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SELO: A transferência de tecnologias não é um caminho viável para o desenvolvimento – Por Mathusso Jucuiana

Moçambique faz parte dos países do terceiro mundo que ainda hoje lutam para a transferência de tecnologias dos países do primeiro mundo. Talvez, se eu fosse bom em matéria de história, traria uma boa argumentação sobre o percurso do desenvolvimento de Moçambique desde a independência, porém, a mesma história para nada iria servir, porque não traria evidências de boas políticas que visassem o desenvolvimento da nossa pátria.

Nenhum país desenvolveu via transferência de tecnologias. Aliás, esta foi experimentada, por exemplo, na República Dominicana, nos Estados Unidos da América (EUA), no Brasil, entre outros países, a partir da década de 60 e 70 (Miguel Expósito Verdejo). Neste período, o enfoque na transferência de tecnologias “causou uma mudança radical de estratégias, com enfoque no conhecimento das condições locais”, o que hoje vivemos em Moçambique.

A transferência de tecnologia em Moçambique, que é vista como uma via que nos levará ao desenvolvimento, resultou em fracasso nos países acima citados. Porém, os nossos governantes pretendem usar esta estratégia caduca de desenvolvimento. Da década de 60 para cá passam 56 anos. E a pergunta é como querem implementar esta estratégia que está há meio século abandonado?

A transferência de tecnologias tem como consequências imediatas algumas que cito:

1. “Passividade: o projecto é fixado com as actividades e objectivos definidos. E a informação é gerada sem se consultar aos beneficiários”. A população é tida como simples cobaia.

2. “Fonte de informação: a equipa do projecto pergunta aos beneficiários/população, porém, não os deixa decidir nem sobre o tipo de perguntas nem sobre as actividades posteriores”.

3. “Consulta: leva-se em consideração a opinião da população; integram-se as opiniões no enfoque da pesquisa para posterior instalar o projecto, mas o grupo-meta não tem poder de decisão”.

4. “Participação à base de incentivos materiais: propõem-se por exemplo, a participação em troca de insumos de produção ou de colocar à disposição terras com fins de exibição (unidade demonstrativa), mas a possibilidade de intervir nas decisões é muito limitada.

Eis que estes quatro pontos melhor retratam a nossa realidade, pois há muito tempo vivemos como experimento de vários países que em nome da transferência de tecnologias, implementam diversos projectos cujo, nem os critérios, nem os objectivos, nem as actividades são uma necessidade para a população. Isto podemos ver através do débil sistema de ensino, sistema de saúde, agricultura que não garante a sustentabilidade, a electricidade sem qualidade, água que nunca saí um dia completo, etc, onde nós somos a carroçaria daqueles que tem dinheiro.

Perante esta situação a pergunta lógia será: o que se pode fazer para evitar usar estratégias de desenvolvimento que já foram usados e fracassaram na República Dominicana, nos EUA, há 55 anos, e no Brasil, há 16 anos?

Eis uma proposta senhores membros do Governo de Moçambique.

Começarei esta parte apoiado na minha área de formação. O processo de ensino e aprendizagem tem hoje o seu enfoque no uso de métodos modernos, dos quais se destaca o ensino centralizado no aluno, pois se é o aluno a aprender, então ninguém melhor que ele para construir a sua própria aprendizagem.

Isto nos leva à seguinte reflexão: se é o camponês a trabalhar a terra, se é o electricista a fazer o trabalho de electrificação do país, se é o enfermeiro a tratar o doente, se é o engenheiro a arquitectar as obras, se é o pescador a pescar o peixe, então ninguém melhor que eles para falar das necessidades da sua área de acção, do material a utilizar e das estratégias de superação dos problemas. E se tal não acontece, voltamos à “querida” estratégia de transferência de tecnologias, inviável por si mesma, infundamentada e com muitos equívocos de garantir o desenvolvimento.

