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Plural Editores desrespeita os Direitos do Autor

Há dois anos, o artista plástico moçambicano, Alexe Ferreira, desentendeu-se com a Plural Editores Moçambique. Em causa está a utilização da imagem da sua escultura, “Jinga, a última viagem para o céu”, na capa do livro da 9ª classe, sem a menção do seu nome. Houve conversações entre a instituição, que reconhece a infracção, e o artista. No entanto, até o momento, não se vislumbra nenhum acordo.

Em princípio, segundo explicação do pintor Alexe Ferreira, este assunto não se devia ter tornado uma contenda entre os envolvidos. Basta que se tenha em consideração que a primeira medida que o artista tomou – logo que se inteirou da infracção – foi (como orienta a Lei do Direito do Autor) exigir que a Plural Editores Moçambique reparasse o dano, o que não aconteceu.

Como tudo começou

Desde os princípios de 2000, “Jinga, a última viagem para o céu” – a referida criação artística – passou por diversas galerias de exposição de arte nas cidades de Maputo e Matola. Suspeita-se que numa das referidas instituições, um fotógrafo português, colaborador do Grupo Porto Editores, tenha obtido uma fotografia da obra.

A escultura que se encontrava no meio de (tantas) outras atraiu as atenções do pessoal da Plural Editores – na altura em que se procurava uma imagem adequada para a capa do manual da 9ª classe. Sem o conhecimento do autor da pintura captada (que em poucos dias seria exposta, através do livro, para o grande público) e, consequentemente, sem a sua autorização, o que não é legal, em Janeiro de 2010, a Plural Editores publicou a foto da escultura Jinga.

“Não querem resolver o caso de forma pacífica”

O que sucedeu, algum tempo depois do mesmo ano, é narrado – em discurso directo – pelo artista que se sente lesado. “Em 2010 descobri que a Plural Editores Moçambique publicou a imagem da minha obra de arte, “Jinga, a última viagem para o céu”, na capa do livro da 9ª classe da disciplina de Educação Visual. Vasculhei as páginas do manual, a fim de verificar se se havia mencionado o meu nome, como autor da criação, o que não encontrei”.

“Comprei três livros. Um para mim, outro para o advogado. Comigo levei o terceiro para a Plural Editores, com o objectivo de comunicar aos seus dirigentes sobre a infracção”.

“Na altura a instituição funcionava na Avenida 24 de Julho. Falei com a assessora que me aconselhou a voltar noutro dia a fim de que se apresentasse o caso ao director, Miguel Milheiro, com quem eu iria tratar o assunto. No entanto, passado algum tempo, quando retornei à editora eles haviam mudado de instalações para a avenida Patrice Lumumba, em Maputo”.

“Fiz pressão para que o caso fosse discutido. Eles não queriam atender-me. Com insistência acabei por conseguir manter um encontro informal com o director. Expus o caso, mas ele, como aconteceu com a sua assessora, foi arrogante. Expliquei-lhe sobre as consequências que poderiam surgir da infracção cometida – a não citação do nome do autor da obra – mas, não quis acatar as minhas queixas”.

“Entretanto, como a resposta do director da Plural Editores não ia ao encontro da minha expectativa, expliquei-lhe que a partir daquele dia eles iam tratar o assunto com o meu advogado”.

“O advogado que está a trabalhar em volta do caso elaborou um documento em que se explicava que – se não se observassem algumas cláusulas – em 15 dias, devia-se retirar os livros da praça, o que não aconteceu. No ano seguinte, continuou-se a vender o manual nas mesmas condições”.

“Criei a possibilidade de que houvesse mais um diálogo em torno do assunto, mas não quiseram que assim fosse. Nunca me apresentaram um argumento convincente. Não cumpriram com os critérios que nos podiam conduzir à resolução do problema de boa forma”.

Assunção da infracção

Sabe-se, porém, que de facto houve um encontro entre Alexe Ferreira e o director da Plural Editores, Miguel Milheiro, na cidade de Maputo. Ambos discutiram o assunto, mas, com o passar do tempo, – o problema não teve um desenvolvimento positivo e – as expectativas do artista foram goradas.

A editora assume a infracção cometida. Não expressa nenhuma objecção em mencionar o nome do autor na obra – nas futuras impressões do manual – mas, para aquela, é complicado retirar os livros do mercado num universo, até então, estimado em três mil cópias.

Paralelamente à suposta falta de diálogo entre os envolvidos, o pintor exigiu que se reabilitasse a sua casa e se construísse uma escola em benefício da sociedade. As exigências, consideradas absurdas, não foram materializadas. Em face disso, @Verdade questionou o artista sobre o que, efectivamente, reivindica.

