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Sem asas para voar, artistas mendigam passagens!

Sem asas para voar

Formaram-se recentemente e – muito cedo – o resultado do seu trabalho ganhou expressão, projectando-os no mundo. No entanto, além dos vários convites desperdiçados este ano para apresentarem as suas obras no estrangeiro, presentemente têm um imperdível para participarem no Festmar – no Brasil em finais de Outubro – mas faltam-lhes duas passagens aéreas. Chamam-se Grupo Artes de Rua. Quem os apoia?

Num momento em que, em Moçambique, a paz é precipitadamente ameaçada, talvez não haja experiência melhor do que avaliar o nosso Consciente Colectivo. É esta a peça que – resgatando as peripécias vividas por vários moçambicanos nos primeiros 16 anos que se seguiram à época após a independência nacional, em que se inspiraram – os membros do Grupo de Artes de Rua Vana Va Ndlelene têm utilizado, bastas vezes, para, a par do público, reflectir sobre o assunto. O que mais se sabe sobre a obra?

A peça começa com uma performance em que todos os artistas praticam o Xigubo, uma dança tradicional africana guerreira. No seio do colectivo, uma personagem narra a história do conflito armado em Moçambique focalizando a sua mensagem nas crianças. Instala-se, depois, um outro cenário em que se vêem três petizes que – na verdade, são uma imaginação de uma mãe – procuram encontrar um espaço para se divertirem apesar de se encontrarem num ambiente belicoso. Só no final é que se percebe que elas representam a lembrança nostálgica e muito dolorosa de uma mãe que perdeu os seus filhos na guerra.

Como se percebe, nesta peça recuperam-se as experiências individuais dos membros de uma mesma família que revelam ao público até que ponto a guerra foi macabra. Por exemplo, a passagem em que no conflito um conjunto de soldados invade uma casa onde encontram e abusam sexualmente uma mulher perante o seu filho e o seu marido – espancando estes dois últimos – demonstra alguns dos infortúnios. E é isso o que também acontece na guerra.

O pior é que a referida senhora acaba por dar à luz a um filho cujo pai – em resultado de a sua gravidez ter acontecido num acto de abuso sexual perpetrado por vários homens – é desconhecido. É provável que a paternidade da criança seja atribuída a um dos violadores. Ora, essa história quando comparada com as justificações dos grupos beligerantes no âmbito da guerra dos 16 anos, em Moçambique, acaba por ser a metáfora daquilo que cada um cria e projecta como uma justificação para o advento do fenómeno beligerante. Todos têm um argumento para explicar as suas acções. O problema é que, no final, temos várias pessoas oprimidas em resultado do desentendimento de alguns, os opressores.

De qualquer modo, um aspecto importante é que a guerra termina e inicia-se uma nova época de paz – que todos devem(os) preservar porque o estágio anterior deixou provas exactas de que o conflito bélico só retarda o desenvolvimento humano e social, gerando impactos desastrosos. E é essa a mensagem que se potencializa na obra O Consciente Colectivo. Exibe-se o cenário de um mundo devastado pelo conflito armado – e, por isso, em que as pessoas sofrem – e, mais adiante, outro em que se está num contexto de paz, abundando a concórdia e a harmonia social. O público, no final, é convidado a fazer as suas escolhas em relação a estas duas realidades.

A paz é um bem da humanidade

Kenneth Ernesto Langa, um dos integrantes do Grupo Artes de Rua, faz a sua construção social em relação à peça e à necessidade de ela ser exibida em todos os contextos. “Inspirando-se na guerra dos 16 anos em Moçambique, a obra O Consciente Colectivo tem o objectivo de consciencializar as pessoas sobre o impacto dos conflitos armados. Por isso, trazemos uma série de personagens que têm uma experiência nesse contexto ou que sofreram as suas consequências. Pensamos que neste momento em que Moçambique vive situações de uma paz ameaçada, exibir esta obra é muito apropriado”.

“A paz não é só um bem nacional, mas é do interesse da Humanidade. Por isso, ela deve ser preservada a partir das relações entre as pessoas nas suas famílias, nas suas casas e nos seus bairros até ao mais alto nível de interacção entre as nações. Por essa razão, a nossa peça é uma espécie de apelo à paz”. Faltam-nos as passagens A caminho do Brasil, a peça será apresentada, mais uma vez, no dia 17 de Outubro no Centro Cultural Franco- -Moçambicano, em Maputo, a partir de 19 horas.

“As entradas não serão cobradas, mas esperamos que o público nos ajude com 50 meticais para custear determinadas despesas. Pessoas menores de 12 anos não pagam absolutamente nada”. Refira-se que, neste ano, devido à falta de apoio em aspectos ligados ao transporte, o Grupo Artes de Rua não tem participado em muitos festivais culturais realizados em países estrangeiros. Por isso, o Festival Latino-Americano de Artes de Teatro de Rua, Festmar, a decorrer entre 21 e 25 de Outubro, não deve ser desperdiçado. “O problema é que, mais uma vez, não temos as passagens para a viagem”.

Então, neste momento, “a nossa luta tem a ver com a procura de passagens aéreas porque, apesar de o Ministério da Cultura, através do FUNDAC, nos ter disponibilizado três voos para o Brasil, nós somos cinco elementos – o que significa que ainda temos um défice. A situação é preocupante porque nos falta muito pouco tempo e não sabemos onde encontrar esse apoio. Além do mais, o nosso espectáculo é muito melhor quando feito com o elenco completo – os cinco elementos”.

“Estamos a lutar contra o tempo. Se surgisse alguém que se identificasse com a nossa causa e nos apoiasse com alguns ingressos agradeceríamos imenso. Se for necessário, até podemos fazer uma troca de serviços – mesmo que isso implique incorporar cartazes publicitários dessas instituições na nossa obra”.

O Grupo Artes de Rua é constituído por Samuel Magia, Paulo, Jorge, Gilberto e Ernesto Langa. O mesmo resulta do consórcio destes jovens, inicialmente, pertencentes a diferentes colectividades artistas que beneficiaram de formação de especialidade tendo, no fim, resolvido criar este agrupamento. Eles trabalham com o Centro Cultural Franco-Moçambicano praticando o teatro de rua e de pernas de pau, ao mesmo tempo que envolvem disciplinas artísticas como o canto e a dança tradicionais, a projecção de fogo, o malabarismo, a magia e o teatro convencional.

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