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Pessoas vulneráveis casam numa festa especial

Pessoas vulneráveis casam numa festa especial

Encontram-se em condição social vulnerável. Alguns são idosos e vivem maritalmente há 40 anos, outros são jovens e portadores do HIV. No último sábado, estes homens e mulheres contraíram o matrimónio num evento recheado de cor e alegria, organizado pelas Associações Hixikanwe e Luta Contra a Pobreza.

Além de ser um dia especial e de realização do maior sonho das suas vidas, o momento foi de mudança, porque inaugurou uma nova fase, segundo as palavras da maior parte dos nubentes ouvidos pelo @Verdade. “A partir desta data, a vida não mais será como antes, pois daqui começa uma nova página rumo a um futuro promissor e, acima de tudo, positivo”, afirmam.

 

Contando com a presença de diversas figuras, designadamente as ministras da Justiça, Mulher e Acção Social, bem como a esposa do presidente do município de Maputo, o evento teve a participação de trezentas pessoas e foi realizado num salão situado na avenida Timor-leste na baixa da capital do país. Para a Associação da Luta contra a Pobreza, realizar aquele casamento comunitário foi mais do que um desafio, pois tratou-se de uma primeira iniciativa.

Falando na ocasião, a ministra da Justiça, Benvinda Levi, elogiou a iniciativa e aplaudiu os noivos pela quebra do silêncio. O Governo apoiou, por via do Ministério da ustiça na formalização deslocando ao terreno um conservador e garantindo o não pagamento das taxas. Associação Hixikanwe Por seu turno, a Associação Hixikanwe, que organiza o evento pela segunda vez, diz ter sido um sucesso face ao primeiro que aconteceu no ano passado numa cerimónia que envolveu três famílias, das quais existiam idosos, deficientes e um alcoólatra.

Como no ano passado, este ano, os recém-casados vieram dos bairros suburbanos de Maputo e Matola e foram seleccionados aleatoriamente. No princípio, estava previsto que fossem 11 pares, mas um dos noivos perdeu a vida duas semanas antes. A ideia de organizar casórios, segundo fontes da agremiação, surge da necessidade de materializar os sonhos de várias mulheres vulneráveis e sem condições. Na língua local, o Ronga, Hixikanwe significa “Estamos Juntos”.

Como associação trata-se de uma pessoa de direito privado, sem fins lucrativos e de carácter social dotada de personalidade jurídica, autonomia administrativa e patrimonial, com sede na capital do país. Pelo que consta nos seus arquivos, a agremiação foi criada em 2007, legalizada no ano de 2008 e os seus estatutos publicados no Boletim da República n°13 III Série, de 13 de Abril de 2009. De lá para cá, as suas acções destinam-se à promoção de acções e estudos sobre o HIV/SIDA para contribuir na defesa dos direitos da pessoa portadora do vírus causador dessa doença. Promove, igualmente, acções que contribuam para a mitigação do sofrimento das crianças ?rfãs, velhos e viúvas vítimas da SIDA e faz campanhas de sensibilização e divulgação de métodos de prevenção e combate ao vírus, em benefício dos seus membros.

Neste momento, possui cerca de 1800 membros entre afectados e infectados pelo HIV a trabalharem em 23 bairros da cidade e província de Maputo, particularmente na Matola. Nos próximos tempos pretende expandir as suas acções para as próvincias de Gaza e Inhambane. Segundo a presidente, Judite dos Santos, neste momento está tudo a postos para a materialização desses planos. Para tal já estão posicionados alguns núcleos no distrito da Massinga e Xai-Xai, em Inhambene e Gaza, respectivamente. Na Matola, a Hixikanwe, trabalha com os núcleos locais, sediados nos bairros da Liberdade, Liqueleva, Boquisso, Postos Adisministrativos da Machava, concretamente nos bairros de São Damasso, Patrice Lumumba, Zona Verde, Ferreira e Posto Administrativo de Infulene, no T-3 e Infulene Unidade “D”.

No distrito de Marracuene actuam através do núcleo de Mumemo. Na capital do país, desenvolve actividades em coordenação com os vários nucleos espalhados pela cidade, designadamente nos bairros 25 de Junho “A” e “B”, Bagamoyo, Benfica, Inhagoia, N’Salene, Luis Cabral, Malhazine, Zimpeto, Hulene e Magoanine “C”. Judite dos Santos É membro fundador da Associação exercendo actualmente as funções de presidente. Segundo nos contou, a sua vida mudou desde 2006 quando perdeu a filha, o genro e a neta vítimas da SIDA. Algum tempo depois, numa noite, a 500 metros de casa, a irmã foi sexualmente abusada e abandonada no local por oito indivíduos desconhecidos. No dia seguinte – conta – a mulher rastejou sem roupa até a sua moradia onde foi recebida pelo próprio filho na altura com seis anos. Dali foi levada ao hospital, onde se descobriu que daquela violação teria contraído o vírus da SIDA.

Essa maré sucessiva de acontecimentos, segundo a fundadora da Hixikanwe, marcou profundamente a sua vida não só por ter envolvido familiares directos, mas também porque aconteceu durante meses seguidos. A partir daí, Judite dos Santos, passou a dedicar-se aos seropositivos promovendo palestras e falando sobre a sua experiência com as vítimas da SIDA. Foi incentivando as pessoas a fazerem o teste de HIV. Para tal recorreu ao Hospital de Chamanculo, todavia, ali encontrou dificuldades, a maoir parte das quais relacionadas com as demoras no atendimento, por isso procurou ajuda da organização Médicos sem Fronteiras e os testes passaram a ser efectuados na sua própria residência, onde também funciona a sede.

Até hoje, entre os mais de 1000 testes realizados, 580 apresentaram resultados positivos, incluindo 130 crianças das quais a mais nova tem 10 meses de vida. Dentre inúmeras insuficiências, designadamente a falta de recursos humanos, alimentares e uma sede condigna, a instituição dedica-se ao apoio de pessoas vulneráveis e seropositivas que aumentam dia após dia. Neste momento, conta com uma centena de colaboradores, na sua maoir parte mulheres a trabalhar nos vários núcleos dos bairros. Para Judite dos Santos, a vida na associação seria muito mais difícil ainda se não contasse com a ajuda do seu marido e de três mulheres, duas das quais viúvas e uma jovem solteira que no dia-a-dia lutam em prol das vitimas da SIDA.

Dessas senhoras destaca-se Argentina Macamo, seropositiva, que decidiu quebrar o silêncio assumindo a sua condição. Diz que já sofreu em grande medida a discriminação, mas quando integrou a associação recuperou o seu amor-próprio e hoje dedica a sua vida em prol dos outros. “Quando cheguei na associação pesava pouco mais de 40 quilogramas, mas hoje peso 90. Foi uma luta intensa, mas consigui, agora só vivo para os outros e sei que ter o HIV não é o fim”, conta. Igual a ela conhecemos outras mulheres, algumas que já estiveram entre a vida e a morte, mas hoje vivem activamente ajudando os outros a recuperar o seu estado de saúde.

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