Para continuarmos  a fazer jornalismo independente dos políticos e da vontade dos anunciantes o @Verdade passou a ter um preço.

Em Nampula há (construção de) um estádio moderno, barato mas incompleto!

Em 2009, em Nampula, nasceu um projecto de construção da Academia do Sport Nampula e Benfica. A planta da infra-estrutura, essa, é excepcional e rege-se por padrões internacionais de edificação de um estádio moderno. O custo do mesmo chega até a assustar, por tão acessível que é: 700 mil dólares norte-americanos. Trata-se de um recinto esboçado para albergar cerca de 5000 espectadores em duas bancadas; com parque de estacionamento com capacidade para cerca de 50 viaturas; escritórios para a direcção do clube; um centro de estágio; bares; salas para os árbitros; salas para os jornalistas; e diversos.

Efectivamente, as obras iniciaram em 2010 cujo fim estava previsto para o presente ano. No entanto, um pequeno detalhe torna o sonho de Abdul Hassane, presidente do Sport Nampula e Benfica, patrono desta obra, um autêntico pesadelo: a falta de relva sintética.

Nesta semana, em Nampula, o @Verdade conversou com aquele dirigente desportivo para perceber os contornos da edificação daquela invejável infra-estrutura atendendo, também, ao facto de se tratar de um clube que milita no Campeonato Provincial de Futebol, a segunda divisão do país.

@Verdade – Como é que surgiu a iniciativa da construção deste estádio?

Abdul Hussene – A ideia da construção deste estádio surgiu da necessidade de implantar uma academia desportiva no Sport Nampula e Benfica. Em 1998, quando tomei posse como presidente do clube, decidi instituir um centro de formação de jogadores.

Felizmente, a escola deu frutos como são os casos de Rivaldo, de Isac, de Imo, entre outros jogadores renomados na elite do futebol moçambicano. Por este motivo, senti que havia necessidade de dar maior comodidade e outro aspecto à nossa componente de formação, visto que as condições que damos aos nossos jogadores não são das melhores.

@V – Quando é que iniciaram as obras de construção do estádio?

AH – A planta foi elaborada em 2009 e as obras arrancaram em 2010.

@V – Fala-se muito de custos da construção deste estádio, em que se chega a afirmar que são baixos em comparação com os dos outros estádios desta natureza. Qual é o valor orçado para a edificação desta infra-estrutura?

AH – De facto, é uma obra de baixo custo. Está orçada em 700 mil dólares norte-americanos.

@V – De onde veio esse valor?

AH – Provém da negociação da nossa actual infra-estrutura. Nós entregámos o espaço onde está localizado o actual campo do Benfica e ficou combinado, com o novo proprietário, que ele ia encontrar um novo espaço e construir um estádio de raiz sem que houvesse, necessariamente, transacção de dinheiro. É uma espécie de troca de espaços ainda que com algumas contrapartidas, sabido que o interessado só pode ocupar o local onde funcionamos neste momento depois de construir aquela infra-estrutura.

@V – E não sai a perder por entregar um espaço situado numa zona nobre da cidade de Nampula, para ocupar uma região de expansão?

AH – Obviamente que não. Primeiro, nós somos um clube pobre. Segundo, neste actual espaço não temos mais nada senão o próprio campo. E terceiro, teremos um estádio moderno com todas as condições criadas para um clube que se preze.

@V – Qual é o modelo de inspiração da planta deste estádio, atendendo que ele é barato?

AH – A planta deste estádio surge da minha experiência como dirigente desportivo, por ter viajado para muitos países estrangeiros e conhecido vários centros de formação. Este é aproximado, para quem conhece, ao da academia de Palmeiras FC do Brasil. Mas em termos de inspiração, como tal, confesso que me inspirei no dia-a-dia do Benfica de Nampula, na ambição e na vontade de querer o melhor para este clube.

@V – E qual é o estado da obra neste momento?

