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Kerygma: 14 de Fevereiro é nosso

Hoje é 14 de Fevereiro. Para muitos é o dia dos namorados, ou o dia em que se evoca o “tal” São Valentim, para namorar muito ou fingir um amor infinito. Para mim é mais um dia. Vou labutar e, depois da minha hora de expediente, se tiver algum dinheiro no bolso, vou parar na barraca do Simão a fim de “namorar” algumas garrafas de cerveja na companhia dos meus amigos. Isto não significa que não dou importância ao madrigal. Apenas estou fatigado de ter muitas mulheres a cercarem-me nas vésperas desta data, só porque querem um presente para aparentarem ser amadas. Por exemplo, a Lourena Drummond quer ser minha namorada e já me pediu uma oferenda. Acho que lhe vou comprar uma rede mosquiteira para se proteger da malária, mas temo que ela a utilize para pescar “magumbinhas” no Rio Mulauze.

Não comemoro essa data porque o amor que eu tenho e sinto pela minha Belmira é espontâneo. Eu galanteio-a quando o momento é propício e zangamo-nos quando um de nós “mete água”. Eu irrito-me com ela quando não cozinha o que gosto – uma feijoada. Juro que sou capaz de comer feijoada todos os dias da minha vida. Mas quem costuma estragar tudo sou eu. Estrago quando não chego a casa na hora certa para comer ao seu lado e junto das minhas princesas. Deterioro a relação quando sou possuído por um espírito devorador.

“Malfaço” o nosso amor quando chego a casa bêbado. Mas, o maior estrago que tenho feito é quando chego a casa ébrio e não cumpro o meu papel de marido ideal nas madrugadas. Por causa disso, uma vez ela foi queixar aos nossos padrinhos sobre a minha ausência no leito. No dia da reunião “concentraram-me” e algumas pessoas acusaram-me de ter outra mulher, incluindo amantes de raça branca (isto porque um dos livros que tenho em casa me foi oferecido por uma espanhola).

A verdade é que, depois dessa reunião, comecei a dar conta da incumbência dos meus padrinhos e, como consequência, ela pediu para passar duas semanas na casa dos seus pais, e quando regressou veio com a história segundo a qual iria procurar uma segunda mulher para ajudá-la. Foi ai que percebi a lógica da poligamia: as mulheres, escondendo as suas frustrações, ao mesmo tempo que perpetuam a mesma em nome do amor. Enfim, trata-se de coisas de mulheres em que os homens tiram proveito.

Tenho de admitir que com a Belmira aprendi muitas coisas. Algumas não vou contar aqui, pois ficam entre nós os dois. Com o tempo percebi que entre nós surgiu o amor romântico. Evidentemente, o amor romântico é essencialmente um amor feminino pois está embrulhado com importantes transições que afectam tanto os contextos da vida pessoal como o casamento. Com ela, aprendi a ser respeitado na família, na sociedade e no meu local de faina.

Aprendi a criar um lar, a ter uma relação amigável com as minhas princesas e a reinventar a maternidade sempre que vejo uma criança. Essas modificações obrigaram-me a ter um deslocamento da minha autoridade patriarcal para uma afeição maternal. Eu sou um homem que finge ser normal, porque por trás de mim está uma colossal mulher que, carinhosamente, chamo Eufrásia.

Hoje, 14 de Fevereiro, com um quarto de século e uma oitava que correspondem à minha velhice descobri que eu sou o São Valentim para ela. E ela é a minha Vénus. Até estou a pensar em mudarmos de nomes: eu deixo de ser Cremildo a fim de me tornar conhecido por São Valentim e ela deixa de ser Belarmina e passa a ser Vénus. Nós somos o exemplo claro da união. Tenho um amigo que diz que a nossa relação é de unidade nacional porque ela é de Inhaminga (Sofala), eu de Inhagóia (Maputo), as nossas vergônteas são de Angoche e temos intenções de “filhar” umas meninas de Palma (Cabo Delgado).

Nesta data, que é normal para mim, chegarei a casa e darei o beijo de costume à minha Eufrásia e vou jantar com o “xicôa” que trouxe do Chiveve. Vou ver um filme e talvez um espectáculo de Seu Jorge. Não vou ler nenhum livro porque, aos fins-de-semana, não toco em assuntos literários, mas sim em conteúdos de boémia. No sábado vamos ao Inhagóia avigorar a ideia da família alargada e no domingo vamos ao culto pedir que Deus nos dê a paz em Moçambique e que ilumine as mentes dos decisores e do povo, no geral, para sermos tolerantes, uns para com os outros, e vivermos com base no espírito de irmandade.

14 de Fevereiro são todos os dias. São os dias do Natal, do trabalhador, da mulher e de outras efemérides instituídas pelos homens por terem um significado relevante. Por inferência o que aspiro é fazer com que todos os dias sejam de amor, de felicidade, de amizade e de alegria. As coisas ruins acontecerão sempre enquanto formos mortais. Mas, enquanto a maldade não chega, todo o dia deve ser de festa.

Devemos comemorar a vida todos os dias que acordamos e respiramos por existirmos e fazermos o nosso papel neste mundo que tanto precisa da nossa inspiração e garra para se tornar melhor. Devemos namorar com o mundo e com os nossos ideais e fazer deles uma ponte para que mais cupidos nasçam, segundo a nossa espécie e os nossos desejos. Assim, descobriremos que não precisamos de esperar o décimo quarto dia do mês de Fevereiro para revelarmos o amor que temos um pelo outro.

P.S.: Sílvia de Jesus, Ana Clemente, Sara Mungói, Elsa Maria, Constância Chissano, Amina Rafik, Iveth dos Santos … vocês serão as minhas paixões, mas o meu maior amor é Belarmina Jone.

Cremildo Bahule

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