Os jovens e as crianças estão a aprender as habilidades necessárias para conseguir emprego na economia de Megaprojectos em expansão em Moçambique?
Esta é provavelmente a pergunta de uma geração, ou talvez de duas gerações. Em 2013, mais crianças frequentam o ensino primário em Moçambique do que nunca, mas não aprendem muito e quando não se está a aprender, não se está a preparar para a força de trabalho, ou para dar um contributo à sociedade. Na terceira classe, as crianças das escolas primárias públicas moçambicanas não aprendem quase nada em termos de leitura, escrita e aritmética.
Elas avançam semi-automaticamente num sistema escolar se conseguirem ocupar uma carteira ou, para muitos, um lugar debaixo de uma árvore. A proporção da população que reivindica a “alfabetização” técnica com base em inquéritos internacionalmente reconhecidos, como é o caso do Inquérito de Indicadores Múltiplos (MICS) do UNICEF está a aumentar, mas em números absolutos, há mais pessoas analfabetas em Moçambique do que havia na altura da assinatura dos Acordos de Paz de Roma.Mesmo que, com base na alfabetização inicial, por exemplo, esteja a aumentar o número de pessoas que consegue ler uma manchete de jornal, a prática de ter e usar materiais de leitura, de ler regularmente o jornal e de ler livros ou até mesmo artigos de jornais mais longos e de revistas como este não está.
Os jovens e as crianças em Moçambique têm muitas dificuldades de ler textos do nível de terceira classe, e quando se tem dificuldades com alguma coisa, geralmente a tendência é evitá-la dentro e fora da escola e no trabalho. As crianças e os jovens de Moçambique que estarão à procura de emprego na próxima década simplesmente não estão a aprender a ler a um nível suficientemente alto que os ajude a encontrar emprego num mercado onde existem boas oportunidades.
E de onde se obtém essas informações negativas sobre o baixo desempenho da aprendizagem em Moçambique?
Na verdade, Moçambique foi o único país dos 15 nas últimas duas avaliações da leitura e de matemática realizadas em 2000 e 2007 pelo SACMEQ – Southern and Eastern Africa Consortium for Monitoring Education Quality (Consórcio da África Austral e Oriental para a Monitorização da Qualidade da Educação) que registaram uma deterioração nas notas de matemática e leitura a nível da sexta classe.
Além disso, a Fundação Aga Khan, um amigo de há longa data e dedicado aos jovens, crianças e famílias moçambicanas na área de desenvolvimento de base comunitária, realizou um estudo bastante simples em 2009 e constatou que 59 por cento dos alunos da terceira classe em 50 escolas estudadas em Cabo Delgado não conseguiam reconhecer as letras.
Os alunos da terceira classe que conseguiram ler um texto articulado foram, em média, apenas capazes de ler cinco palavras por minuto. Relacionado com a gestão escolar, a Fundação Aga Khan constatou que, devido ao absentismo, às taxas de frequência dos alunos reduzidas e outras questões de gestão, as 50 escolas do estudo se limitaram, em média, a 30 dias de tempo de ensino durante o ano lectivo de 183 dias.
E é natural que você pergunte, de onde obtiveram esses dados tão pouco atractivos sobre o desempenho da aprendizagem em Moçambique?
O estudo da Fundação Aga Khan é citado na Estratégia Nacional de Educação 2012 – 2016 de Moçambique como uma imagem clara para todos de que o sistema de ensino deve mudar em termos de serviços básicos de qualidade para melhorar a governação e a pedagogia escolar para que os jovens e as crianças de Moçambique sejam capazes de aprender a ler, escrever e fazer aritmética simples.
Mas não é apenas as escolas que operam em níveis mínimos, são os professores que não comparecem ao trabalho ou chegam atrasados todos os dias e os alunos que não optam por terminar o trabalho de casa e praticar habilidades de leitura. Os pais moçambicanos devem começar a perguntar aos directores das escolas, professores, membros dos conselhos escolares, ao Ministério da Educação e a si próprios “Como é possível que o meu filho frequente a escola todos os dias da semana, durante três anos, na primeira, segunda e terceira classes e é incapaz de reconhecer as letras do alfabeto?”
Há responsabilidade a ser partilhada por todos: provedores de serviços de educação, sociedade civil e líderes do sector privado, os pais, as próprias crianças e os muitos doadores internacionais que afirmam que o ensino primário é um direito humano e que eles ajudam a financiar um ensino de qualidade para todos em Moçambique. Se o ensino de qualidade é um direito humano, então todas as crianças têm o direito de ler e compreender o texto a nível do parágrafo até ao fim da terceira classe e de saber a tabuada até 12 x 12 quando terminam a sétima classe.
