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Um país, duas visões

A República Popular da China há muito que criou uma combinação sui generis. A ela chamou: um país, dois sistemas. Isto é, naquele imenso território – é o mais populoso do mundo e o terceiro em superfície, depois da Federação Russa e do Canadá – vive-se a duas velocidades diametralmente opostas mas que, habilmente, parecem coabitar na perfeição. Na política, o partido fundado por Mao Zedong controla tudo ao milímetro tal como no tempo da fundação da República Popular em 1949, ou nos anos mais tenebrosos da Revolução Cultural na década de sessenta.

 

O Partido Comunista Chinês (PCC) dirige tudo com mão de ferro. O associativismo não existe, a imprensa é hipercontrolada, as novas tecnologias idem, a pena de morte continua a matar uns bons milhares por ano e quem tenha uma opinião diferente da oficial facilmente passa um mau bocado. O PCC é um partido de vanguarda e tem a seu cargo todo o papel dirigente da sociedade. O país, falando numa linguagem automobilista, tem há muito engatado o ponto morto no que à política diz respeito.

O segundo sistema é um capitalismo exacerbado e esse parece possuir um motor turbo, tendo arrancado e uma velocidade estonteante nos últimos anos. Basta visitar cidades como Xangai, Hong Kong, Macau para se constatar essa riqueza transbordante, exorbitante. No meio desta crise internacional, onde todos contraem empréstimos para salvar uma inevitável falência, a China paga cash, sem pestanejar, e exibe riqueza e prosperidade nunca vistas como ficou bem patente nos últimos Jogos Olímpicos de Pequim.O capitalismo mundial faz vénias aos grandes empresários chineses, convida-os para sua casa e, embora de uma forma interesseira, convive com eles porque o dinheiro não tem cor.

Vem todo este intróito a propósito do discurso do nosso Presidente esta segunda-feira sobre o estado da Nação na Assembleia da República, boicotado mais uma vez pela bancada da oposição. A Renamo/ UE justificou a ausência com o facto de a Frelimo ignorar sistematicamente as propostas de lei. Com razão ou sem ela, o certo é que a Renamo/UE primou pela ausência.

Segundo o Presidente da República, ponto de vista completamente comungado pela Frelimo, o país vai de vento em popa. Tudo são rosas e não há espinhos pelo caminho. Quem vê espinhos no lugar de rosas é apóstolo da desgraça.

Quem não vê melhorias e benfeitorias é o pior cego: aquele que não quer ver. Para meu espanto, até a criminalidade baixou! Pergunto: se alguém, andando na rua, se sente hoje mais seguro do que há um ano ou dois?

É certo que houve progressos – descentralização materializada sobretudo nos 7 milhões para os distritos, a produção de milho aumentou, a Revolução Verde é uma realidade, a ponte do Caia também – mas também houve recuos e estagnação – a Justiça está mais descredibilizada do que nunca; as forças de segurança continuam a não inspirar confiança; a corrupção segue a galope; na Educação a quantidade continua a vencer a qualidade; a Cultura, como não rende, continua desprezada e relegada para um canto da gaveta; a comunicação social, salvo algumas e honrosas excepções, continua subserviente ao poder político. Por tudo isto temos, igualmente, à nossa maneira e escala, um país e duas visões: uma oficial e outra real. A virtude, como em tudo, estará no meio.

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