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Uma lei que regrediu

O primeiro relatório de monitoria da boa governação ambiental e dos recursos naturais de Moçambique, do Centro Terra Viva, no seu capítulo sobre a Lei de Terras e respectiva regulamentação, publicado em meados deste ano, refere que o dispositivo legal moçambicano é “um autêntico motivo de orgulho, constituindo bandeira nacional e objecto de intenso estudo a nível nacional e internacional”.

Porém, a alteração em curso de alguns artigos “em nada dignifica todo o esforço despendido na elaboração de uma lei democrática e justa como é a Lei de Terras”.

Efectivamente, a Lei de Terras (Lei no 19/97 de 1 de Outubro) “busca realizar a conciliação entre a protecção dos direitos da larga maioria da população que depende da terra para viver, com as necessidades impostas pelos processos de desenvolvimento”.

Como exemplo, o documento interpreta o artigo 3 da lei em causa que consagra, na senda da Constituição da República, o princípio da propriedade estatal da terra, não podendo ser vendida ou, por qualquer forma, alienada, hipotecada ou penhorada. Por outro lado, fala de um equilíbrio de interesses para responder “à necessidade de adequação do regime de terras”.

Ou seja, “à nova conjuntura política, económica e social e garantir o acesso e a segurança de posse de terra, tanto dos camponeses moçambicanos, como dos investidores nacionais e estrangeiros.

Para o relatório, “este equilíbrio, entre os interesses das populações rurais que dependem maioritariamente do uso e aproveitamento da terra como fonte de subsistência, por um lado, e os interesses colocados pelo investimento nacional e estrangeiro por outro, encontra-se presente ao longo do quadro legal de terras”.

Conceito de comunidade local

O documento refere que a Lei de Terras “é igualmente importante por ter consagrado a comunidade local como pessoa jurídica, verdadeira, sujeita a direitos e deveres.

Para o efeito, toma em consideração a definição consagrada no nº 1 do artigo 1, segundo a qual “comunidade local é um agrupamento de famílias e indivíduos, vivendo numa circunscrição territorial de níveis de localidade inferior, que visa a salvaguarda de interesses comuns através da protecção de áreas habitacionais, áreas agrícolas, sejam cultivadas ou em pousio, florestas, sítios de importância cultural, pastagens, fontes de água e de expansão”.

DUAT

O DUAT adquirido por ocupação é constitucional e legalmente reconhecido, seja com base na ocupação através de normas costumeiras que não contrariem a lei, por um lado, ou da ocupação, de boa-fé, por via da utilização da mesma, há pelo menos dez anos, por outro. No que diz respeito ao DUAT das comunidades locais, há questões fundamentais.

Os mesmos existem independentemente da apresentação de um título emitido pelos Serviços de Cadastro comprovativo, depois, a ausência de registo não prejudica a existência de DUAT adquirido por ocupação, desde que este possa ser comprovado por membros da comunidade local, como também por intermédio de qualquer outro meio de prova legalmente admissível.

Polémica

A polémica alteração do artigo 35 do Regulamento da Lei de Terras, aprovado por Decreto nº 50/2007, de 16 de Outubro, exclui as comunidades locais das grandes decisões sobre a terra que ocupam. Efectivamente, o trabalho de consulta passa a integrar, para além dos Serviços de Cadastro, o administrador e os membros da comunidade, excluindo, desse modo, a comunidade das decisões que dizem respeito ao lugar onde se encontra inserida.

Ou seja, se antes bastava o mero despacho do governador da província, agora, em função da dimensão da área pretendida, o Conselho de Ministros passa a ter competências para autorizar DUAT’s previstos no artigo 22 da Lei de Terras.

No entender do documento, há um claro propósito de controlo e manipulação através do critério da representatividade das comunidades locais, ao se ter substituído a opção anterior do trabalho de consulta dever ser assinado por representantes da comunidade local pelo modelo da assinatura pelos membros dos Conselhos Consultivos de Povoação e Localidade.

Por fim, o documento adverte de que há uma “necessidade de se repensar no processo de revisão legislativa em curso num Estado de Direito Democrático. Estes exemplos em nada dignificam todo o esforço despendido na elaboração de uma lei democrática e justa como a Lei de Terras”.

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