E de que forma está a leitura, a escrita e a aritmética relacionada com a qualidade da mão-de-obra e o crescimento económico?
Uma economia robusta que irá colmatar o défice de pobreza, é muito mais do que um conjunto saudável de megaprojectos e recursos que brotam da terra para os comboios e depois para os portos para serem vendidos para os países industrializados. A experiência global demonstra que a aprendizagem de competências básicas, nomeadamente a leitura, escrita e aritmética, é uma pré-condição para o crescimento económico equitativo, a melhoria dos indicadores críticos de saúde, igualdade de género e progresso sócio-democrático. Basta olhar para os Tigres Asiáticos de há 40 anos – países com sistemas de ensino público de muito má qualidade.
Olhemos para eles agora! No passado, eles também tinham salas de aula superlotadas, com crianças sentadas umas em cima das outras, e agora têm crianças em escolas públicas com as melhores notas de matemática e leitura do mundo. Os estudantes de Singapura, Coreia do Sul, Taiwan, Malásia e Hong Kong superaram a maioria dos estudantes europeus e norte-americanos em termos de resultados de testes padronizados de matemática e leitura.
Os Tigres Asiáticos tornaram-se o padrão do ensino público em 2013 e olhem para tudo o que eles vendem ao mundo a partir das suas economias, e muitos sem os recursos naturais substanciais encontrados em Moçambique. É bastante simples: a leitura, escrita e aritmética são fundamentais para a prosperidade económica de base ampla.
Mas os megaprojectos, por si sós, não vão tirar Moçambique da pobreza e levar o país à riqueza?
As histórias de sucesso dos megaprojectos são publicadas em todos os órgãos de informação porque são de grande interesse para o sector privado, que se está a expandir rapidamente, e uma luz brilhante no horizonte para a população em geral. Os alunos que conseguem obter um ensino secundário sólido, ou mesmo universitário, têm muitas oportunidades em 2013.
Haverá outras oportunidades para partilhar, embora regionais e muito centradas em Maputo, para assalariados não qualificados ou de qualificações médias, e muitos moçambicanos terão possibilidades de emprego assalariado em megaprojectos. Mas os candidatos ao emprego terão de estar bem preparados para serem competitivos. Estudos realizados indicam que a grande maioria dos jovens e crianças que saem das escolas públicas não serão facilmente integrados no mercado de trabalho ou não conseguirão adaptar-se às necessidades e padrões dos empregadores.
Um consultor de empresas local do sector privado confidenciou recentemente “Não sei como, mas sim, as habilidades básicas são absolutamente fundamentais. Se as escolas primárias [moçambicanas] ensinassem a leitura, escrita e aritmética e habilidades básicas para a vida, teríamos melhores candidatos no mercado de trabalho. A maioria das empresas não precisa de graduados universitários. Precisa de pessoas com o nível básico que eles possam treinar e orientar. No entanto, estes candidatos a emprego simplesmente não existem [em Moçambique].”
Se os megaprojectos não absorvem todos, de onde virão todos os outros empregos?
Esta é a verdadeira questão que os líderes, doadores e candidatos à força de trabalho se devem perguntar. Para a grande maioria dos candidatos a emprego num futuro previsível em Moçambique, o crescimento do emprego formal do sector privado será fortemente condicionado por questões ligadas ao arranque lento, desafios de infra-estrutura, posse da terra, questões de crédito e falta de políticas favoráveis do governo.
Levará algum tempo a conseguir que muitos dos megaprojectos operem e recrutem, e o arranque das micro e pequenas empresas que surgirão em torno dos megaprojectos existentes e das suas comunidades e dos acampamentos de trabalho é que será a máquina real de redução da pobreza em Moçambique, e estas novas empresas empreendedoras só serão melhores, mais rápidas e mais ricas se tiverem gestores que saibam ler, escrever e contar.
Façamos a nossa própria aritmética de crescimento do emprego recorrendo a alguns dados compilados pelo Banco Mundial. Em 2008, apenas 7,8% da força de trabalho em Moçambique foi contratada no sector de emprego não-agrícola, privado, formal, em comparação com 81% da força de trabalho no sector agrícola. As mulheres, em especial, dominam o sector agrícola e também constituem a maioria da mão-de-obra não qualificada: até 95,3 por cento das mulheres que trabalham em Moçambique são trabalhadoras agrícolas ou não-agrícolas não qualificadas.
Em contraste, os homens têm uma maior variedade de ocupações, com 67,5% na agricultura, 10% no comércio, 7,6% nos serviços e de 5,5% no governo. Assim, mesmo com os grandes investimentos em curso e previstos nos megaprojectos, o crescimento significativo do emprego formal do sector privado, não estará disponível para a maior parte dos candidatos à força de trabalho nos próximos 20 anos.
