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Um concerto para reinventar a música

Boas massalas levam-nos a uma (boa) “Makhara”!

No Quinta Canta do fim de Maio, no Centro Cultural Franco-Moçambicano, em Maputo, exibiram-se os resultados da oficina de criação entre o moçambicano Cheny Wa Gune e Nathalie Matiembé, das Ilhas Reunião. Mas antes, actuaram os Timbila Muzimba. No intercâmbio, os primeiros artistas reinventaram a música, colocando em causa o conceito musical dos espectadores.

Conhecemos os Timbila Muzimba. Eles são uma orquestra musical jovem que, não obstante os 15 anos que passam, desde o seu surgimento, se mantêm na linha da frente. O seu envolvimento em diferentes frentes da vida social, utilizando a música, o seu instrumento de base, fá-los imemoráveis na cena da produção artística em Moçambique.

No entanto, no dia 30 de Maio, quando se fez o concerto enquadrado no programa Quinta Canta – em que os músicos se encontram para intercambiar experiências e conhecimentos – os Timbila Muzimba serviram mesmo para preparar o palco enquanto os donos do show se preparavam. Eclécticos no trabalho que fazem, os membros daquela colectividade não quiseram perder a credibilidade que conquistaram a trabalhar arduamente ao longo dos longos anos.

Com a composição Sing my song, explorando a presença do antigo baterista da banda, Djibra, que agora trabalha em Angola, os Timbila convidaram a plateia a cantar a sua música, ou, no mínimo, a expressar tal vontade, e iniciaram o evento.

Apresentaram cinco temas – nomeadamente, Mamanhane, Tchiwititchinhana, Vevula, Tjebulane e Huninganitolovene – num dos quais falam da vida doméstica, da vizinhança, a fim de construir ou reconstruir essas vivências. E foram-se embora.

Instalou-se uma música electrónica

Assim que chegaram, Nathalie Matiembé e a sua banda composta por Costa Yann, no teclado, Kuleniovic Boris, na viola-baixo e Cyril Faivre, na bateria, cantaram.

Bon Bon Zetwal, Bwalé, Rev e Vida, os primeiros temas apresentados, foram as músicas a partir das quais a cantora começou a revelar a sua rebeldia, a sua poesia, bem como a sua vida íntima para conquistar, paulatinamente, o favor de um público pouco dançante.

No entanto, como naquele evento existia algo muito sublime – “um desejo de se encontrar entre dois artistas, em primeiro lugar, e entre duas culturas” – um sentido amplo e envolvente começou a ficar mais elaborado com a exposição dos temas Ilha, Democracia e Enda.

A partir daqui, o maloya, a poesia-crioulo, doce e rebelde de Nathalie fundiram-se à timbila, à mbira, bem como à voz forte e presente de Cheny construindo a metáfora da união do povo das Ilhas Reunião com o moçambicano, objectivamente representados pelos seus artistas.

Aliás, na composição Enda, Nathelie aproveitou a ocasião para mostrar que a música não se faz, necessariamente, com base na utilização de instrumentos convencionais e complexos. O som produzido pela fricção de um plástico – como se viu no concerto – que a dado momento pode ser áspero e desagradável e outro bem elaborado pode ser harmónico e encantador, também faz música.

As timbilas narram a nossa história

Em relação aos Timbila Muzimba, Matchume Zango, um dos especialistas no uso do da Timbila, o concerto serviu para narrar “a nossa e a história da Timbila em jeito de um welcome para que os cantores que vêm das Ilhas Reunião se sentissem em casa”.

O artista assegura que ainda que as Ilhas Reunião pertençam à França, por causa do passado colonial, as mesmas possuem uma relação histórica com Moçambique através do maloya – a música tradicional das Ilhas Reunião – que “foi uma manifestação cultural de um conjunto de escravos negros que trabalhavam nas plantações”.

Há uma grande união entre ambos os países, Moçambique e Ilhas Reunião. “Por isso, o concerto foi um reencontro entre os artistas e o público de modo que se promovesse um debate ou uma conversa através de uma linguagem universal, a música”, refere Matchume Zango.

Presentemente, os Timbila Muzimba têm estado a trabalhar em projectos como a descoberta e divulgação de novos talentos no âmbito das redes da World Music com base na colaboração com empresários internacionais que promovem as artes.

Por exemplo, “na Associação Cultural Wharethwa temos o projecto da produção de orquestras que é uma iniciativa em que se envolvem as comunidades, sobretudo os jovens, a quem se aministram aulas sobre a composição musical, o uso e a construção de instrumentos musicais”.

O que se pretende explicar é que as actividades da banda Timbila Muzimba transpõem a realização de um concerto musical no palco.

“Nós somos educadores que capitalizam os jovens a quem se transmite conhecimentos e experiências. Além do mais, temos outros projectos de âmbito internacional em que uma parte da nossa colectividade trabalha no College of Music, na Cidade do Cabo, na África do Sul, com vista à introdução da música moçambicana nesse circuito”.

De uma ou de outra forma, “as timbilas traduzem a nossa realidade como um povo. Por isso, sempre precisamos do apoio total do público nos nossos espectáculos. Nós, como os outros cantores, somos os embaixadores da música moçambicana no mundo”.

Somos heróis

Os resultados da residência de criação artística entre Cheny Wa Gune e Nathalie Matiembé – que durou três dias de trabalho intenso – também foram exibidos no Bush Fire Festival, no fim de Maio, na Suazilândia, antes de a artista retornar ao seu país.

“Tivemos um bom resultado não só na perspectiva da música como também na convivência, o que possibilitou que nos conhecêssemos melhor como artistas africanos”, afirma Cheny.

Além do mais, o compositor e instrumentista acrescenta que “foi importante explorar a humanidade dessas pessoas e perceber como é que vivem nos seus países, incluindo matérias ligadas ao intercâmbio em torno da industrial cultural no continente. Sentimos que todos nós, os músicos africanos, em certo grau, travamos a mesma luta para que o cantor tenha um espaço condigno na sociedade”.

Por exemplo, “em Moçambique, as pessoas que vivem da música são heróis. Não tem sido fácil”, afirma Cheny que acrescenta que, em parte, o intercâmbio serviu para que “falássemos sobre os nossos problemas, buscando soluções com o público – sem deixar de criar condições para emocioná-lo – e sonhar, cada vez mais, com melhores condições”.

Reconhecendo as dificuldades enfrentadas pelos artistas, o cantor considera que “nós não vivemos, unicamente, do trabalho musical. Realizamos outras actividades para complementar a arte como, por exemplo, o fabrico de instrumentos, o ensino, bem como a produção de trilhas sonoras para o cinema, para a dança contemporânea, incluindo outras formas de arte”.

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