
Eu própria incluo-me nesse grupo.
Sim, sei que é crime piratear, mas a verdade é que a maior parte das pessoas que não compra estas cópias de DVD não é pela ideologia mas porque são de má qualidade.
Pois aqui deixo a dica, encontrar o dealer certo. É preciso procurar um dos bons e depois criar aquele nível de confiança mútua que nos permite ir ao barbeiro, ao sapateiro ou ao café habitual e não ter sempre de explicar de início o que queremos, como queremos – o que eu detesto a pressão que sinto de casa vez que experimento cabeleireiro novo! – e quanto tempo vai demorar e que preço vai custar.
Eu com os DVD tenho os meus dealer, e esses trazem-me as cópias com a melhor qualidade, e as mais raras.
Quando os conheci tive de passar por todo aquele penoso processo de escolher entre as mil comédias românticas, as centenas de filmes de luta e as dezenas de acção, aqueles filmes que quero mesmo ver, e que estão, invariavelmente, no fundo do saco.
Assim vi trabalhos de Woody Allen, Tim Burton e Irmãos Coen, tudo no conforto do meu lar e muitas vezes no dia da estreia!
Sim, eu sei que é pirataria, não se faz, então e os direitos de autor e tudo isso?
Sim, eu sei que sou culpada.
E pago por isso. Tudo se paga nesta vida! E confesso que muitas vezes o visionamento é feito em agonia. Porque os dealer são fiéis, mas quando procuro o último filme de Quentin Tarantino e só há uma cópia, malgrado o trato, é essa mesma que me é vendida com a mesma enfática promessa:
– Senhora, é boa cópia essa, confia, é de qualidade, se não for boa pode trocar.
Ora é exactamente esta proposta que me faz desconfiar… mas vou para casa, na cama ajeito as almofadas, levo o chá e às vezes os bolinhos e estou preparada para ver um filme, daqueles dignos desse nome, o da sétima arte!
A cópia é ilegível.
Algumas das cópias são mesmo feitas do filme do videoclube, com os créditos e o “proibido copiar” e tudo, partes que eu passo rapidamente para a frente, corada.
Há os “for awards consideration only” em que durante toda a cópia a imagem fica a preto e branco 50 vezes e a legenda aparece, lembrando-nos do fim para o qual foi copiado o filme… É bem claro que esta mensagem não é para mim mas mesmo a ter de pensar por um segundo num prémio a atribuir faz-me distrair um pouco… e porque fica a preto e branco a imagem?
São mistérios insondáveis os caminhos da pirataria.
E, de pala no olho, continuo a tentar o visionamento.
Depois, não sei porquê mas quando aparecem os obstáculos a mente aceita o jogo e aguenta tudo!
Já percebemos até quando vai aparecer a risca no meio, a chuva em metade da imagem ou a mudança de cor, o delay do som ou das legendas. Tudo isto pode animar um verdadeiro momento de pirataria!
Há também os piratas que vão para o cinema de câmara na mão, por mim tudo bem, eu por esta altura já não sou esquisita, mas quando uns tipos chegam atrasados e eu em vez de ver o filme vejo uns casacos a passar, ou uma cabeça mais alta marca indelevelmente a imagem, o momento é mais difícil.
E uma vez até outro filme, completamente diferente, apareceu no meio da fita! É verdade que era com o mesmo actor no papel de protagonista, mas não me parece razão suficiente…
Quando a tradução é tão má que ouvimos o “piece of cake” (no sentido de “muito fácil”) traduzido por “fatia de bolo” e “let’s make a toast” (“vamos fazer um brinde”) por “vamos fazer uma tosta” desconfio que quem esteve atento ao texto não teve acesso às imagens…
E em todas as cenas o texto é tão vago e tão repetitivo que parece sempre o de um filme pornográfico…
Mas o pior é mesmo quando o pirata que faz a filmagem leva batatas fritas e só se ouve o seu mastigar onde se deveria ouvir a voz sensual da Scarlet Johanson aqui eu já me importo um bocado!
E a cena faz-me repensar o discurso dos direitos de autor e tudo o resto.