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Organização africana faz 47 anos e intelectuais defendem recuperação da autoestima popular

A Organização de Unidade Africana (OUA) completa esta terça-feira (25/5) 47 anos de criação. Do ponto de vista político, o ato é considerado um dos mais marcantes para o fortalecimento dos movimentos pela independência nos países africanos. Em 25 de maio de 1963, 32 estados já independentes assinaram em Adis Abeba, capital da Etiópia, a carta que criou a organização. A data é celebrada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o Dia da África.

A entidade existiu até 2002, quando foi dissolvida e deu lugar à União Africana, que congrega 53 dos 54 países do continente – Marrocos afastou-se m 1985, em protesto pela admissão da autoproclamada República Árabe Saharaui, reconhecida pela OUA em 1982.

Hoje em dia, a África tem aproximadamente 30 milhões de quilômetros quadrados e mais de 800 milhões de habitantes vivendo em 50 repúblicas presidencialistas e três monarquias – Lesoto, Marrocos e Suazilândia. Cerca de 63% da população africana vivem no campo, e a agricultura é a base da economia de muitos dos países. Por isso, o Produto Interno Bruto (PIB) da África corresponde a apenas 1,9% do total global e o continente participa de apenas 2% das transações comerciais internacionais.

Sozinha, a África do Sul perfaz um quinto do PIB do continente. Pelos dados do Banco Mundial, quase metade dos africanos vive com menos de US$ 1 por dia, padrão de pobreza absoluta. Segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), cerca de 300 milhões de africanos passarão fome este ano.

No continente estão dois terços dos portadores de HIV/AIDS, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). Mesmo com tantos problemas, há sim o que comemorar, diz o diretor do Centro de Análise Política da Universidade Eduardo Mondlane, Gerhard Liesegang. Alemão, ele vive em Maputo, capital de Moçambique, há 40 anos. “Não se costuma ver o progresso que a África está a fazer, apesar de vários países terem governo corruptos”, afirma o professor, com sotaque alemão, carregado nos “erres”. “E a maior mudança é dentro das mentes dos africanos, que transformam suas experiências em novas escolhas”, afirma Liesegang.

Para a produtora cultural Tina Mucavele, uma das organizadoras da Semana de Identidade Africana, que vai até sexta-feira (28) em Maputo, é fundamental recuperar a autoestima do povo africano. “A colonização nos deixou uma identidade de povo oprimido, apologético, sem confiança, que está sempre a pedir algo ou desculpas.” Mas, de acordo com ela, “essa não é a característica humana das pessoas da África. É uma marca social que acabou imposta pela nossa história.”

Uma das atrações mostradas na Semana de Identidade Africana foi o documentário Motherland (Terra Mãe), do cineasta alemão e negro Alik Sharadah. No filme, diversas personalidades sugerem que o rompimento com os padrões exigidos pelo mundo globalizado podem ser a saída para a África. O documentário ressalta que, em cerca de 300 anos, 40 milhões de africanos foram levados como escravos para gerar lucros na Europa e na América. Mostra também que muitos de seus países resultam de divisão feita pelos colonizadores para explorar riquezas, sem levar em conta aspectos culturais ou étnicos.

O filósofo moçambicano Severino Nguenha acha que o processo de independência ainda não se consumou. “Somos independentes, um grande avanço em si. E isso é inegociável. Mesmo que a independência ainda não tenha se transformados em liberdades plenas e concretas para os indivíduos”, afirma o bacharel em teologia, doutor em filosofia e professor da Universidade Lausanne, na Suíça. “Temos problemas muito sérios em todos os países africanos, mas é inegável que, em 47 anos, houve progressos enormes, como o acesso à educação, “muito superior ao que tínhamos antes da independência, aqui em Moçambique, por exemplo”, destacha Nguenha.

A atriz Lucrécia Paco, que também apresenta-se na Semana da Identidade Africana, acredita que as virtudes e as possibilidades africanas fortalecem a busca interna por saídas para os problemas. “Fomos feitos pobres, não somos pobres”, afirma Lucrécia. “O futuro está em África e devemos dizer isso. Daqui muitos foram levados para enriquecer o Primeiro Mundo. E neste momento é preciso voltar lá atrás.” Nguenha concorda com a atriz. “As soluções africanas virão de um pensamento endógeno”, defende ele. “As estratégias para solução dos problemas devem ser firmemente ancoradas no próprio continente africano.”

O filósofo cita o autor francês Victor Hugo para justificar sua confiança: “’as utopias são a verdade do amanhã’. Foi com muito esforço que saiu-se da escravatura. Com muito esforço saiu-se do colonialismo. É com ainda mais esforço que podemos encontrar um caminho em direção a um desenvolvimento que tem que ser africano. Não tem que ser nem americano, nem europeu.”

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