Com o número de novos candidatos à força de trabalho a aumentar em cerca de 3% ao ano, o emprego assalariado teria de aumentar em cerca de 20% ao ano nos próximos dez anos para absorver a maioria dos novos candidatos. Esse crescimento seria 8 vezes mais rápido do que o crescimento anual de 2002 a 2009, e os economistas concordam que é altamente improvável.
Então, onde estão os empregos para os nossos jovens e como estão as nossas estimativas associadas a qualquer tipo de solução?
A solução não é uma economia automática e dinheiro que flui do topo para a base para sanar a lacuna da pobreza para o imenso grupo de jovens. A solução para a criação de empregos para os jovens, redução da pobreza e oportunidade de uma força de trabalho de base ampla em Moçambique passa pelos “Miúdos” e pelo empreendedorismo; ir lá, aproveitar as oportunidades e abrir empresas familiares e micro e pequenas empresas em torno dos megaprojectos.
As comunidades crescentes de megaprojectos vão exigir enormes quantidades de bens e serviços e todos os gestores e os trabalhadores terão de comer, divertir-se e deslocar-se pela cidade. Portanto, haverá grandes oportunidades para o empreendedor bem apetrechado e motivado que queira prestar serviços a estas novas comunidades da classe média e trabalhadora.
Uma boa parte da oportunidade de crescimento económico em Moçambique será de transformar os agricultores de subsistência em “produtores e vendedores locais de produtos agrícolas”, que estejam determinados a vender os seus produtos a preços competitivos para as comunidades dos megaprojectos, acampamentos e uma classe média em crescimento.
Já leram o livro “O Pequeno Motor que Podia?”
Resumindo um livro infantil fascinante que contém uma mensagem muito adulta sobre a motivação e o esforço, trata-se de contar com os “Miúdos” para colocar os seus melhores esforços para “Conseguir Fazer o Trabalho”. Há um grande número de Miúdos em Moçambique que fazem todo o esforço e alguns deles, mesmo com os seus melhores esforços, precisam de mais ajuda, encorajamento e habilidades básicas para conseguirem fazer o trabalho de ajudar a si próprios e às suas famílias a sair da pobreza e entrar para a segurança financeira e social.
Em suma, o crescimento do emprego que estabilizaria a maioria dos jovens neste momento em Moçambique, e ao longo dos próximos 10 anos, implica pensar em termos de micro e pequenas empresas. O Miúdo vai ter que conseguir fazer o trabalho num emprego que ele irá criar para si próprio, da base para o topo e o sistema de ensino primário público tem de lhe dar as ferramentas para o fazer.
Perguntarão – como serão estas oportunidades de micro e pequenas empresas que estão a surgir em torno dos megaprojectos e ao longo dos corredores económicos e zonas urbanas de Moçambique?
Definindo de forma resumida, as empresas familiares e as microempresas são, tradicionalmente, empresas muito pequenas que não estão legalmente separadas das actividades familiares. Na maioria das vezes, elas são constituídas por um único empreendedor, mas podem empregar parentes, amigos e familiares não remunerados.
Normalmente, este tipo de trabalho inclui a agricultura, jardinagem urbana e produção de hortícolas, a venda de bens de consumo, o fabrico de blocos e construção, a produção de carvão, a produção agrícola e processamento simples como a moagem, costura, cabeleireiro, preparação de alimentos, fabrico de móveis, abertura de um micro bar ou restaurante e serviços informais de táxi, estafeta ou transporte. Haverá muito mais oportunidades para estes pequenos prestadores de serviços e produtores quando as comunidades e acampamentos dos megaprojectos transformarem as aldeias em vilas e as vilas em cidades e parques industriais.
E é exactamente aqui onde a leitura, a escrita e a aritmética são importantes. De uma forma muito simples, as habilidades básicas aprendidas na escola primária ajudam a tornar estes micro e pequenos empreendedores cheios de dificuldades mais eficientes na maneira como usam a mão-de-obra e os recursos e permitem a mobilidade em múltiplas actividades e sectores mais produtivos.
Um domínio das competências básicas vai ajudar os empreendedores a aproveitar recursos adicionais como a formação e informação, que estão disponíveis em versão impressa ou na internet. Também faz com que estes potenciais empreendedores sejam melhores candidatos a empregos no sector privado que poderão surgir na fase de arranque lento e alastramento de indústrias de megaprojectos.
Estará qualquer destas actividades de microempresas realmente a acontecer noutro sítio?