AH – Já estive muito satisfeito, algum dia, com o desenrolar das obras. Mas hoje, com o fim a aproximar-se, estou muito triste com o projecto. Digo, até, que estou arrependido de ter iniciado.

@V – Porquê?

AH – Quando comecei com tudo isto, eu pensei que podia contar com o apoio do Governo e/ou das instituições que amparam o nosso desporto. Infelizmente, não foi o que aconteceu.

@V – Apoio em que medida, sabido que houve uma negociação entre o Sport Nampula e Benfica e um empresário local?

AH – Tem de perceber que o negócio teve um tecto de 700 mil dólares. Decidi que se começasse com a infra-estrutura e não com o piso. Estou bastante arrependido pois a primeira coisa que tinha de ser instalada era o piso sintético.

@V – E teria a mesma infra-estrutura?

AH – Teria uma infra-estrutura muito pobre visto que pegaríamos na metade do valor, 350 mil dólares, para comprar o tapete, utilizando o resto para edificar a estrutura do estádio. Já não teríamos, por exemplo, quartos para os jogadores; já não teríamos gabinetes de trabalho; já não teríamos uma tribuna de honra com 34 camarotes; já não teríamos duas bancadas; e a capacidade do próprio estádio ia reduzir de 5000 espectadores para entre 3000 e 3500.

@V – Não é um erro esperar tudo do Governo ou, por outra, não tinha planificado a aquisição do tapete?

AH – A compra da relva não está prevista no negócio. Tal como disse, o negócio está avaliado em 700 mil dólares. E pensei que, como existem instituições neste país que zelam pelo desporto, o projecto podia ter o devido apoio, tal como sucedeu num passado recente com o estádio da Machava e o campo do Costa do Sol que receberam da Federação Moçambicana de Futebol (FMF) dois tapetes sintéticos. Quando fiz o projecto anexei um pedido ao Instituto Nacional do Desporto (INADE) e à Federação Moçambicana de Futebol (FMF) para que me apoiassem.

@V – E qual foi a resposta da FMF?

AH – Conversámos directamente com Faizal Sidat, presidente daquele organismo. Ele disse que devíamos esperar pelo próximo donativo da Federação Internacional de Futebol (FIFA). Mas quando chegou o tapete, ele próprio tratou de carregá-lo para Quelimane durante a campanha eleitoral para as “intercales”, obviamente para ajudar o candidato que acabou por ser derrotado.

@V – Ainda que houvesse alguma promessa por parte do presidente da FMF, nesse período a que se refere, Quelimane não era prioridade na óptica dele?

AH – Prioridade porquê? A província de Nampula, para além de ter duas equipas no Moçambola, diferentemente da Zambézia que não tem nenhuma, tem também dois estádios modernos em construção. Na minha óptica, se a decisão política dele obedeceu a alguma prioridade, então ele é insensível.

@V – Insistiu no contacto com o Ministério da Juventude e Desportos?

AH – Inúmeras vezes.

@V – E quais foram as respostas obtidas?

AH – Nenhuma resposta. Simplesmente fomos ignorados. Temos enviado os nossos projectos para a cidade de Maputo, e por vezes repetidos. O Ministério, por sua vez, pede o parecer da Direcção Provincial da Juventude e Desportos de Nampula, que nunca é favorável.

@V – São chumbados porquê?

AH – Pergunte à directora provincial. Só ela pode responder. Eu, pessoalmente, nunca tive problemas com ela, pelo contrário, mantemos boas relações. Só que não deixa de ser estranha a forma como ela se comporta. Por exemplo, aquando da última visita do ministro da Juventude e Desportos, Fernando Sumbana, ela impediu, de todas as maneiras, que nós apresentássemos os nossos projectos e reclamações. E assim o ministro saiu daqui sem conhecer a realidade desportiva desta província.

@V – Sente-se descriminado por ser da segunda divisão?

