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O Urbi et Orbi de Obama

O Urbi et Orbi de Obama
Fantástico! Extraordinário! Inolvidável! Estes são, talvez, os melhores adjectivos para caracterizar o discurso e o ambiente que se viveu no passado sábado no Parlamento do Gana aquando da visita do Presidente americano Barack Obama. Ao vermos a democracia plena daquela sala magna apercebemo-nos do quão longe está dela, direi, em 90% dos países africanos. Em Acra, tal como em Washington, todos os ex-chefes de Estado vivos marcaram presença, desde Rawlings passando por Kufuor até ao actual Mills. E, sabendo-se de que já foram sérios adversários, mais valor tem que se dar. Com esta atitude todos revelaram alto sentido de Estado. 
Por cá, já nem me lembro de ver os mais altos responsáveis do Governo e da oposição juntos numa cerimónia. Nem o 4 de Outubro, Dia da Paz, é celebrado em conjunto. Isto só prova que não basta haver eleições de quatro em quatro anos para um país ser considerado uma democracia. A democracia, tal como uma planta, tem de ser semeada, regada e amparada para que crie raízes fortes. Posteriormente, numa fase já bem avançada, colhem-se os seus ensinamentos.
Mas nada disto se faz de um dia para o outro. Cá, provavelmente, nem uma visita de Barack Obama faria coabitar no mesmo espaço o mais alto responsável do Estado e o líder da oposição. Azar para nós que, com atitudes destas, vamos ficando sempre para trás. 
Anualmente, pelo Natal e pela Páscoa, o Papa, numa tradição secular, proclama um discurso chamado Urbi et Orbi, expressão latina que em português traduz-se: Para a Cidade – neste caso Roma – e para o Mundo. Esta cerimónia tem em vista abençoar o mundo católico. No Gana, Obama fez igualmente o seu discurso Urbi et Orbi. E se a Urbi de Obama foi Acra, a Orbi foi África. 
Não foi por acaso que Obama escolheu o Gana para se estrear nas lides africanas. Ao reconhecer o sucesso da democracia neste país enviou um recado subreptício aos outros países como que a dizer: sejam mais ganenses! Isto é, sejam menos corruptos, sejam menos tribalistas, sejam menos despóticos, sejam menos mafiosos, sejam menos arrogantes, sejam menos comissionistas nos negócios com o Estado, sejam mais transparentes, mais dialogantes. Deixem de culpar o colonialismo pelo estado dos vossos países.
Não foi a Inglaterra que criou Mugabe nem al-Bashir, nem os massacres no Darfur, na Libéria ou na Serra Leoa. Não foi a Itália que criou a inexistência do estado na Somália nem a França Lansana Conté na Guiné-Conacri. O Ocidente não é responsável pelo enfileiramento de milhares de crianças em guerras sem sentido para defender ditadores e chefes tribais. São os africanos que têm de tomar em mãos o destino do seu próprio continente.
O Ocidente pode oferecer todo o tipo de ajudas mas são os africanos que as devem administrar de modo a que estas cheguem aos milhões de homens, mulheres e crianças que não têm água ou electricidade, que palmilham dezenas de quilómetros porque não têm dinheiro para pagar o transporte para ir ao hospital ou à escola, deixando os jovens na eterna ignorância. “Vocês (africanos) é que têm de fazer a vossa revolução”, disse. 
Estes conselhos são transmitidos por um negro, filho de um queniano que foi pastor de cabras e que hoje é Presidente da maior potência do mundo. Desta vez talvez alguém o oiça. Nem que seja por essa razão.
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