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A tragédia do voo TM 470

A tragédia do voo TM 470

A pose de Laisa (oito anos de idade) e Yumalai (quatro anos de idade), numa foto feita na sexta-feira (29), no Aeroporto Internacional de Mavalane, minutos antes de embarcarem com o irmão Carlinhos (quase dois anos de idade) e a mãe Jeinia Sambo (uma jovem na casa dos 30 anos), perspectivava umas férias inesquecíveis na casa da tia em Luanda. Mas o voo TM 470, das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), não chegou a Angola, despenhando-se na Namíbia.

O voo estava dentro do atraso “normal” – com razão os moçambicanos apelidam a sua companhia aérea de Late And Maybe –, deveria ter partido às 11 horas, mas no novíssimo aeroporto da capital moçambicana o tempo correu depressa e às 11h26 o Embraer 190 estava no ar.

Fazia bom tempo e o início da primeira viagem de avião destes três irmãos, Laisa tinha concluído a 5ª classe, não podia ser melhor. Mas algo aconteceu sensivelmente 2 horas e 4 minutos depois de o avião, fabricado em 2012 no Brasil, ter levantado voo, quando sobrevoava o norte do Botswana. O jovem Carlos Reis é um homem destroçado. Se porventura se pode considerar afortunado, pois devido a compromissos profissionais não embarcou para Luanda, não há conforto para a dor de um homem que perdeu a mulher e os três filhos.

Em contacto com @Verdade, o irmão do viúvo relatou-nos que soube pela televisão que o voo TM 470 não havia chegado ao destino e foi ao aeroporto procurar esclarecimentos: “Corri para o aeroporto para saber o que estava a acontecer e as LAM ainda não tinham uma informação precisa, dizia que teve uma aterragem de emergência e que devíamos aguardar porque eles estavam a fazer as buscas. Entretanto, no dia seguinte, fomos para lá e também ainda não tinham uma informação precisa no período da manhã. Ficámos à espera até ao período da tarde quando as LAM nos solicitou por telefone para nos dar a informação precisa de que não havia sobreviventes.”

Entre as vítimas identificadas está uma jovem moçambicana, Nádia Mulchande, que vivia em Angola e fazia a viagem regularmente para visitar parentes, particularmente a sua mãe. Uma outra jovem, Saquina Cassamo, animadora de programas numa rádio privada em Maputo, também perdeu a vida neste acidente. Dulce Chimene, de 42 anos de idade, é outra das vítimas moçambicanas deste trágico acidente.

Segundo o jornal Notícias, Dulce, ou Ducha como era chamada por seus familiares mais chegados, vivia em Angola e não vinha ao país há três anos. Tinha estado em Maputo para rever a mãe, irmãos e seu único filho de 20 anos de idade, Márcio de Sousa, e renovar o seu visto de estadia em Angola, cuja validade acabava de expirar. Segundo conta Paulo Chimene, irmão da malograda, o que a finada pretendia era também conseguir um visto definitivo de estadia em Angola, uma vez que tem residência e trabalhava naquele país, faz dois anos. A sua permanência durou pouco mais de um mês e meio, período em que pretendia igualmente se inteirar dos estudos de Márcio, que devia ingressar no ensino superior.

“Temos mais uma irmã mais velha que vive em Angola, com quem deveriam regressar no dia 13 de Novembro, mas ela adiou porque não havia terminado de fazer o que lhe trazia à capital e remarcou o seu regresso para aquela trágica sexta-feira”, lamentou Paulo Chimene. O seu regresso a Luanda seria por pouco tempo, pois ela pretendia regressar a Maputo, para passar as festas de Natal e fim de ano junto à família. Segundo os mesmos relatos, a finada despediu-se com a promessa de que as festas seriam celebradas num ambiente familiar e alegre. Os outros passageiros moçambicanos, ainda não oficialmente identificados, são: Aurélio Chemane, Reichete Honwana e Glória Malambele.

Vítimas estrangeiras

Na sexta-feira (29) não foram só moçambicanos que pereceram. Nove cidadãos angolanos estavam entre os passageiros do voo TM 470. Foi possível identificar o jovem Action Nigga (músico), e um outro identificado pelo seu nome de trabalho, nomeadamente DJ Maskarado. Encontravam- se também no voo fatídico, segundo o Jornal de Angola, Manuel João Landa, Domingas Freire dos Santos e Almejada Laura Vatuva, inspectores do Ministério das Finanças de Angola, que regressavam de Maputo, aonde participaram na conferência anual das Inspecções Gerais da CPLP.

Cidadãos de outras quatro nacionalidades também morreram carbonizados na queda a pique do avião Embraer 190 das LAM. O empresário português José Carlos Soares foi um dos seis portugueses a bordo, assim como José Carlos, que deixa um filho de 14 anos, e era responsável por dois gabinetes da ZAP, distribuidora de TV por satélite em Angola e Moçambique.

Outros cinco empresários perderam a vida, designadamente António Soares Nunes, António Silva Nunes, Luís Fernandes, Bernardo Soares e Sérgio Soveral, este último com nacionalidade luso-brasileira. António Soares Nunes, de 65 anos deidade, trabalhava em Angola na empresa Gruest. Luís Fernandes, do Porto, estava em Maputo há dois anos. As viagens a Portugal eram frequentes. Sérgio Soveral era administrador da Joluso, em Rio Maior. Já Bernardo Pedra Soares era presidente da MSC Angola, empresa de transportes internacionais. Ainda por identificar entre as vítimas estão um cidadão de nacionalidade francesa e outro de nacionalidade chinesa.

