Muito recentemente, Maputo – a cidade de todos nós – colheu a publicação do Sofrimento, um vídeo musical que associa os conceituados músicos moçambicanos, Stewart Sukuma e Neyma Alfredo para refutar os efeitos perversos de conflitos armados…
Na verdade, a música faz parte do trabalho discográfico da Neyma Alfredo publicado já há bastante tempo. É uma obra de arte em que a literatura, o canto, a arte visual se mesclam para – num sentido maniqueista, contrapondo a guerra e a paz – não somente colocar a nu a miséria que os conflitos alojam na terra, mas acima de tudo apelar pela paz.
No referido vídeo, em uníssono, os artistas colocam a nu – para os habitantes da terra – a miséria, a degradação, os flagelos que derivam da fome, da má nutrição muitos dos quais originados e animados por conflitos armados.
Para enfatizar – como dissera o filósofo, jornalista e escritor francês, Albert Camus, que “a paz é a única batalha que vale a pena travar”, na sua comunicação agregada ao filme consideram:
“Globalmente, as pessoas mais inocentes morrem mais nas guerras hoje, do que os combatentes. Especialmente em África, as crianças já não são mais vítimas inocentes. Elas são alvos, são forçadas a testemunhar a violência horrenda e até mesmo manipuladas para realizar maldades tornando-se em armas e vitimas da guerra. A violência eliminou, destruiu crianças inocentes, jovens sonhadores, separou famílias e só trouxe dor e revolta.”
Estas e outras razões levaram-nos a considerar que, de facto, “é preciso eliminar a violência, não só das guerras mas também dos corações”.
Açoitar os inculpes
Em conversa com @Verdade, Neyma Alfredo considerou que temos muitas crianças não só em Moçambique, mas no mundo inteiro – vivendo com HIV, crianças mal-nutridas, vivendo em ambientes de guerra, outras ainda, são órfãs – que, certamente, precisam de muito apoio.
No entanto, o mais preocupante é que, para Neyma Alfredo, os problemas que açoitam os menores – a guerra, por exemplo – “não vêm por si. É causada por nós, os adultos”. Pior ainda, “a gente acaba esquecendo que a criança é inofensiva, que não tem noção do que está a acontecer. No fim de tudo, ela é que acaba pagando com todos os males que afectam o mundo”, diz.
Sofrimento em tempo de festa
Como é evidente, a última semana de Dezembro instala-no no mundo momentos de festa. E, Moçambique entra no mesmo clima. Ainda que nalguns lugares – que não são poucos – as bolsas de fome queiram-se fazer da regra.
Neyma Alfredo considera que este momento festivo afigurou-se apropriado para a publicação do seu trabalho – recorde-se o Sofrimento – acima de tudo, porque “é uma oportunidade para a gente se consciencializar. Espero que se acate esta mensagem”, realça.
Recorde-se que o vídeo Sofrimento faz parte do álbum Idiomas e, por isso, já possui mais de duas versões. De qualquer modo, “entendi que todos ainda não estavam a altura de transmitir a minha mensagem, como eu queria”. Por isso, “reproduzi-no, novamente”.
Refira-se que nas versões anteriores do vídeo em alusão, reunia-se um conjunto de um conjunto de imagens agressivas e, até certo ponto, chocantes. E, contrariamente à actual, não se tinha uma voz infantil. Mas, de uma ou de outra forma, “a maior diferença é que senti a necessidade de fazer algo a mais pelas crianças”.
Pensar de forma essencial
A conversa que travamos com a Neyma Alfredo – esta artista com uma carreira em constante progresso – conferiu-nos uma dimensão sobre pensar e agir de forma essencial. Por ser mãe, Neyma mostra-se cada vez mais sensível à causa da criança. Não que antes não o fosse.
Basta reparar no seguinte, para compreender o tipo de pessoa em que a artista se está a tornar: “Sou mãe e tenho crianças que agora consomem de forma desnecessária. Por isso, tenho lhes chamado atenção para que saibam que – no mundo – existem crianças que não têm possibilidades, que passam fome. Ou seja, mobilizou-lhes para que tenham um crescimento e personalidades adequados a partir da família”.
A autora do “Alirhandzo” revela-nos que sente que “caso nós, os pais, não começarmos este exercício de educação dos filhos a partir de casa – as crianças acabarão crescendo com um comportamento desviante”. Como tal, “é preciso que a paz seja cultivada a partir do núcleo da sociedade, a família”.
Afinal, ao que tudo indica, “não é apenas com o calar das armas é que teremos a paz. Ela – a paz – é interior, parte do nosso ego, da família e, sobretudo, da nossa educação”, diz encerrando em seco.
Fazer respeitar os direitos da criança!
Fazer respeitar os direitos da criança, perpetuando o clima da paz é o alvo mais nobre que na sua intervenção, o compositor e intérprete moçambicano, Stewart Sukuma, reiterou que se alcance com o vídeo Sofrimento, assim como com os demais da mesma natureza.
“Sempre lutei para que a a educação fosse o pilar dessa mudança social que todos os dias perseguimos e, muitas vezes, não encontramos. O meu problema não é que todas as crianças tenham uma educação, mas que elas tenham a educação certa”, diz.
Até porque – no entender de Sukuma – foi uma grande vitória para nós que depois da independência se tenha construído mais escolas e formado muitos professores. No entanto, o problema é que sinto que hoje – 36 anos depois da independência – nós devíamos investir mais na forma como educamos as nossas crianças.
“Houve muita coisa que nós ganhamos depois da independência, mas que depois se foi diluindo. Se calhar seja o tempo de o país pensar – em conjunto com todas as organizações que lutam pelos direitos humanos – para criar um plano exequível no sentido de eliminar os aspectos nocivos no processo do nosso desenvolvimento”, reitera para terminar dizendo que “só haverá paz efectiva se a luta pela educação da criança for o nosso objectivo”.
Melhorar a situação da criança
Ainda que, de certa forma a mulher e a criança serem dois elementos que nos últimos anos – nesta sociedade moçambicana – têm sido mais favorecidas em termos de instrumentos legais de defesa e protecção, bem como de programas de promoção de seus direitos humanos, a sua situação revela-se ainda caótica e preocupante. A criança continua a ser abusada.
É neste prisma que no contexto dos trabalhos que têm sido feitos – por Organizações Governamentais e Não – o representante do UNICEF em Moçambique, Roberto de Bernardi considera que “a expectativa é que – a longo prazo – a situação da criança melhore no país”.