas, no Centro Cultural Franco-Moçambicano (CCFM), em Maputo, o seu primeiro disco intitulado “Memórias”.

De acordo com o artista, para além de lançar o seu álbum de estreia, pretende-se com o “show” que se proporcione um momento especial aos seus admiradores, para que acompanhem, ao vivo, o que vem fazendo desde o ano de 1984, um trabalho que inclui uma exposição retrospectiva da sua carreira, a ser exibida na galeria exterior do CCFM.

De referir que o espetáculo contará com actuações de cerca de 40 artistas, a destacar a presença de Chude Mondlane, Mingas e do Grupo Majescoral.

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