O fenómeno de microempresas define o capitalismo africano e o crescimento do emprego. Em toda a Região da África Oriental e Austral, empresas familiares e micro e pequenas empresas estão a criar muitos dos novos postos de trabalho no mercado e a contribuir para a existência de economias e sociedades onde prevalece a paz, estabilidade e prosperidade. Por exemplo, na Tanzânia, mais de 50% das famílias têm um membro que opera uma empresa familiar a tempo parcial ou tempo inteiro, em comparação com 30% em Moçambique.
Parte da diferença no empreendedorismo básico, crescimento económico e redução da pobreza entre Moçambique e os países vizinhos está directamente relacionada com a falta de capital, restrições de licenciamento, estruturas fiscais e acesso a fontes de energia fiáveis. No entanto, o nível de escolarização inferior da força de trabalho em áreas de habilidades básicas cruciais, também pode ser um factor importante.
Sem as habilidades básicas que se aprendem num bom ensino primário, muitos candidatos para a força de trabalho poderão não possuir as habilidades rudimentares que lhes permitam operar efectivamente um micro negócio, uma pequena exploração agrícola bem-sucedida e rentável, ou até mesmo para se candidatarem a um emprego como trabalhadores assalariados minimamente qualificados. Os que não possuem as habilidades básicas mínimas, os que não sabem ler e os que não sabem contar são susceptíveis de ficar presos numa actividade económica menos produtiva e na pobreza absoluta.
Em termos de juventude e estabilidade social, para os próximos 10 a 15 anos, no mínimo, a maioria dos jovens moçambicanos que entra para o mercado de trabalho à procura de emprego produtivo terá de cuidar da sua própria subsistência, seja trabalhando na exploração agrícola ou jardinagem urbana familiar ou pessoal e/ou através da abertura de um micro ou pequeno negócio que venda bens ou serviços à sua comunidade, à comunidade de um megaprojecto ou a uma outra pequena ou média empresa.
A tarefa diante de nós é bastante clara e directa. Os líderes profissionais de educação, bem como os dirigentes do governo, a sociedade civil e o sector privado terão de se levantar, trabalhar juntos e esforçar-se por garantir que os jovens que entram para os sectores formal e informal estejam prontos e inspirados para trabalhar, e a tarefa começa por se garantir que o maior número possível de crianças conclua o ensino primário com um domínio das competências básicas.
Não se trata apenas de melhores níveis de financiamento e de fortalecimento da capacidade administrativa em Maputo, e não se trata igualmente de argumentos de há longa data sobre o currículo, teorias pedagógicas e novas técnicas e balas de prata que procuram atalhos para chegar à excelência académica.
A máquina da educação em Moçambique não precisa de ser afinada; precisa, sim, de liderança, responsabilização e mudança de atitude. Precisa de fazer com que as escolas primárias públicas funcionem de uma forma que conduza ao sucesso da aprendizagem.
E se Moçambique não consegue ajudar as crianças moçambicanas a aprender a ler, escrever e fazer contas para que possam, eventualmente, tornar-se jovens adultos que têm famílias saudáveis e levar uma vida digna para si e para os seus próprios filhos, qual será o preço a pagar?
Ora vejamos, esse é o problema de todos nós – assumir a responsabilidade do que está diante de nós, ou haverá muitas acusações e, talvez, dificuldades no futuro. Basta olhar ao redor de África e para outros países irmãos de Moçambique num continente que flutua em recursos naturais.
Se não for controlado, o actual declínio da qualidade do ensino e dos resultados da aprendizagem pode pôr em risco a capacidade de Moçambique capitalizar as oportunidades que lhe são oferecidas pelos megaprojectos e as oportunidades das micro e pequenas empresas de que Moçambique precisa absolutamente neste momento para os jovens que entrarão no mercado de trabalho, nos próximos 10 anos.
Jovens escolarizados são importantes para o crescimento económico crítico, a criação de empregos, a redução da pobreza, a paz regional, a participação democrática e a estabilidade social, a menos que Moçambique seja capaz de melhorar a qualidade do ensino primário público para proporcionar aos jovens e crianças as habilidades básicas de combate à pobreza e de construção de uma vida melhor.
Moçambique poderá tornar-se como alguns dos outros países africanos que vemos nas notícias que enfrentam a situação de uma geração mais jovem que é um empecilho ao crescimento económico e à estabilidade social, quando devia ser um recurso ilimitado para a prosperidade e edificação da nação.
E se você for uma daquelas pessoas pacientes que realmente lêem até ao fim este longo artigo de opinião, já sabia de tudo isto, de uma ou outra maneira, pelo que se considere subscritor. Você é o “Miúdo”, o “Pequeno Motor que Podia” e fará esse esforço adicional para fazer a diferença – e certifique-se de que os outros também fazem a diferença para que todas as crianças em Moçambique usufruam de um ensino básico de qualidade e sejam capazes de ler, escrever e fazer contas. Este é o próximo Megaprojecto!