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A brutalidade dos agentes que deviam nos proteger

A brutalidade dos agentes que deviam nos proteger

Esta história, que parece retirada de um romance de George Orwell, acontece em Moçambique e tem como protagonista a GroupFourSecuricor, uma empresa de segurança que opera no país fornecendo serviços de vigilância estática, transporte de valores e forças armadas.

O caso, dizem os funcionários, remonta a Junho de 2010, quando alguns funcionários deixaram de auferir rendimentos. Aliás, “há colegas que ficaram meses sem salário”, contam. Mas, como a empresa tinha prometido sanar o problema até Dezembro do ano passado, os protestos não encontraram eco no seio dos trabalhadores.

Contudo, para além de não resolver o problema, a empresa criou mais dois constrangimentos: estabeleceu unilateralmente um novo horário de serviço na cidade da Matola e introduziu um novo sistema de processamento de salários.

Com tal medida a empresa deixou de pagar horas extras e a discórdia começou a ganhar corpo. Porém, a 3 Novembro de 2010, as partes desavindas sentaram-se à mesa para negociar, mas, volvido um mês, o impasse persistiu devido à falta de entendimento.

Ainda assim, no dia 26 de Janeiro de 2011, os funcionários voltaram a reunir-se com a entidade patronal e o rol de reclamações tinha-se tornado mais robusto. Ou seja, o novo sistema de processamento de salários chegava a descontar mais de 70 porcento do salário dos funcionários.

Há registo de funcionários que auferiram 33, 300 ou 700 meticais nos últimos três meses, quando o salário mínimo foi fixado, na sua última actualização, em 2250 meticais. No referido encontro o sindicato prometeu que, em caso de falta de entendimento, iria observar uma greve.

Na quarta-feira, 6 de Abril, a greve, qual mecanismo de pressãoà direcção da G4S para atender às reivindicações dos trabalhadores, colocou a Força de Intervenção Rápida no centro das atenções.

Depois do incumprimento da promessa, na presença de funcionários do Ministério do Trabalho, de pagar os valores em dívida até as primeiras horas da terça-feira, os protestantes, já na quarta-feira, começaram a entoar cânticos, deixaram o muro da sede da empresa sem grades e alguns vidros dos escritórios ficaram danificados. Até que a FIR, armada até aos dentes, decidiu agir e protagonizar um espectáculo de violência e de detenções arbitrárias.

Aliás, todos osindivíduos identifi cados como sendo agentes da G4S eram vítimas da violência física da FIR. Como resultado da actuação da FIR, duas pessoas morreram e 24 pessoas ficaram feridas. As celas da 18a esquadra ainda albergam 18 agentes da G4S detidos de forma arbitrária.

As imagens que passaram nas televisões moçambicanas rapidamente foram parar ao mundo e à Internet, de onde surgiram várias questões que continuam sem resposta. Quem esquecerá as imagens da Imprensa, feitas sob pressão, de adultos em transe, outros no chão, fugindo desesperadamente dos agentes da Força de Intervenção Rápida de Moçambique (FIR)?

Como deixar de ouvir os seus gritos de absoluto terror enquanto vagavam atónitos pelas imediações da empresa que antes lhes dava o pão?

Apagaremos um dia das nossas vidas o macabro filme captado pelas câmaras da televisão pública, que primeiro apresenta um edifício com vidros partidos, depois revela uma polícia fria e sem escrúpulos carregando as suas armas e, ao final, o choro de chefes de família tentando escapar da ira dos agentes?

E as cenas que não foram vistas, mas construímos nas nossas mentes a partir dos relatos minuciosos das vítimas – adultos com a alma manchada e o estômago literalmente vazio que falavam com uma frieza apenas capaz aos que estão tomados pela desgraça?

E as expressões de horror nos rostos de filhos, pais e esposas, que viveram as suas dores no anonimato das casas precárias enquanto esperavam por um prato de comida que nunca veio?

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