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O que conta não é o mote

Até pode ser o mote a marcar os passos que iremos dar a seguir. Mas depois do primeiro degrau as pessoas querem ver como é que vamos terminar. E existem aqueles que pensam que o que conta não será propriamente como as coisas começam, mas como é que elas acabam. Ou seja, Alex Dau e Sérgio Simital deram os primeiros passos.

De uma jornada que será permanentemente suportada pelas letras. Assim, há perguntas estúpidas que por vezes nos dão prazer fazer, como, por exemplo, “estás satisfeito com a publicação do teu livro”? Alex Dau respondeu com sarcasmo, fazendo-nos lembrar as palavras desse gigante indiano chamado Mahatma Ghandi: “pode ser que a tua pergunta até faça sentido porque há homens que se sentem mais felizes estando na cadeia – segundo Mahatma Ghandi – do que estando cá fora”.

Dau lançou recentemente a sua primeira obra, “Reclusos do Tempo”. Um título que ele explica como sendo o resultado de uma longa espera. “Foi muito difícil trazer este livro a público, por causa das peripécias que temos de empreender para encontrar alguém que nos dê apoio financeiro para a realização de um sonho sagrado que é publicar um livro”. Alex Dau sentia-se como que estando numa espécie de clausura, enquanto esperava por uma “mão”, mas também foi bom, porque na “prisão” amadureceu algumas coisas. “Veja só que alguns contos que faziam parte do projecto inicial foram sacrificados em benefício de outros, segundo a minha opinião, melhor elaborados”.

“Reclusos do Tempo” será um livro de contos, de um escritor que começa a sua trajectória como poeta, tendo mais tarde percebido que será na prosa onde se vai sentir mais confortável. E de todos os seus textos até aqui burilados, pelo menos os que foram seleccionados para o livro, apaixonou-se mais por este que dá título à obra. A chuva caía rigorosa e implacável. De tempo a tempo, o vento fazia uma investida, e derrubava uma árvore, um tecto de palha, ou mesmo uma palhota.

Também machambas eram engolidas pela investida. Depois vinha uma trégua que permitia às vítimas recolherem os seus bens, que haviam ficado a mercê do vendaval. No segundo dia, o céu cinzento engolia o sol, deixando a terra mergulhada numa misteriosa escuridão enquanto a manhã ficava incerta. Alex Dau transporta-nos, através do conto, de uma realidade tradicional para a ficção. A trégua dada pelos espíritos era para procederem ao funeral de Makene e realizarem o ritual de oferecimento que os ancestrais exigiam para que a vida em Duanga voltasse à normalidade. A fome que assolava a região não deixava alternativa que não fosse buscar auxílio nas autoridades administrativas.

“Recluso do Tempo” é um conto que começa de uma forma trágica. Metamorfosea-se, chamando a intervenção dos espíritos, que vão lutar para trazer a paz e fartura à terra devastada, como agora em que podemos ler: O corpo de eruditos, agora sem o comando do régulo, começava a desesperar. Tiveram mesmo que recorrer aos bons préstimos de um curandeiro de confiança. O mau sinal dado pela posição adquirida pelos objectos do curandeiro fez com que o grupo fosse a casa do Buzueque. A liberdade do régulo só foi conseguida, quando o curandeiro, auxiliado pelo espírito de Makene, se aproximou da cabana de Buzueque, queimando um incenso que deixou o bicho atarantado.

A víbora precipitou-se então em direcção a Ozias que acompanhava o grupo, e este, perante o flagrante, precipitou-se numa fuga. O réptil perseguiu-o, alcançou-o e ferindo-o de morte. O mukutto recomeçou, o céu reabriu, o sol foi espreitando gradualmente, emitindo seus raios de luz dourados, que se reflectiam nas dentaduras encardidas dos Duanganas, que sorriem felizes. Zé, O Talentoso Vagabundo Outro livro também há pouco tempo lançado, em Maputo, é esse mesmo: Zé, O Talentoso Vagabundo. É um romance que tem como figura principal um ex-menino de rua, que usa todas as forças a seu favor e a fé para lutar e vencer. Depois de passar por um infantário, Zé conhece um escultor vagabundo, que as vicissitudes da vida fizeram com que passasse a ser um habitante da rua.

Os dois estabeleceram uma relação muito forte, ao ponto de os conhecimentos do vagabundo passarem para o miúdo, que aprende as coisas com bastante entrega, usando todo o talento que tinha. Mas o mestre morre quando Zé tinha apenas onze anos de idade. A morte desse homem podia parecer, à primeira vista, o traçar de um horizonte negro para a pequena criatura, contudo, enganaram-se todos aqueles que assim pensaram. Zé queria continuar a viver e tornou-se, ele também, um arauto da fé. Porque enquanto houver fé, a vida não vai parar. Do primeiro ao trigésimo primeiro dia do mês de Agosto, um automóvel dos Serviços de Comunicação Social do Município vagueou pela cidade anunciando a abertura de candidaturas para o Primeiro Concurso Municipal de Escultura, que teria lugar no Centro Cultural do Município de Maputo (CCMM).

Quando a notícia chegou aos ouvidos de Zé Vagabundio, a ideia que teve foi a de levar Ndzio gô para o CCMM. Mesmo julgando a sua obra sem qualidade por ter sido feita num momento de dor e tristeza e, como se não bastasse, por se encontrar numa segunda montagem, depois da colisão que sofreu a oito de Março de 2002, não se deixou dominar. Preferiu levá-la como forma de homenagear o seu honrado mestre e companheiro de infância e, acima de tudo, para contar ao público a sua triste biografia, uma vez que uma das cláusulas do regulamento dizia que a classificação, para além da própria escultura, teria em conta os motivos que levaram o artista a esculpir a sua obra.

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