“Reivindico a citação do meu nome – como autor da obra que serve de ilustração – na capa do livro da 9ª classe. Eles deviam ter-se baseado na Lei dos Direitos do Autor em vigor em Moçambique, ou na legislação universal porque o livro foi impresso em Portugal. As demais ilustrações patentes no manual têm referências dos seus autores. Por isso, penso que eles estão conscientes do erro que cometeram, mas preferem agir à margem da lei”.

A legislação moçambicana

No artigo 11 da Lei número 4/2001, de 27 de Fevereiro (sobre os Direitos do Autor), explica-se que é permitida a utilização de uma obra de arte em produtos destinados ao ensino – sem autorização nem pagamento de remuneração ao autor – mas obriga-se a que se indique o seu nome.

De acordo com o artigo 60 da mesma lei, sobre infracções dos direitos patrimoniais e sanções, estabelece-se, como princípio geral, o facto de que a sua infracção implica uma responsabilidade civil e criminal. Por isso, o ofendido pode recorrer ao infractor para que seja ressarcido. Caso não haja entendimento, este pode submeter o problema ao tribunal.

“Houve violação da Lei”

Em conversa com o @Verdade, o inspector do Ministério da Cultura, Arnaldo Bimbe, esclarece que a lei visa proteger o artista, o cientista ou o fazedor da arte no geral. Isso significa que as obras de arte devem ser protegidas em todas as circunstâncias. No entanto, a mesma possui algumas excepções. Por exemplo, o capítulo três fala sobre a limitação dos direitos patrimoniais, o que tem a ver com a reprodução da criação para fins privados.

Reconhecendo a existência, também, de aspectos ligados à reprodução de obras de arte para fins de ensino, Arnaldo Bimbe suspeita de que a Plural Editores se tenha baseado no referido princípio. De qualquer modo, mesmo que seja assim, “é preciso estar atento a um aspecto – é necessário que se indique a fonte. Se não se fizer a menção do nome do autor, então, viola-se a lei”.

Por isso, “na minha interpretação, neste processo, houve uma violação dos Direitos dos Autor. O artista pode recorrer a quem de direito para exigir que seja reposta a justiça, porque a editora não seguiu os orientações básicas dos Direitos do Autor”.

“Há agravantes”, Jaime Guambe

Por sua vez, o secretário-geral da Sociedade Moçambicana de Autores (SOMAS), Jaime Guambe, considera que a lei preconiza que para qualquer alteração ou utilização de uma obra de arte há necessidade de uma autorização do seu autor. Só o artista é que pode permitir a adaptação ou publicação da sua criação. Se não for por sua via, a permissão pode ser feita por intermédio da instituição que o representa como, por exemplo, um advogado ou a SOMAS.

Portanto, “está claro que houve violação dos direitos autorais. O que se pode negociar é a forma de compensação que é pecuniária. Ele, na qualidade de autor, podia ter exigido isso – é legítimo”.

É que “a menção do nome do autor de uma obra arte – sempre que for utilizada – é um direito inalienável. Trata-se de um direito que não prescreve. É eterno. Então, estamos diante de um caso de violação dos Direitos do Autor no sentido de que não houve autorização para a utilização da imagem da obra. Temos ainda uma situação que agrava a infracção – o facto de a fotografia aparecer amputada”.

Refira-se que a violação dos Direitos do Autor implica dois tipos de sanção – as cíveis “que visam o ressarcimento dos danos (em dinheiro), incluindo a parte criminal em que se alistam o crime de usurpação e a contrafacção”, explica Gwambe que acrescenta que “o desconhecimento da lei não exime da responsabilidade civil e criminal”.

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Uma resposta

  1. Prezados,

    As editoras estrangeiras violam sistematicamente, os direitos dos autores nacionais, porque nós não somos devidamente apoiados e protegidos nos nossos país (neste particular, em Angola). Sou autor de um modesto manual intitulado “Guia Prático para Pais e encarregados de educação”, considerado pela crítica, como sendo “Mais importante que a gasolina.”, (cf. http://www.googlo, Jornal Cultura angolana de 04 Julho de 2017). Depois de assinar um acordo com a Plural Editores “Licença para utilização da obra” (20 de Julho de 2018), num pack escolar à ser comercializado nos estabelecimentos de ensino. Vi o manual à ser vendido na rede comercial do Hipermercado “Candando” em Angola.

    Hoje, me questiono se, por ventura esta obra não está à ser comercializada em Moçambique, à titulo de exemplo ?

    Muito cordialmente,

    Fernando Santana

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