O parágrafo acima pode ser parafraseada e resumida da seguinte maneira: “o que nos interessa como população é o grau de participação que queremos (ou devemos) alcançar para estabelecer um desenvolvimento sustentável”.

Com isto pode-se perceber que nunca se alcançará o desenvolvimento, enquanto o governo estiver mais preocupada em abrir mais escolas do ensino geral (não que elas não sirvam). Para se alcançar desenvolvimento é preciso que mais pessoas sejam formadas nas diversas áreas (isso é possível com abertura de mais escolas de ensino Técnico profissional, com os cursos básicos e médios sobretudo, dada a economia do país que pode não suportar pagar tantos engenheiros e doutores, pois a qualidade do trabalho não somente depende do nível adquirido na formação, mais sobretudo da boa qualidade na formação).

As escolas técnicas profissionais, devem ser implantadas sobretudo nos distritos, pois assim garantiria a existência de diversos intervenientes formados em todas as áreas em cada distrito para não ser como tem vindo a acontecer, uma avaria de um computador no distrito deve-se esperar pelo técnico saído da província (quando chega diz o problema era do cabo que não estava bem ligado. Ao tal técnico deve-se pagar a vida de custo, hospedagem no hotel ou na pensão, alimentação, transporte, crédito, etc). E não é isso que cria desenvolvimento.

O Diagnóstico Rural Participativo (DRP), um documento que Brasil vem a usar desde o ano de 2006, elaborado na República Dominicana por Miguel Expósito Verdejo, replicado em vários países do 1º mundo diz que o desenvolvimento é directamente proporcional a nível de participação da população, cujo este nível subdivide-se um três partes ( a menção dos mesmos serão do que menos privilegia para que mais privilegia a população).

1. “Participação Funcional: o benefício se divide em grupos que perseguem objectivos fixados anteriormente pelo projecto. Na fase de execução participa da tomada de decisões e se torna independente no transcurso do projecto”.

2. “Participação Interactiva: o beneficiário/população é incluído do ponto de vista da fase de análise e definição do projecto. Participa do planeamento e execução”.

3. “Auto-ajuda: a comunidade toma a iniciativa e age independentemente”.

Muitos projectos para o desenvolvimento, estabelecem um grau de “ participação com base em incentivos materiais” ou, em casos excepcionais, alcançam uma participação funcional. Mas o DRP tem como objectivo a participação interactiva, ou seja, a participação dos beneficiários em todas as fases de um projecto de desenvolvimento.

Para que isso aconteça, precisa-se tanto da vontade política como da institucional, principalmente na execução de um projecto. E não teríamos fracassos como o projecto da jatrofa que tanto foi propalado, tanto tempo desperdiçado, tanto dinheiro esbanjado, mais no fim resultado nenhum. Ematum, idem. Só para citar como a falta de envolvimento directo da população não faz desenvolver um país.

Com tanto dinheiro gasto sem retorno em devaneios, se o governo tivesse noção do DRP, em Nampula, Dondo, Nhamatanda, Gorongosa e actualmente Quelimane teria aberto escolas Técnicos Profissionais para leccionar cursos de mecânico de motociclos, na Massinga, teria formação de Mecânicos de carros, em Macate e Chócue teria curso de Agro-Pecuária, em Quelimane na altura, teria curso de mecânicos de bicicletas, para além do curso de Secretariado nos vários distritos para evitar que os chefes da secretaria das escolas, hospitais, administração, etc sejam pessoas que não tem nenhum conhecimento na matéria de Administração Pública. Só para citar.

Transferência de tecnologias agrícolas para dar a quem? Se a população camponesa não sabe ler nem escrever, como receberá esta informação de tecnologia?

Concluo salientando que a minha intenção, ao elaborar esta reflexão, é chamar atenção ao Governo para não perder tempo em assuntos de pouco interesse para nós. A priori, deveria investir mais na formação dos moçambicanos para dar respostas aos problemas decorrentes da vida.

Por Mathusso Jucuiana

 

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