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Toma que te dou: Aires Aly treme como um delinquente primário*

Liguei várias vezes através do meu telefone celular para o número do primeiro-ministro Aly e ele ignorou-me. Voltei a chamar, nada! Inisisti, também nada! Roguei pragas para o homem nascido em Majune, no Niassa. Cheguei mesmo a dizer, de mim para mim, que Aires Aly não sabe fazer mais nada senão tocar thchakari e dançar utsi. Mas eu queria entrevistar este personagem que me parecia simpático.

Conheci-o quando era governador de Inhambane, e sempre me deixou a impressão de ser alguém com quem se podesse contar. Qual! Aires Aly em Inhambane vestia a pele de um cordeirinho, porque na verdade estamos em presença de um cínico, muito embora mantenha o seu forte sentido de humor.

Aliás, os déspostas também têm sentido de humor. Os incompetentes também. E eu quero entrevistar o primeiro-ministro, que neste caso é o senhor Aires Aly, e ele não atende às minhas chamadas, mesmo reconhecendo o meu número. Até porque pode ser exactamente por reconhecer o meu número que ele me manda à fava.

Mas eu não sou persona de desistências. E não sou como Paulo de Carvalho que nos vai dizer que já é hora de embalar a trocha e zarpar. Eu não embalo a trocha para fugir, ou para abdicar dos meus desafios. Eu não atiro a toalha ao chão, nem perante uma figura política da dimensão de Aires Aly. Sou um bizonte e o primeiro-ministro está a ser um obstáculo para as minhas investidas.

Eu quero entrevistá-lo. Quero confrontar dados com ele, com muito respeito, seguindo as regras que regem a minha profissão. E o homem está a dificultar o meu trabalho, e não me adimira quando ele vem a terreiro dizer que existe liberdade de imprensa em Moçambique. Qual liberdade qual carapuça!

Acordei muito cedo nesse dia, lixado com Aires Aly. Apanhei o chapa e fui ao seu sumptuoso gabinete, instalado num edifício que parece uma fortaleza.

Cheguei às 7.30 horas e fiquei à espera na sala da sua secretária, depois de me ter identificado com um nome falso, porque se tivesse dito o meu nome real, o primeiro-ministro era capaz de não ir trabalhar, até me ir embora.

Disse que eu era o Dolar Brand, que era amigo de Aires Aly e queria cumprimeinta-lo apenas. E a secrertária pegou no telefone e ligou para o boss.

Ele está a chegar, aceita um café? A secretária falava num português com sotaque nyandja, que é a língua de Aires Aly e percebi tudo, o nepotismo neste país é o modus agendi de muitos dos dirigentes que ocupam cargos de elevada importância.

– Aceito o café sim, senhora.

– Com muito ou pouco açúcar?

– Com muito açucar, de preferência com cheirinho.

A secretária de Aires Aly desenhou um sorriso que deve fazer derreter a estrutura do primeiro-ministro todos os dias. Mas a mim essas coisas não me alteram, não é qualquer mulher que me tira do lugar, sobretudo quando estou com a alma ferida.

Meia hora depois apareceu Aires Aly, entrou jovial, disposto a cumprimentar Dólar Brand, só que no lugar de dólar Brand estava Alexandre Chaúque, eu mesmo, em mim, em pessoa, com uma chávena de café na mão esquerda, e a direita livre para saudar o nyanndja de Majune.

Quando apertei a mão de Aires Aly, senti-a trémula. O sorriso desapareceu num ápice e teve que fazer um grande esforço para me enfrentar. A secretária apercebeu-se do nervosismo que se apossou-se do seu chefe.

O primeiro–ministro quis largar a minha mão e eu apertei a dele com mais energia, gozando com ele, olhando para os seus olhos que baixavam como um delinquente maroto, que acabava de ser apanhado a roubar batata doce em Majune.

Tive pena dele. Saí do gabinete da secretária e procurei a primeira barraca para festejar com uma bebedeira sem fim, o embaraço que causei a um primeiro-ministro inteiro.

*Texto fictício

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