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Toma que te Dou: A mãe

O título não é meu, roubei-o do romance de Máximo Gorky, que li há mais de vinte anos, e se me pedissem para descrever hoje, a história toda dessa obra de antologia, teria imensas dificuldades. Até porque nem é sobre isso que pretendo falar, apenas escolhi o título, pelo fascínio que ele emana: a mãe. Não há nada que a vai substituir, nem ninguém, mesmo que o seu ventre tenha sido amaldiçoado. A mãe é como Deus, ama os seus filhos infinitamente.

Ela tem as lágrimas em permanente latência, mas também possui a força que vai suportar todas as dores, porque aquela que é capaz de enfrentar a sofrimento do parto, vai resistir, com certeza, ao resto das chagas. A maior paciência do mundo é da mãe, vilipendiada, muitas vezes, por aqueles que ela própria gerou das suas entranhas. É como Deus, que perdoa com paciência sem limites, àqueles que O achincalham sem fim.

O silêncio da mãe pode ser também um sismo, um feixe de verrumas que nos vai penetrar com ardor, alma adentro. Sem piedade, como Deus quando está irado, muda de Jeová misericordioso, para Jeová das guerras, e dá ordens aos ventos e as chuvas e aos fogos, para lavrarem tudo que está na superfície da terra, sem contemplações.

A mãe também faz isso, pode demolir tudo com o silêncio, ela vai calar os canhões para sempre, porque as balas disparadas contra a mãe, virar-se-ão, amanhã, contra aqueles que as libertam para a matar. A mãe é inexplicável, insondável como o próprio Deus, que se virou para Nicodemus, através do seu filho unigénito, dizendo, Nicodemus, como é que vais entender as coisas celestiais, se nem as coisas terrenas entendes?

Na verdade muitos são aqueles que não saberão ler as mensagens cifradas da mãe, e quem não percebe isso, não poderá entender as profecias. Nunca saberá ler os sinais do tempo, teimando em querer seguir sozinho, arrastando os outros como escravos. Quem não sabe ler os sinais da mãe quererá ser como Maquiavel, não se importando com o sofrimento dos irmãos. O importante para ele é chegar, mesmo que para isso tenha que passar por cima de cadáveres.

Mas quem assim pensa, tem absolutamente falta de sabedoria. A mãe supera todas as armas. O seu silêncio e as lágrimas contidas, descerão amanhã como o dilúvio, para engolir, não os montes e montanhas, mas os carrascos de hoje, que enviam os filhos desta mãe silenciosa, para o teatro da guerra. O sofrimento da mãe, em ver seu filho carregando as armas que vão matar os seus irmãos, atinge o sol que vai perdendo o seu esplendor. Ela lembra-se de Caim, que pega no punhal e mata seu irmão, Abel, por inveja. E hoje, o filho desta mãe que olha para dentro dos olhos deles, com palavras fervendo, vai matar o seu irmão, sem saber porquê.

A mãe é o nosso último reduto. Depois de todas as derrotas regressamos ao calor da mãe. Com a certeza total de que seremos acolhidos, como nos acolheu durante nove meses, com amor inexcedível. Mas hoje, depois de ter sido abatido como cão, é o cadáver do filho que volta para os braços da mãe. Uma mãe que nunca entra em derrocada. Uma mãe que se prostra na longa espera pelo filho amado que volta, agora, em silêncio, deitado para sempre no maldito caixão, com o corpo rasgado pela pólvora.

E a mãe suporta toda essa dor, perante a indiferença. Perante o cinismo. Perante todo esse sadismo. Ela contém as lágrimas que lhe fustigam a alma como um rio impedido de seguir o seu destino em liberdade, nas margens indivisíveis do amor. As palavras dela não se ouvem, sentem-se, como se sente o silêncio. Ela debruça-se sobre o corpo inerte do filho e diz, vai em paz, filho. Perdoa-me por não ter podido te salvar!

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