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Watana: uma banda (in)feliz

Watana: uma banda (in)feliz

Com mais de uma década de existência, o Watana é mais do que um agrupamento musical. Constitui, na verdade, a materialização do sonho de um grupo de jovens apaixonados pela música que se uniram com o objectivo de animar as noites de Nampula, e não só. Presentemente, à mercê da sua própria sorte, a banda que na língua local significa “união” rema contra a maré para imortalizar os ritmos quentes do norte do país numa cidade onde os espaços para a realização de concertos ao vivo vão minguando a cada dia que passa.

Mergulhado num mar de incerteza numa cidade sem a cultura de realização de concertos musicais ao vivo, o Watana, que surge da fusão de vários grupos musicais, procura impor-se como uma referência a nível da região norte do país. Criado em 2002 com o objectivo de incentivar os jovens artistas a realizarem espectáculos acompanhados por uma banda, bem como discutirem estratégias que contribuam para o desenvolvimento da música na província de Nampula, o agrupamento musical continua firme nos seus ideais, apesar das inúmeras dificuldades por que passa no dia-a-dia.

O grupo, liderado desde o seu surgimento por Benjamin Isac Albino, teclista da banda, que também foi líder do agrupamento musical Mithodcheto, é constituído por seis elementos, nomeadamente dois guitarristas, dois bateristas, um teclista e uma vocalista. “Sentimos que a terra da muthiana orera estava a perder artistas e igualmente assistia à extinção de bandas musicais, daí que tenha surgida a ideia de consolidar as pequenas colectividades que existiam para formar um agrupamento forte”, afirmou Albino.

Para a materialização do sonho do agrupamento, além do talento, cada integrante da banda contribuiu, apresentando- se com um instrumento musical seu. Porém, o material não era suficiente para a realização de ensaios e actuações, razão pela qual eles se viram obrigados a alugar alguma aparelhagem. Apesar da adversidade, a paixão pela música intensificava-se a cada dia que passava.

Não era apenas a escassez de instrumentos musicais que preocupava o grupo, a falta de espaço para os ensaios era outra dor de cabeça para os músicos. Porém, mais tarde, graças a um golpe de sorte, a banda Watana teve a permissão para ensaiar no recinto da Casa Provincial de Cultura de Nampula e, todos os sábados, o agrupamento passou a fazer apresentações gratuitas ao ar livre como forma de mostrar o talento e conquistar o público.

Não decorreu muito tempo até a banda cair na graça do público. Ainda jovem quanto à sua existência, o Watana passou a receber convites para apresentações musicais na cidade de Nampula e não só. Com o valor que amealhava nas actuações, o grupo resolveu o problema relativo à falta de instrumentos, adquirindo- os, facto que lhe permitiu tornar-se mais activo. Como corolário da situação, novos elementos passaram a integrar a banda, dando um novo fôlego.

O Watana não só conquistou o coração do público de Nampula como também ganhou a admiração da direcção da Casa Provincial de Cultura que, numa demonstração de reconhecimento do trabalho da banda, ofereceu uma guitarra e uma bateria. Com o espaço garantido para os ensaios e os instrumentos musicais completos, seguiram-se momentos de sucesso para o grupo. Todos os fins-de-semana, o agrupamento recebia convites para actuar em restaurantes. “Começámos a fazer apresentações nas casas de pasto e, mais tarde, passámos a actuar em eventos alusivos às datas festivas, onde os espectáculos eram financiados por singulares de boa-fé e as empresas de telefonia móvel”, disse Benjamin Albino.

Por diversas vezes, a banda representou a província de Nampula nos festivais promovidos pelo Ministério da Educação e Cultura e pelo sector privado. Com sensivelmente 12 anos de existência, o agrupamento não dispõe de um álbum gravado, devido à falta de condições financeiras para o efeito. A banda possui 34 músicas no mercado. A violência doméstica contra a mulher e rapariga, a infidelidade entre os casais, o abuso sexual, o tráfico de menores e a poligamia são os tópicos que a banda Watana aborda nas suas composições musicais.

A “internacionalização”

Actuar no estrangeiro é um dos sonhos da banda Watana. Em 2004, o desejo de alguns dos integrantes chegou a ser concretizado, quando estes pertenciam ao agrupamento Mithodcheto que venceu o festival Crossroad promovido pela embaixada norte-americana em Maputo, cujo prémio incluía uma digressão pela Suécia.

Naquele país europeu, apresentaram um total de 32 espectáculos, uma experiência que o grupo considerada inédita. “Os espectáculos foram um sucesso. O público sueco ficou encantado com a nossa performance e não faltou à sessão de autógrafos”, afirmou Albino. Para além das actuações na Suécia, o agrupamento musical realizou uma digressão no vizinho Malawi. Neste ponto de África, a banda fez pelo menos 30 apresentações, onde abordou temas relacionados com a violência doméstica contra a mulher e a rapariga.

“Nós levámos o ritmo local, sobretudo o tufo, e outros para fora da nossa província e do país, graças ao nosso talento e empenho naquilo que fizemos com alegria e muita paixão para a elevação da cultura moçambicana, particularmente do povo macua”, disse o líder do grupo.

Apesar de tudo, um dos momentos mais marcantes para o grupo foi a abertura do megaconcerto no mês de Setembro, na cidade de Nampula, onde a figura de cartaz era a banda Kassav. Para Albino, dividir o palco com aquele prestigiado agrupamento musical foi simultaneamente um desafio e uma grande honra para os integrantes de Watana.

Um exemplo de persistência

O grupo passou por várias situações difíceis e, em alguns momentos, os seus constituintes pensaram em abandonar os palcos. Na verdade, as dificuldades mais intensas foram sentidas no princípio da criação do agrupamento, quando o trabalho era árduo e sem remuneração.

As questões financeiras para a resolução de problemas pessoais influíam cada vez mais na manutenção do grupo, mas, devido ao incentivo entre si, conseguiu superar e prosseguir com a carreira. Segundo Albino, os momentos difíceis vividos pela banda deviam servir de exemplo para as pessoas que pretendem engrenar na vida artística.

Por terem representado por diversas vezes a província de Nampula, os membros da banda Watana são da opinião de que deviam ser homenageados, uma vez que contribuíram para a divulgação da cultura. “As estruturas governamentais de Nampula pouco ou quase nada fazem para apoiar a nossa iniciativa. Como forma de louvar o que nós fazemos em prol da música, devíamos ser homenageados, uma vez que nas apresentações levamos sempre a cultura macua”, disse Benjamim Albino.

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