Tripulação experiente

É prematuro avançar as causas deste trágico acidente – o primeiro em que uma aeronave das LAM se despenha e os ocupantes morrem em 33 anos de operações nacionais e internacionais –, mas embora fizesse mau tempo na altura do despenhamento o piloto, o comandante Hermínio dos Santos Fernandes, conhecia a rota e parte das suas 9.053 horas de voo havia realizado nos voos semanais que a companhia aérea moçambicana leva a cabo para Luanda desde os finais de 2009. Hermínio dos Santos Fernandes, que deixa viúva e dois filhos, havia feito 1.395 horas como comandante de aeronaves e era instrutor de voo.

O voo TM 470 desapareceu dos radares às 13h30 de sexta- feira (29), numa altura em que voava a uma altitude de 36.000 pés. Há informações segundo as quais na altura em que desapareceu dos radares da torre de controle do Botswana caía a 5 mil pés por minuto. Os destroços do avião só viriam a ser localizado na manhã de sábado, apesar do alerta ter sido dado às 14 horas de sexta-feira. Segundo as autoridades de tráfego aéreo da Namíbia, citadas pelos jornal The Namibian, a demora deveu- -se à falta de informação por parte das autoridades do Botswana que acompanhavam o voo nos seus radares.

O controlador-chefe de Tráfego Aéreo do Ministério de Obras e Direcção da Aviação Civil da Namíbia, Victor Likando, disse, no domingo, que o Botswana não comunicou o desaparecimento do voo TM 470 e que foram as autoridades da Namíbia que contactaram os departamentos congéneres de Gaborone e Luanda (capitais do Botswana e de Angola, respectivamente) para se inteirarem do sucedido com o avião. “O Botswana nunca nos disse. Eles deviam ter-nos avisado, mas nunca o fizeram”, disse Likando, citado pelo diário The Namibian.

Ainda durante a tarde de sexta-feira (29), habitantes da região do Parque Nacional de Bwabwata, localizado numa estreita língua de terra entre Angola e o Botswana, conhecida como Faixa de Caprivi, alertaram as autoridades namibianas sobre o local onde poderiam estar os destroços, porém a chuva e a densa vegetação impediram a chegada rápida ao local. As operações foram interrompidas com o cair da noite e só no sábado, por volta das 10 horas locais, foram avistados os primeiros destroços.

“Vimos logo que não havia sobreviventes, havia corpos espalhados por todo o lado. Dá a impressão de que o avião explodiu assim que se despenhou. Há destroços espalhados por uma área superior a 500 metros, está tudo em pedaços.”, afirmou o vice-comissário da Polícia da Namíbia na região de Kavango, Willy Bampton, um dos primeiros a chegar ao local da tragédia.

O co-piloto, Grácio Haward Chimuquile, era um jovem profissional moçambicano que já havia realizado 1.418 horas de voo, e em Setembro deste ano revalidou a sua licença de voo e foi aprovado na inspecção médico, tal como o comandante. Os outros membros da tripulação que pereceram neste trágico acidente são os moçambicanos Guimarães Mulungo (chefe de cabina), Heider Aboobacar (comissário de bordo), Vanda Moore (assistente de bordo) e o mecânico de bordo, cujo nome completo não nos foi possível apurar, identificado apenas pelo apelido Manhique.

Caixas negras localizadas

Ainda no sábado as caixas negras e o gravador de voz da cabina foram localizados e entregues às equipas da Agência Nacional de Aviação Civil da Namíbia, assim como os restos mortais de 31 dos 33 ocupantes da aeronave que foram entretanto transladados para a capital da Namíbia, Windhoek, onde desde segunda-feira (2) decorrem exames forenses e autópsias, desconhecendo-se quando serão trasladados para os países de origem onde as famílias os aguardam a fim de realizarem as respectivas exéquias fúnebres.

Em comunicado emitido nesta segunda-feira, a companhia aérea moçambicana afirma que “continuamos sem informação sobre quando os restos mortais e pertences serão libertados para entrega aos familiares o que dependerá do processo de identificação e testes. E acreditamos que isto será feito com a maior celeridade possível.” Entretanto o Conselho de Ministros de Moçambique anunciou a criação de duas comissões de inquérito para averiguar as circunstâncias em que decorreu esta tragédia.

De acordo com as leis da Organização de Aviação Civil Internacional (ICAO, sigla em inglês), a Namíbia, como Estado de ocorrência do acidente, tomará a liderança da investigação, com a participação das autoridades aeronáuticas de Moçambique, Angola, Brasil e o Departamento de Segurança de Transporte dos Estados Unidos. De referir que este é o primeiro acidente em que um avião das Linhas Aéreas de Moçambique se despenha e os ocupantes perdem a vida, em 33 anos de operações nacionais e internacionais da companhia aérea moçambicana.

Desde 2011, altura em que as Linhas Aéreas de Moçambique foram banidas de sobrevoar o espaço europeu, a empresa começou a renovar a sua frota, anteriormente composta por aparelhos Boeing, por modernos aviões como o que se despenhou nesta sexta-feira (29). Para além do Embraer 190, a LAM utiliza os modelos 120 e 145 da Embraer, Q 400 da canadiana Bombardier e um Boeing 737-500, construído nos Estados Unidos.

Actualmente, a companhia de bandeira moçambicana assegura voos internos para todas as capitais provinciais e ligações regionais para Dar es Salaam (Tanzania), Harare (Zimbabwe), Luanda (Angola), Nairobi (Quénia) e ainda para Joanesburgo e Cidade do Cabo (África do Sul).

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