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Terraço Aberto ao debate crítico de Cabo Delgado

Não há pódios nem hierarquias no “Terraço Aberto” de Cabo Delgado. O debate “reflectivo, crítico e aberto” junta todos os meses em Pemba cidadãos, organizações da sociedade civil, órgãos governamentais, políticos e jornalistas, em assembleias populares sobre o desenvolvimento socioeconómico da província.

O convite é lançado pela Associação Suíça para a Cooperação Internacional (Helvetas), mas os temas são votados anualmente por quem participa nos Terraços. Se o que se pretende é “atingir um nível em que a sociedade civil é a essência de governação participativa”, então a organização dos próprios debates não poderia desenrolar-se de outra forma.

Cabo Delgado em 2040

Chegou a última sexta feira de Maio. É meio-dia e um sol abrasador faz com que tudo pareça andar devagar. “Este calor aqui? É dos recursos naturais: rubis, petróleo, gás natural”, explica convicto o condutor do táxi que me leva até à Casa Provincial da Cultura onde acontece o quinto Terraço Aberto de 2013, “as riquezas naturais respiram, e nós sentimos este calor”.

Não será tão literal o impacto das reservas de hidrocarbonetos e outros recursos minerais em Cabo Delgado, mas é, sem dúvida, quente o debate em torno das mudanças que as descobertas têm trazido à região. As terras mais a norte de Moçambique estão a tornar-se um dos principais atractivos para grandes investidores internacionais em todo o contente africano. Mas no que toca ao desenvolvimento humano e sustentável, muito fica por cumprir.

Não alheio ao efectivo e potencial boom de desenvolvimento na região, surge no início de 2010 o fórum “Terraço Aberto”. Com debates em torno do tema mãe “Cabo Delgado 2040”, nos últimos meses passaram pelo Terraço questões como a transparência da indústria extractiva, a juventude e as barreiras no mercado de trabalho. Em Maio, debateram- se “Políticas e Programas de e para Pessoas com Necessidades Especiais”.

O desenrolar de um Terraço

Num mural à vista de todos estão patentes o mote, as regras e o programa da sessão. Bárbara Kruspan, gestora do projecto, dá as boas-vindas e percorre os tópicos ali enumerados. O palco existente na Casa da Cultura só é usado para dar apoio à equipa técnica. Todos os cerca de 50 participantes estão sentados em cadeiras de plástico agrupadas no terreiro.

Entra em cena uma performance teatral que leva os presentes a reflectirem sobre as dificuldades que um invisual sente no seu dia-a-dia. Depois, iniciam-se as “Conversas de Café” entre grupos de quatro ou cinco pessoas. O objectivo é cada um falar sobre como seria viver com uma deficiência na sua comunidade.

Para alimentar a reflexão, foram convidados como oradores Guilherme dos Santos, director provincial da Mulher e Acção Social (DPMAS), e Adela Miguel, da Direcção Provincial da Educação e Cultura (DPEC). As intervenções do governo permitem conhecer algumas experiências e planos para a inclusão das pessoas e com necessidades especiais. Mas será que as políticas e os programas têm o devido efeito na vida de quem “porta deficiência”?

Levanta-se no Terraço José João Laire, da Associação Moçambicana dos Deficientes Visuais (AMDV). Recusando o termo “portador de deficiência” – “não é como se fosse algo que trouxéssemos na mala!” –, Laire traz a voz da sociedade civil e a opinião das próprias pessoas com necessidades especiais.

O extenso relatório que apresenta põe a descoberto a difícil realidade vivida por aquelas pessoas na sociedade, na família, nas instituições de ensino e no mercado de trabalho. Um breve interlúdio musical temático marca o tom enquanto os participantes recolhem senhas para a sua vez de intervir.

No debate são abordadas questões como a dicotomia inclusão-exclusão, a acessibilidade a centros de apoio ou de educação especial, como lidar com a discriminação ou porque não são as actividades culturais mais participadas por pessoas com necessidades especiais.

Em termos de programas, o Fórum das Associações dos Deficientes (FAMOD) apontou críticas às políticas que não saem do papel, e às diferenças de província para província no que diz respeito à atribuição de subsídios e isenções. Todo o debate era transcrito em directo para a página de Facebook do Terraço que, simultaneamente, era projectado na parede que delimita o Terraço.

Entre uma e outra intervenção mais incendiada – como a do jovem que apelou à manifestação ou o outro que acusou afirmando que “Nós não somos deficientes, as nossas instituições é que são!” – o fecho do Terraço deixa no ar a possibilidade de mudanças positivas veiculadas por um diálogo aberto entre políticos, organizações e cidadãos comuns.

Enquanto a garantia efectiva da plena igualdade de direitos para cidadãos e cidadãs com necessidades especiais, conforme definida no Artigo 37 da Constituição da República de Moçambique, estiver por cumprir, os participantes do Terraço Aberto prometem continuar a alimentar o debate.

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