AH – Não se trata de nenhuma descriminação, apesar de tudo conduzir para essa conclusão. Há equipas do Moçambola que têm projectos sérios de formação mas nunca receberam apoio, nem do Governo nem da FMF. É uma questão de sensibilidade, apenas.

@V – Mas o que estimularia então, o Governo e a FMF a apoiarem este projecto do Benfica de Nampula?

AH – É proibido falar de formação de jogadores em Moçambique e não se tocar no nome do Sport Nampula e Benfica. As nossas selecções nacionais de base são alimentadas por este clube. Grande número de jogadores que militam no estrangeiro, hoje, saiu daqui, sem falar dos jogadores que despontam no Campeonato Nacional de Futebol.

Pergunto: não merecemos uma recompensa? Não merecemos um estímulo para que continuemos a formar? Formamos jogadores para quê? Porque levam os nossos jogadores se nem de onde vêm querem saber? “Estou desmotivado. Vou vender este estádio”

@V – Sabido que só falta a relva sintética para a conclusão da obra, o que pensa em fazer?

AH – Vou vender esta infra-estrutura, assim como está, por dois milhões de dólares. Quem quiser que compre. Caso não consiga um cliente, vou vender a minha casa, tal como fiz com a minha padaria para ajudar o Benfica. Neste país não há nenhum incentivo para quem realmente trabalha. Há sempre interesses por detrás de qualquer decisão.

@V – E vendendo o estádio por dois milhões de dólares, qual será o passo a seguir?

AH – Vou comprar uma relva sintética e vou encontrar um novo espaço para a construção de uma infra-estrutura do género ou ainda melhor. Com dois milhões de dólares dá para construir e ainda restar muito dinheiro para rentabilizar o clube.

@V – Pensa em desistir?

AH – Eu questiono: vale a pena continuar a trabalhar para um país que marginaliza quem realmente trabalha? Destes 700 mil dólares que estiveram no negócio era preferível gastar 100 mil a 200 mil dólares para construir algo básico e ter muito dinheiro para o desenvolvimento das nossas actividades, tornando o Sport Nampula e Benfica um clube de referência a nível do país.

@V – Não seria essa a melhor saída?

AH – Seria. Mas neste estádio até a selecção nacional A de futebol podia fazer os seus estágios e alguns jogos; a Copa Coca-Coca podia também ser disputada ali; e os Jogos Escolares podiam, também, usar aquele espaço que reuniria todas as condições necessárias de alojamento e competitivas.

@V – Sabendo dos custos elevados da relva sintética, não existem alternativas?

AH – Está descartada a utilização daquele recinto com um campo pelado, e em Nampula não há condições para a instalação de uma relva natural. Há falta de água e as condições climatéricas são outro obstáculo. A única solução é a relva sintética.

@V – Está refém de 350 mil dólares para concluir um projecto de 700 mil. Nunca pensou em pedir apoio às entidades privadas?

AH – Preciso apenas de 250 mil dólares. Posso tirar o restante valor do meu próprio bolso. No que diz respeito aos pedidos de patrocínios, já fui a todas as empresas desta cidade e não houve receptividade. Neste momento resta-me visitar as empresas da Coca-Cola e da Cervejas de Moçambique, onde espero que me atendam a bem do desporto em Nampula.

@V – E qual será a recompensa para quem oferecer a relva sintética?

AH – Para além de ficar com o nome do estádio, quem apoiar terá direito a publicidade exclusiva no nosso equipamento, bem como a entradas gratuitas para os seus trabalhadores. Por exemplo: se for do Estado, estamos dispostos a homenagear um herói nacional; se for a Coca-Cola a patrocinar a compra da relva, o recinto denominar-se-á “Estádio Coca-Cola”; e se for a Cervejas de Moçambique, eles estarão livres de adoptar o nome que quiserem.

Facebook
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Related Posts

error: Content is protected !!