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Quando a justiça é injusta

Quando a justiça é injusta

Nos últimos dias, o sector de Justiça a nível da província de Nampula vive assombrado pelos actos de corrupção, pois os indivíduos que dispõem de condições financeiras não enfrentam quaisquer problemas relacionados com o andamento dos seus casos. A situação por que passaram Rosário Paqueleque e Sebastião de Sousa, ambos vítimas de acidente de viação, é exemplo disso. Os cidadãos, internados numa unidade sanitária, foram julgados e condenados, apesar de não terem sido ouvidos durante a fase de instrução preparatória.

Sebastião de Sousa, de 30 anos de idade, faleceu no dia 20 de Março, vítima de acidente de viação do tipo atropelamento no passado dia 01 de Janeiro do ano em curso. Além de ferimentos graves contraídos, há quem diga que ele morreu de desgosto devido à sentença proferida pela terceira secção do Tribunal Judicial da Cidade de Nampula, onde, ignorando todos os procedimentos legais, o auditório condenou o indivíduo, considerando-o culpado pelo sinistro. Além disso, o tribunal exigiu o pagamento de uma multa de mil meticais para a tramitação do expediente.

Um das situações ignoradas pelo juiz foi a não audição das testemunhas do sinistro. Além de não ter sido ouvido na fase de instrução preparatória, a vítima esteve ausente no dia julgamento, pois encontrava-se acamada no Hospital Central de Nampula (HCN). Segundo conta o pai do malogrado, Sousa Marques Joaquim, a família não foi notificada.

“Eu apenas fui solicitado pelo tribunal para assistir ao julgamento do meu filho que estava num estado crítico de saúde”, disse, lamentando a insensibilidade dos magistrados. Para surpresa de Joaquim, quando chegou à sala de julgamento, ele foi informado que devia apenas assistir ao acto. Na altura, o único réu naquela sala, o automobilista de nacionalidade estrangeira que responde pelo nome de William Hell, foi instado a explicar como tudo teria acontecido. De seguida e de forma impiedosa, o juiz decidiu ler a sentença, na qual condenava a vítima do acidente, alegando que não observou o Código de Estrada.

O mais agravante é que, depois disso, o juiz ordenou que o automobilista deixasse de prestar qualquer tipo de assistência a Sebastião de Sousa, facto que indignou o progenitor e a família. Na verdade, essa é a situação por que passam muitos cidadãos desprovidos de condições financeiras para contratar um advogado. Indignado com a forma como o processo foi instruído, Sousa Joaquim manifestou a sua preocupação em relação ao funcionamento do sector da Justiça na província e no país em geral. Após o julgamento, o pai da vítima permaneceu na sala e pediu que se fizesse a revisão do processo, porque não concordava com as circunstâncias em que a sentença foi proferida, visto que o seu filho não estava em condições de se fazer presente devido ao seu estado de saúde.

“Se você quiser, pode recorrer”, respondeu o juiz num tom arrogante. “Talvez ele analisou e concluiu que eu não disponho de condições financeiras para seguir o caso, ou seja, exigir justiça”, disse Sousa Joaquim. Por outro lado, o pai da vítima entende que o automobilista decidiu mover um processo contra o cidadão que ele próprio atropelou para não assumir as responsabilidades. No mesmo instante, Joaquim dirigiu-se à sala da Procuradora Provincial de Nampula, e foram-lhe indicadas as instalações do Instituto de Patrocínio e Assistência Jurídica (IPAJ) no sentido de pedir apoio jurídico. Por seu turno, o delegado do IPAJ, Jorge Ferreira, indicou um magistrado para seguir o caso de modo a anular a sentença.

A morte lenta e dolorosa

Desde o dia em que sofreu o referido acidente de viação, Sebastião de Sousa passou por momentos difíceis. O cidadão foi levado para o HCN, onde permaneceu na sala de reanimação durante 20 dias. Mais tarde, ele foi transferido para a Cirurgia II daquela que é a maior unidade sanitária da região norte do país. As análises médicas concluíram que Sebastião de Sousa havia contraído ferimentos graves na região do cérebro.

No dia 03 de Março, ele teve alta, embora não estivesse a sentir-se bem de saúde. Os médicos disseram que devia continuar a fazer o tratamento em casa e só voltaria ao hospital para fazer o controlo. Segundo conta o pai do malogrado, com o andar do tempo, a situação de saúde do seu filho agravava-se. Por isso, ele resolveu levá-lo de volta ao hospital. Porém, os cuidados médicos não evitaram a morte de Sebastião de Sousa. O finado era motorista de profissão. O @Verdade soube que, até à data da sua morte, o malogrado tinha três filhos. Porém, a sua esposa estava grávida e, no final da cerimónia do seu enterro, nasceu o seu quarto filho.

A história de Rosário

Rosário Paqueleque, funcionário do Conselho Municipal da Cidade de Nampula, e residente no bairro de Carrupeia, é outra vítima de acidente de viação cuja sentença proferida pela 1ª secção do Tribunal Judicial da Cidade de Nampula deliberou contra ele. O acto deu-se à sua revelia, uma vez que, na altura, ele se encontrava internado no Hospital Central de Nampula. Segundo explica o indivíduo, o acidente que o deixou sem uma perna ocorreu em Junho do ano passado, na Avenida do Trabalho, quando regressava à casa numa motorizada, após mais uma jornada de trabalho. Devido à intensidade do tráfego, um camião basculante da empresa Gabriel Couto embateu na parte traseira do motociclo, tendo o indivíduo caído e o veículo esmagou a sua perna esquerda.

O motorista do camião, apercebendo- se do crime que teria cometido, abandonou a viatura e pôs-se em fuga. Paqueleque foi levado para o hospital, onde ficou internado durante três meses. Na sequência deste acontecimento, uma agente da Polícia de Trânsito identificada apenas por Dina, afecta ao posto policial do HCN, sem se ter deslocado ao local do sinistro, instaurou um processo que teria sido encaminhado à Polícia de Investigação Criminal e, posteriormente, ao tribunal.

Rosário Paqueleque conta ainda que, durante os meses de Julho a Setembro, a empresa Gabriel Couto prestou apoio no que diz respeito a medicamentos e à alimentação. Ainda em estado de coma, no dia 07 de Setembro de 2013, a vítima foi notificada pela 1ª secção do Tribunal da Cidade de Nampula, nos autos de processo crime sumário número 666/13, a comparecer no dia 22 do mesmo mês para se proceder à audiência e ao julgamento.

“O oficial de diligência que trazia a notificação viu o estado em que me encontrava e disse à minha família que iria comunicar ao tribunal sobre o meu estado de saúde. Estranhamente, na referida data, o julgamento foi realizado à minha revelia e perdi a causa, alegando-se que cometi algumas irregularidades na condução, tendo sido multado no valor de 2.350,30 meticais para fazer face às custas judiciais. Não tive defensor e a empresa ficou impune”, disse agastado Paqueleque.
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