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O valor da prisão

Custódio Duma empossado como presidente da Comissão Nacional dos Direitos Humanos

O valor que o Estado moçambicano desembolsa para manter um indivíduo na prisão é superior ao actual salário mínimo a nível dos nove sectores de actividade económica do país. Perante este cenário, Custódio Duma, advogado de Direitos Humanos, defende a ideia de penas alternativas à prisão, enquanto o jurista Amosse Macamo é da opinião de que os indivíduos devem ser punidos pelos seus crimes de acordo com a lei.

Um prisioneiro custa ao Estado um pouco mais de 4 mil meticais por mês, ou seja, três vezes mais o que um indivíduo honesto aufere em troca da sua força de trabalho nos sectores de extrema importância para o desenvolvimento socioeconómico do país, como é o caso particular da agricultura.

 

Actualmente, em todo o território nacional, há cerca de 14 mil prisioneiros, o que significa que Moçambique gasta mensalmente 56 milhões de meticais para suportar toda a máquina prisional, além de todo o processo até se chegar às instalações prisionais. Na visão do advogado Custódio Duma, o montante despendido mensalmente pelo Estado para sustentar os reclusos poderia servir para a construção de escolas, o melhoramento do sistema de educação e de infra-estruturas.

“Não se justifica o facto de o Estado continuar a suportar grandes custos com um cidadão que cometeu um crime que pode ser punido com a prestação de serviços às comunidades, tais como manter a cidade limpa, cuidar de jardins, trabalhar na construção de estradas, entre outras actividades”, comentou, tendo acrescentado ainda que as penas do género poderão causar um certo desconforto ao criminoso e até inibi-lo de cometer outros crimes. “Ora vejamos: eu cometo um crime e, em lugar de ficar preso, põem-me a trabalhar de motorista ou ajudante nas obras de construção de uma infra-estrutura.

Como advogado, esta punição poderá causar-me enorme amargura e certamente vai inibirme de cometer novamente o mesmo crime ou outro”, exemplificou. Além disso, Duma afirmou que a prisão em Moçambique é uma instituição falida, visto que já não consegue cumprir com os objectivos para os quais foi instituída, a exemplo da ressocialização do indivíduo.

“Há muitas pessoas que, quando saem da prisão, saem piores do que entraram, uma vez que aprenderam a consumir e traficar drogas e a dirigir assaltos, ou seja, na prisão o indivíduo forma-se para o crime”, disse. Segundo Custódio Duma, o país está em condições de criar campos de reclusão abertos onde os prisioneiros, ao invés de estarem confinados, deviam ser levados a trabalhar nas machambas, fábricas, em carpintarias ou serralharias, e a produzir alimentos para eles mesmos assim como para a sociedade. Para o advogado, os outros fins para os quais as penas de prisão são projectadas, acabam não servindo porque os cidadãos não cometem o crime devido ao medo de ir para a cadeia, mas porque sabem que é uma situação complicada para si e para a sua família.

“Não digo que devemos eliminar as prisões hoje ou amanhã, mas à medida que temos mais tecnologias, mais conhecimento, temos mais possibilidades de controlar as pessoas”, observou. Pelo facto de haver exemplos de penas abolidas no país, como são os casos da pena de morte e desterro, Duma acredita que as penas de prisão deixarão de existir não só em Moçambique. “Os países mais desenvolvidos já se aperceberam de que a prisão só cria problemas”, comentou. De acordo com aquele advogado, o Estado ainda não se apercebeu dos custos e os problemas que a prisão acarreta, não por uma questão de ignorância ou falta de vontade política, mas porque a prisão continua a ser uma regra em Moçambique e há receios em mexer e assumir este assunto por se tratar de um Estado que anda a reboque dos outros.

“Se esta ideia partir de Estados que financiam os nosso programas de desenvolvimento, o nosso país vai começar a reflectir sobre isso, no sentido de garantir mais direitos humanos às pessoas”, afirmou.

Visão contrária

Reconhecendo que o dinheiro que o Estado gasta com um recluso é superior ao salário mínimo de um cidadão comum, o jurista Amosse Macamo diz não concordar com a ideia de eliminação das prisões porque se trata de uma instituição importante do ponto de vista de segurança e prevenção geral, uma vez que o homem tem por natureza a tendência de violar as regras pré-estabelecidas. “Existe a lei e ela é para ser cumprida. E é preciso continuarmos a ter as prisões para restaurar a ordem social violada”, defendeu Macamo tendo ainda afirmado que as cadeias não devem ser um lugar onde se guardam todos, culpados e inocentes, mas sim os verdadeiros culpados. Para aquele jurista, embora em parte não cumpram o seu papel, as prisões não são instituições falidas enquanto instituições válidas.

“Quando se coloca a questão da falência da prisão é normalmente em situação de prisão irregular, em que um indivíduo que deveria cumprir uma pena alternativa não cumpre e continua numa situação de prisão”, disse. Segundo o jurista, a prisão cumpre o seu papel na medida em que está preso o indivíduo que merece. Ele afirmou ainda que falar de penas alternativas é abordar o campo da reforma ou da revisão da lei que neste momento é desnecessário porque o país dispõe de um dispositivo legal que se for aplicado de forma eficiente e eficaz poderá contribuir para a redução da população prisional em 50% e, consequentemente, a despesa do Estado.

“Se olharmos para a actual situação concreta do país e usarmos os recursos humanos de que dispomos, poderemos reduzir a situação prisional”, comentou. Na opinião de Amosse Macamo, apenas as pessoas com crimes puníveis até seis meses ou um ano, não representando perigo para a sociedade, é que deveriam cumprir as penas em liberdade pois seria menos oneroso para o país. “O cumprimento da pena em trabalhos comunitários depende da evolução da própria sociedade e muitas vezes o que leva à prisão dos indivíduos é a pressão social ou a pré-condenação que se faz por parte da sociedade, da polícia, dos juízes e dos procuradores”, salientou.

“Hoje quando se vai à prisão olha-se para ela como se se estivesse a entrar numa escola de crime, porque os indivíduos de menor perigosidade passam a conviver com os de maior, com todos problemas que daí podem advir”, observou e refutou a tese de que um indivíduo instruído e que tenha sido privado por muitos anos da sua liberdade possa sair da prisão mais propenso ao cometimento de crimes mais violentos

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