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Os remédios para acabar com a cólera em Moçambique são: água potável e retretes com fossas sépticas

Os remédios para acabar com a cólera em Moçambique são: água potável e retretes com fossas sépticas

Foto de ArquivoDiz o povo que para grandes males grandes remédios, na província de Nampula a cólera causou já o primeiro óbito oficial de 2016. O surto não é novo, vem de Agosto de 2015 e dos mais de mil casos diagnosticados nove pessoas pereceram. “(…)Ele surpreendeu-nos queixando-se de fortes dores de barriga. Instantes depois já estava a vomitar e com muita diarreia. Às 15h30 tratamos levar-lhe ao hospital de mota mas infelizmente ele fugiu-nos (morreu) antes de chegarmos na unidade sanitária.” Mais do que campanhas de sensibilização para o povo aprender a lavar as mãos e a defecar, ou de distribuição de produtos de purificação da água imprópria para o consumo humano, é responsabilidade do Estado garantir o acesso à água potável, de preferência canalizada, e casas de banho com retretes ligadas a fossas sépticas a todos os moçambicanos, afinal há dinheiro para gastar com brinquedos de guerra, casas oficiais de dirigentes e carros novinhos em folha!

“Porque somos um Governo sério e acometido com a causa do povo não nos podemos dar ao luxo de deixar perder-se uma única vida quando podemos fazer alguma coisa para salvar esta vida”, comprometeu-se o Presidente Filipe Nyusi em Fevereiro de 2015, no auge do surto de cólera passado.

Um ano depois o @Verdade não conseguiu encontrar uma única casa em Nampula que tenha sido construída pelo Executivo de Nyusi para o povo em material convencional (entenda-se casa com paredes em blocos de cimento e cobertura de laje de betão, telha ou lusalite), que tenha água potável canalizada e uma retrete conectada a uma fossa séptica.

Imaginamos que talvez tenha sido por falta de fundos, afinal 2015 foi um ano “atípico”. Porém olhando para os poucos concursos público que vão sendo publicados nota-se que dinheiro para o conforto dos governantes não falta, por exemplo estão a ser gastos mais de 53 milhões de meticais na construção de uma única residência para o administrador de Molumbo – é verdade existe mesmo esse Distrito na província da Zambézia, até há pouco mais de uma ano não passava de um posto administrativo.

Outra amostra que disponibilidade financeira para luxos não falta são os mais de 3 milhões de meticais que estão a ser pagos para apetrechar as residências oficiais de dirigentes do Tribunal Supremo, ou os mais de 250 milhões de meticais que o Ministério da Economia e Finanças está a gastar na compra de 95 viaturas de luxo ou mesmo os mais de 16 biliões de meticais investidos no Ministério da Defesa quando se afirma (e reafirma) que a Paz é prioridade em Moçambique.

Em Mutauanha são raras as famílias que não tenham tido doentes de diarreias

O que é fácil encontrar na cidade de Nampula, tal como em outras zonas urbanas e rurais da chamada pérola do Índico, são agregados familiares como o de Ângelo Muaprato que com a esposa e cinco filhos habitam uma casa feita com paredes de adobe e coberta de capim no bairro de Mutauanha, um dos que mais contribui com doentes e até tem um Centro de Tratamento da cólera próprio onde estão internados 22 pacientes, doze dos quais com o vibrião colérico.

Foto de Júlio PaulinoNeste bairro do subúrbio da maior cidade do Norte de Moçambique não há água potável canalizada nem saneamento básico e por isso Ângelo, assim como a maioria dos residentes de Mutaunha, abastece-se de água de poços não seguros e de riachos que existem nas redondezas. Estas fontes não seguras abastecem mais de 55% dos cidadãos na província de Nampula, de acordo com o recente Inquérito sobre o Orçamento Familiar(IOF), realizado pelo Instituto Nacional de Estatística.

A família Muaprato não ignora os riscos associados ao consumo de água imprópria. Há duas semanas um sobrinho, Soares João, começou a queixar-se de fortes dores de barriga e algumas horas depois vieram os vómitos. Nesse mesmo dia o jovem de 17 anos de idade foi levado ao Centro de Saúde 25 de Setembro onde recebeu tratamento médico e, depois de sentir-se melhor, teve alta e regressou a casa da família. Porém no dia seguinte voltou a sentir as fortes dores de barriga, os vómitos voltaram e desta vez teve diarreia aguda. Faleceu de regresso ao hospital.

Para garantir a boa saúde da família a esposa de Ângelo quando os rendimentos permitem comprar água potável, caminha cerca de quatro quilómetros a pé até uma zona onde é possível ter acesso ao precioso líquido potável. É preciso madrugar pois a água só jorra entre as 4 e 6 horas da manhã e cada bidão de 30 litros custa 7 meticais, por isso só dá para comprar dois bidões por dia.

A casa de banho desta família fica no exterior da residência, dá para ver o sol e as estrelas porque não é coberta e as paredes são forradas de capim. O local onde se fazem as necessidades, menores e maiores, é um buraco de 2 a 3 metros coberto por paus de bambu. Ter uma latrina melhorada é um sonho para este chefe de família, de 37 anos de idade, que trabalha como guarda e aufere menos de 4 mil meticais por mês.

Ângelo recorda amargurado que alguns dias após a morte do seu sobrinho a filha de 7 anos de idade também foi acometida de diarreia forte. Após quatro dias internada no no Hospital Central de Nampula restabeleceu-se.

O drama da família Muaprato repete-se na zona do piloto do bairro de Mutauanha, e em várias outras regiões de Moçambique onde as diarreias e a cólera são uma constante todos os anos alheias à retórica dos sucessivos Governos do partido Frelimo.

“Hoje sabem-se as causas, como se relacionar com a cólera e nós alguma coisa temos de fazer e com antecipação para contornar o problema” prometeu Nyusi no encontro de Fevereiro de 2015 com um denominado grupo de emergência contra a cólera. No país real só o sector de saúde é que tem mostrado serviço depois do vibrião atacar.

Por isso mais do que apelarem aos cidadãos para lavarem as mão e distribuir purificadores de água, como se os moçambicanos não tivessem consciência dos males que enfrentam diariamente, é preciso criarem-se as condições para que o povo possa lavar as mãos e fazer as suas necessidades com segurança e dignidade. A prevenção da cólera deve ser feita através de investimentos na habitação, acesso a água potável e saneamento.

Artigo escrito com recolha de Leonardo Gasolina

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