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‘@Verdade das Fábulas – A Sageza da Alegria

Faz oitenta anos este domingo. Mantém ainda tal rapidez na digitação das teclas que os seus emails são um emaranhado de lianas que a catana da atenção precisa de desbravar.

Quando o assunto é grave, o brio fá-lo redigir um texto certinho, sem mácula, e no fim queixa-se: «ia adormecendo, com este vagar de galinholas!». Ter nascido nas ilhas deu-lhe uma compulsão para o mundo, um gosto para a surpresa, a inclinação para o detalhe. Teve sempre pressa e foi acumulando os amores: a poesia, a arte, as viagens, a Grécia, os surtos revolucionários, o vinho, as mulheres, o pensamento como liberdade livre, o jazz.

Diz que Chet Baker dormiu muitas vezes em sua casa, mas os poetas, como o Corto Maltese acrescentam sempre algo à linha da vida. Certo é que foi compagnon de route de Aimé Césaire, amigo do peito de Michel Leiris – poeta e novelista portentoso, antropólogo, director do Musée de l’Homme, em Paris e companheiro de Joyce Mansour, uma egípcia que assombrou Paris e que foi a grande expressão no feminino do Surrealismo. Vejo a fotografia dos três – Leiris, Joyce e Virgílio –, jovens e felizes em Cuba, nos anos 60, e invejo-os.

Nos anos 70, Virgílio já não iria a Cuba, pois o poeta diria como Pessoa “sou lúcido, porra”, e preferiu sempre a liberdade aos dogmas, o universalismo aos nacionalismos. Por isso, depois de ter lutado contra o fascismo português e pela independência de Moçambique, manteve reservas quanto ao alinhamento do país num dos lados da Guerra Fria e após a independência escolheu um segundo exílio. Não se precipitem: não abandonou.

Virgílio foi sempre um homem de uma fidelidade estrita, que o digam os amigos – Craveirinha, Luís Bernardo Howana, Ricardo Rangel, José Forjaz, por exemplo, ou a sua Ilha de Moçambique. Era-lhe apenas insuportável viver “sob restrição”.

Ademais, um homem de tanto gosto pela vida, um bon vivant, devia parecer um diletante ao tempo em que os revolucionários se faziam de um só molde, que não comportava o riso e a dúvida. A História deu-lhe razão: navegar é preciso mas viver também é preciso. Daí que seja de aplaudir o retorno do poeta, um dos maiores deste país.

*Professor Universitário

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