Acelerava a carrinha de marca isuzu caixa aberta, de matrícula estrangeira, com o atrelado repleto de artigos caseiros e punha todo o peso no alcatrão da estrada que rugia enquanto a distância minguava. A carrinha rasgava os ares. Parecia voar. O mudjoni-djoni queria que o isuzu engolisse toda a longa distância num só piscar de olhos. Acelerava mais, mais e mais. E como se pretendesse apoiar a velocidade da máquina, roncava com a garganta, cerrava e rangia os dentes.
– Zhiiii, zhiii… – isso fazia ele ao volante.
O mudjoni-djoni não via a hora de rever a sua esposa e o seu único filho. Uma saudade que durava há sete anos. Sim, sete anos de trabalho no Djoni, aliás, na África do sul.
Enquanto pisava o carro olhava, por vezes, para um lado e, por outras, para o outro lado. Contemplava com certa atenção o que Maputo tinha de novo. Edifícios e estradas reabilitadas. Observava e rendia-se com as mudanças positivas da terra que o viu nascer.
– Katxintxa lomu kaya mani! hei sé sé sé… . dizia.
Atentava-se também naquilo que permanecia no mesmo estado de quando partiu à procura de condições razoáveis na terra do rand. Coisas que lhe traziam à mente os momentos que muito marcaram os tempos em que a sua moçambicanidade era pura, antes de se deixar levar pelos fazeres da terra do rand.
Lembrava-se dos companheiros de infância: o Madungo, o Hossimani, o Dzengueni entre outros compatriotas que foram, quase sempre, seus companheiros de vida em Maputo e, abanava emocionalmente a cabeça.
– Ísh, Kamaputsu! – dizia ele entre lágrimas de emoção.
Com a ajuda da experiência no volante, o mudjoni-djoni viu-se na rua de casa. Os caminhos não mudaram muito. Chegou sem se ter perdido. Reduzia a velocidade à medida que ia atingindo a entrada de casa. Estacionou. Saiu do carro com gestos de um vencedor. Fez-se de braços abertos, como asas de uma águia, para acolher a Mevassi, sua esposa. Esta permanecia imóvel como se fosse uma estátua.
Os gayi-gayi, assim são chamados os carregadores e descarregadores de cargas, que se aperceberam da chegada de um mudjonidjoni, correram para o carro e aguardaram a permissão para ajudarem a descarregar os fardos. Não aguardavam calados.
– Bem-vindo à sua terra natal. Hoyo-hoyo mbavooo…
– Hoyo-hoyooo… hili hoyohoyo. – diziam eles em gritos.
A Mevassi continuava parada. Começou a tremer. O mudjoni- djoni percebeu que não se tratava de emoção, mas de medo. Não precisou de perguntar a razão para tanto medo. Viu saírem da casa de madeira e zinco duas crianças por ele desconhecidas. As crianças eram bem parecidas com Mevassi.
Enquanto o mudjoni-djoni punha a mão na consciência, um homem saía da mesma casa, sem camisa, com a toalha do banho a cobrir-lhe a nudez. Andava com estilo de um autêntico chefe d família. Olhou para o mudjini-djoni e fez perguntas consecutivas à Mevassi.
– O que se passa? Quem é ele? O que quer aqui?
– É o dono da casa. O meu marido. – respondeu a Mevassi.
– E eu?
– Ooo, não sei.